Temos de começar a definir o que é nível ou qualidade de vida. Recentemente, num estudo realizado pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto, foi identificado que a Roménia teria ultrapassado o nível de vida de Portugal. Claro que a afirmação é feita com base em valores económicos, tanto pelo PIB per capita como pela carga e esforço fiscal.
Contudo, como pessoa que viveu na Roménia recentemente, consigo ver as diferenças gritantes entre Portugal e Roménia… e não é a favor dos romenos. Com isto, ressalvar que é possível ter boa qualidade de vida em qualquer país na Europa: mas sempre dependente de alguma vantagem financeira e inacessível à maior parte da população.
Apesar de parecer óbvia esta diferença, ainda é preciso mostrar que há uma discrepância entre os valores económicos e a qualidade de vida da sua população na generalidade. A verdade é que a Roménia tem melhorado bastante desde o seu passado comunista, mas ainda carrega marcas dessa história. A infraestrutura é deficitária em grande parte do país, desde escolas, hospitais, estradas e até a ferrovia. Talvez seja a maior diferença para outros países mais ocidentais. Algo que também salta à vista é a corrupção no sistema político, nos serviços públicos, especialmente na polícia e administração pública, que depois leva aos casos de tráfico humano e grupos organizados de crime a atuar neste país.
Temos também o exemplo da falta de liberdade de imprensa, o que faz com que muitos jornalistas que denunciam políticos corruptos sejam ameaçados de morte. A sensação de segurança é afetada por todos os casos mais mediáticos e pela falta de confiança na polícia local. Será impossível negar a diferença da sensação de segurança em Portugal comparativamente à Roménia, onde o crime organizado, abusos de poder e corrupção são uma realidade do dia-a-dia.
Outra visão que (ainda) contrasta com a sociedade portuguesa é a pobreza generalizada das populações, tanto nas cidades como no interior do país. A falta de condições das casas (nomeadamente de saneamento básico) e de qualidade alimentar, juntamente com a falta de financiamento do sistema nacional de saúde, contribuem para múltiplas crises de saúde pública. Há falta de médicos e de material hospitalar, e o sistema privado disponível não oferece melhores condições para a generalidade da população. A falta de regras de regulamentação ambiental também é clara, com aumentos dos níveis de deflorestação ilegal e uma péssima gestão de resíduos, que se torna principalmente visível nas cidades. Há também uma descriminação sobre as minorias (étnicas e nacionais) e pessoas LGBTQIA+ mais acentuada e declarada, com casos de violência e segregação.
Apesar de todos os sinais económicos (que realmente parecem estar em crescimento), ainda não se vê traduzido na experiência do dia-a-dia nestas cidades, e creio que ainda falta algum tempo a normalizar esta comparação. O PIB pode ser a ferramenta, mas não é o indicador essencial. Viver na Roménia não é viver de PIB. E em jeito de provocação: por isso é que a Roménia está cheia de nómadas digitais e estrangeiros, e não de Andrew Tates [ex-kickboxer britânico detido na Roménia, por suspeita de violação e tráfico humano]. Porque tem um nível de vida superior.
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