Etapa a etapa, a Europa vai tentando ultrapassar problemas. Ultrapassar, mas não resolver. Afasta-os, não os supera.
Para aderirem ao euro, os países saltaram da trincheira onde estavam protegidos pelas suas soberanias e moedas próprias e resolveram arriscar passar à trincheira da moeda única.
Mas não a atingiram. Foram apanhados por fogo cruzado e ali se quedaram, em terra de ninguém, paralisados, incapazes de avançar ou de recuar.
Embevecidos com a ideia de uma Europa unida, dedicaram-se a calibrar as maçãs, a normalizar os cartões de cidadão e as matrículas dos automóveis, ousaram até acabar com as fronteiras físicas entre Estados. Mas não foram tão longe na Finança e na Economia. Ficaram atascados nos obstáculos do campo de batalha e faltou coragem aos chefes para avançar – e aprofundar a fusão – ou para recuar e repensar a estratégia. Nem união bancária, nem união fiscal, nem políticas sociais comuns (mesmo os controlos orçamentais é a confusão que se viu), nem na cidadania, nem diplomacia europeia, nem defesa conjunta. Os países perderam soberanias sem se prepararem para viver com as concessões que fizeram. Pelos vistos, nem pensaram bem no que estavam a fazer. Cederam direitos sem se aprontarem para os custos que teriam de suportar. Acreditaram que tudo correria bem. Confiaram. É espantoso como, só agora, passados todos estes anos e vividos tantos sacrifícios, voltam a ouvir-se vozes a dizer que é necessário repensar a moeda única (faça-se justiça a João Ferreira do Amaral, um dos poucos sempre céticos). Alguns dos indefetíveis vêm agora dizer que é necessário repensar a moeda, mas só depois da recuperação das economias mais débeis. Depois? Se fosse já não se poupariam sacrifícios?
Os países ficaram entre trincheiras, sujeitos a fogos vindos de vários lados, na esperança de que ninguém fizesse pontaria baixa. Fizeram-na os gregos. De repente, caiu mais um dos axiomas: o de que um país que representa apenas dois por cento do PIB europeu não poderia ameaçar a toda poderosa Europa. No entanto, está a fazê-lo.
E assim volta a discussão que deveria ter sido prévia: o euro foi uma boa opção para todos? Sem moeda comum há União? E se à Grécia se junta um outro país? E se todos desatam a fazer referendos, com alto risco de obterem resultados antagónicos? Como se conciliam interesses díspares quando escasseiam as regras e os organismos políticos comuns das diferentes democracias?
Agora que os problemas estão à vista, vai a Europa decidir sobre se avança para a trincheira seguinte ou se opta por recuar? Quais são os líderes europeus com coragem para se levantarem entre os seus soldados, darem o corpo às balas e apontarem o caminho? Bem ou mal, os ingleses fizeram a diferença – a propósito: o referendo britânico sobre a continuação na União está a andar e há um mês foi aprovado um primeiro diploma – e os gregos estão a fazê-la. A maioria baixa a cabeça e espera que os morteiros caiam ao lado.
Privacidade – Até onde vamos sacrificá-la? Crescem as ameaças e aumentam as concessões. É a lista de pedófilos, o enriquecimento ilícito, os dados individuais a circularem por cada vez mais computadores e sites, o Fisco mais poderoso e intrusivo, a videovigilância omnipresente em bancos, serviços e lojecas e anunciada por letreiros que já ninguém vê – e agora é a lei antiterrorismo, também ela a dar poderes para se vasculharem os registos telefónicos sem intervenção de juiz. Quem guarda os guardiões?
Inconveniente – O tema pode vir tarde e a más horas, ser irrelevante e revelar presunção. Mas não resisto: um país que dá tamanhas honras (discursou o Presidente da República e a presidente da Assembleia) a um futebolista, ainda que com as qualidades de Eusébio, não estará carente de personalidades relevantes? O Panteão Nacional não deve ser para quem deu fortes contributos à sociedade e ao saber? Ao abdicarem da exigência acabam por desvalorizar quem lá está.