Que administrador não usa o argumento de que o sucesso de uma empresa está relacionado com o bem-estar e segurança dos trabalhadores? No entanto, somos hoje confrontados com notícias de escândalos corporativos potenciados pelos líderes de empresas (Administradores, CEOs) que tomam decisões contrárias a esses princípios, muitas vezes em prol das suas motivações e interesses pessoais.
Que características e traços de personalidade têm estes líderes? A investigação em Psicologia organizacional responde a esta questão focando o que designou de Dark Triad; a Tríade Negra de traços de personalidade, composta pelos traços de maquiavelismo, narcisismo e psicopatia. No contexto organizacional, a Tríade Negra é subclínica, ou seja, não produz manifestações a um nível que necessite de intervenção clínica (Diller e colaboradores, 2021). O maquiavelismo refere-se à tendência de maximizar os proveitos pessoais, usando os outros para atingir os seus objetivos pessoais. O narcisismo caracteriza-se por um forte sentido de superioridade, grandiosidade e egocentrismo. E a psicopatia, que é considerado o traço mais negro (the darkest of all), caracteriza os indivíduos altamente impulsivos, sem qualquer consideração pelos outros, sem empatia e sem qualquer sentimento de culpa associado aos seus comportamentos agressivos (Szabó e colaboradores, 2018).
O facto é que estas pessoas fingem e manipulam para atingir os seus objetivos, muitas vezes revelando-se apenas quando o objetivo está atingido. Nestas situações, deparamo-nos com fenómenos conhecidos como liderança tóxica
No seu conjunto, estes traços sugerem uma personalidade com facilidade em adotar comportamentos não éticos, a utilização de estratégias manipuladoras e auto-centradas, ou até a falta de honestidade. Uma personalidade que explica a existência de incongruências, como a assinalada no início deste artigo.
Tendencialmente, os homens tendem a ter maiores níveis nas dimensões da Tríade Negra, quando comparados com as mulheres (i.e., Rogoza e colaboradores, 2020). Uma análise de 49 países (Jonason e colaboradores, 2020) concluiu que, em países mais desenvolvidos e com maior igualdade de género, predomina o maquiavelismo, e em países menos desenvolvidos predomina o narcisismo.
Quando o líder assume esta personalidade, tende a ser carismático, inicialmente percecionado como confiável, extrovertido, visionário e estratega (i.e., Paulhus e Williams, 2002). No entanto, a sua presença tende a ser funesta com diversas consequências negativas para os colaboradores (i.e., Van Dijk and De Cremer 2006).
O leitor perguntar-se-á, então, se é possível que estas pessoas com elevados níveis de tríade negra alcancem mais facilmente cargos de liderança. Estudos recentes sugerem que “Sim!”. Apesar deste cenário ser tudo menos ético, o facto é que estas pessoas fingem e manipulam para atingir os seus objetivos, muitas vezes revelando-se apenas quando o objetivo está atingido. Nestas situações, deparamo-nos com fenómenos conhecidos como liderança tóxica. Esta tem impactos diretos negativos tanto no bem-estar como na performance dos colaboradores (Jonason e colaboradores, 2015). Um estudo realizado no ISPA (Pinto, 2021) sugere que, quando os indivíduos percecionam altos níveis de maquiavelismo e psicopatia nos seus líderes, este facto influencia a sua decisão em permanecerem em silêncio face a injustiça e maltratos.
Mas será possível que o nível de liderança potencie uma maior presença destes traços no indivíduo? Apesar da investigação a abordar esta possibilidade ser mais reduzida, existe pelo menos um estudo (Diller e colaboradores, 2021) a mostrar que os líderes que já assumem posições hierárquicas mais elevadas apresentam níveis mais evidentes de maquiavelismo, narcisismo e psicopatia. O que sugere que, à medida que se sobe na hierarquia, esta personalidade ou se torna amais acentuada, ou é mais relevante.
Em suma, estes líderes, que podem ser percebidos como eficazes, baseiam as suas decisões nos seus objetivos e nas suas agendas pessoais escondidas como se fossem os objetivos organizacionais, acabando por ferir os bem-estar dos seus colaboradores.
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