Tal como donos de restaurantes não gostariam de sítios onde se pudesse comer de borla os mesmos pratos que eles vendem, há editores e livreiros que não apreciam bibliotecas. Já ouvi vários comentários que o demonstram e tento sempre argumentar em sentido contrário: a par dos professores de português, as bibliotecas públicas são os principais aliados dos editores e dos livreiros. Posso dar o meu exemplo, que já comprei alguns milhares de livros: embora tenha nascido no Porto, cresci em Espinho e, tal como tenho dito muitas vezes, fiz-me leitor numa biblioteca pública, a Biblioteca Municipal de Espinho, hoje Biblioteca José Marmelo e Silva. Claro que não foi só isso que fez de mim leitor, mas posso dizer que sei bem o poder transformador das bibliotecas. É por isso que leio com ânimo, no DN Madeira, que, em 2023, a Biblioteca da Madeira bateu o recorde de empréstimo de livros, com um total de 42.219 empréstimos. Este número ganha expressão se eu partilhar também os números de livros emprestados em 2015: 17.865. Veja-se a evolução. E também os de 2018 e 2021: 29.589 e 35.010, respetivamente. Ou seja, na última década, requisitaram-se cada vez mais livros na Biblioteca da Madeira. Interessa saber como e por que motivos isso tem acontecido. Não tenho dúvidas de que, para esses números, contribuíram as condições do atual – e imponente – edifício do Arquivo Regional e Biblioteca Pública da Madeira, no Funchal, que data de 2004. Aliás, há hoje extraordinárias bibliotecas públicas, um pouco por todo o país; conheço muitas que adoraria ter à porta de casa. Mas o artigo de João Filipe Pestana refere uma série de medidas e programas adotados ao longo dos anos mais recentes, pela Direção Regional do Arquivo e Biblioteca da Madeira, para aproximar a população da leitura, como o “Bookstart”, o “FALEMOS”, o “Liberdade de Ler”, o “ABM Bebés”, ou oficinas de escrita criativa. Mas há três, desenvolvidos pelo Serviço Educativo, que me parecem simplesmente excelentes e se apresentam com o nome têm: o “A Minha Primeira Visita à Biblioteca”, o “Conhecer e Utilizar a Biblioteca” e o “Biblioteca Vai à Escola”.
A Biblioteca da Madeira é uma das bibliotecas com maior catálogo do país, por ser uma das oito que recebem os exemplares do Depósito Legal. Nem toda a gente sabe isto, mas sempre que, em Portugal, se publica um livro, onze exemplares são obrigatoriamente enviados para a Biblioteca Nacional, para fins de Depósito Legal. Desses onze, um segue para o Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro e oito são distribuídos por bibliotecas do país, sendo a Biblioteca da Madeira uma delas, razão pela qual dispõe de cerca de 700 mil livros, 100 mil dos quais disponíveis para empréstimo. Para terminar, partilho informações relativas aos livros de ficção mais emprestados na Biblioteca da Madeira: lidera o top Colleen Hoover, com dois dos seus livros para os chamados jovens adultos, mas logo atrás vem José Saramago, com o formidável “O Ano da Morte de Ricardo Reis”; também lá está Taylor Jenkins Reid, que a Amazon categoriza como women’s fiction, e Delia Owens, com um bestseller que já vendeu mais de 20 milhões em todo o mundo; nos 10 mais emprestados, surge ainda Lídia Jorge, com o multipremiado “Misericórdia”. Outras considerações à parte, é um top que demonstra que aquela biblioteca é frequentada por leitores de vários tipos e de várias idades. E ainda bem. Parabéns à Biblioteca da Madeira.
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