Às vezes, o silêncio no elevador diz mais sobre o mundo em que vivemos do que qualquer conversa.
Já percebeu como há dias em que parece mais fácil escrever um e-mail ao chefe do que manter uma conversa de 30 segundos no elevador? Como se a simples troca de um “bom dia” pudesse desencadear uma pequena crise interna?
Estamos ali, no mesmo espaço fechado com alguém que se conhece vagamente – até sabe que mora no 3º, mas nunca tem a certeza se é o esquerdo ou o direito. O silêncio instala-se. Um de nós sorri. O outro finge ler o visor do andar. E, quando a porta abre, saímos com um leve alívio… e a sensação estranha de que devia ter dito qualquer coisa.
Estas pequenas situações sociais – conversar no elevador, cruzar-se com um ex-colega no supermercado, escolher onde se sentar num café quase cheio – podem parecer banais. Mas, para muitas pessoas, são verdadeiros testes emocionais. Não é vergonha. É o cérebro em modo “ameaça social”. O desconforto em interações pequenas não é fraqueza, é biologia.
O nosso sistema nervoso, responsável por nos proteger de perigos, não distingue entre um leão à solta e a possibilidade de se sentir um estranho numa conversa informal. A resposta fisiológica pode ser semelhante: coração acelerado, respiração curta, pensamento em modo de alerta. E isto acontece com mais frequência do que se imagina.
O nosso cérebro está constantemente a avaliar o ambiente, à procura de sinais de aceitação ou rejeição. Interações mínimas podem ativar circuitos de stress, sobretudo se houver experiências passadas de crítica, exclusão ou vergonha. Como seres profundamente sociais, o medo da rejeição ativa mecanismos semelhantes aos do medo físico. É por isso que um simples “olhar desviado” pode soar como um ataque ao nosso valor. Por vezes, aquilo que o corpo sente é só o eco de algo que o cérebro interpretou como ameaça.
Vivemos cada vez mais centrados em nós, nas nossas rotinas e nos nossos círculos próximos. Acreditamos que estamos ligados ao mundo, mas quando damos por nós, não sabemos o nome do vizinho do lado. Passamos por pessoas todos os dias – no bairro, no trabalho, no autocarro – sem as vermos de verdade. Não por falta de vontade, mas porque o desconforto social tornou-se uma norma silenciosa. Estamos tão ligados aos nossos que esquecemos como é viver com os outros.
Há quem evite festas por não saber como iniciar conversas. Quem adie telefonemas porque não quer parecer invasivo. Quem pratique mentalmente o que vai dizer ao funcionário da padaria. Não se trata de timidez, mas de uma sensibilidade social que merece ser compreendida.
Falar sobre estas experiências, com leveza e empatia, ajuda a normalizá-las. E talvez o primeiro passo para quebrar o ciclo de desconexão seja este: reconhecer que há mais pessoas a sentir o mesmo.
Quem sabe, da próxima vez que o elevador parar, em vez de evitarmos o olhar do outro, possamos ser proativos num “bom dia”. Pode não parecer muito, mas é assim que começa a ligação e termina a desconexão.
Porque, no fundo, todos precisamos de sentir que somos vistos – nem que seja, apenas, pelo instante de três andares partilhados com alguém que, como nós, também precisa de ser notado.