Naturalmente, hoje só pensamos no reatar das relações, dos ritmos, das idas aos espaços públicos. O longo confinamento fez de nós seres em metade, perdemos parte do que era nosso, do que era a nossa identidade, aquilo que se fazia fora de casa. Como desejo um cafézinho tomado no bar da minha universidade, a Lusófona! Faz-nos falta a dimensão ritual dos gestos.
Mas mais que os gestos livres de um dia-a-dia livre, pensamos já em férias. E a desejada retoma da economia implica que façamos férias. Mas que férias? Há pouco tive um vislumbre sobre a abertura das praias em Sidney; por um corredor, os banhistas podem ir até à água, mas não podem ficar na areia… regras que são impostas para a famosa e tão importante distância social.
E assim serão as férias: sem proximidades, com restaurantes com menos de metade das mesas, com espaços públicos fechados, com diversões reduzidas ao mínimo. Até com praias sem a possibilidade de nos rebolarmos na areia.
Numa era em que tanto se tem falado em “inteligência emocional” e noutros conceitos mais ou menos similares, a pandemia leva-nos a um afastamento quase absoluto do toque. Dizem as estatísticas que os vários tipos de crime sofreram uma redução. Também sofreram semelhante redução os namoros que não tiveram início, os amantes que não se encontraram, as paixões que não foram vividas. E este decréscimo, ao contrário do crime, não é nada positivo.
Seremos assim neste verão que se aproxima: veraneantes sem multidões, sem festivas, sem discotecas, sem esplanadas a abarrotar, sem praias onde era difícil encontrar o metro quadrado para colocar a toalha.
Mas mais. Dificilmente iremos viajar “para fora”, com as companhas aéreas, ou falidas, ou ainda sem se terem adaptado ao novo mundo que já chegou. Viajaremos tão menos…
Será que o Skype, o Zoom, entre outras aplicações, nos vão ajudar a viajar? Sim, sem sair do nosso sofá… iremos a concertos através de uma qualquer realidade virtual? Teremos identidades fictícias para ir a um bar através de uns óculos que nos colocam na mesa que queremos, com a companhia que desejamos?
O ócio vai sofrer uma grande modificação nas nossas vidas e nos nossos imaginários.
Com praias sem areia, sobra-nos um género de praia apenas molhada, sem o refastelar languido da nossa veia reptiliana.
Sem aviões, sobra-nos o céu.