Se ao ouvir o nome Helena Isabel a cara que lhe ocorre é a da actriz que contracenava com Herman José, não imagina a sorte que tem. É que cada geração tem a Helena Isabel que merece, e a nós calhou-nos uma concorrente de reality show, entretanto promovida a comentadora de reality shows, e não só. Continua a ser a Helena Isabel do Tal Canal, só que agora esse canal é a TVI. Helena Isabel é uma das comentadoras residentes do programa TVI Extra, e arranjou problemas com residentes do seu bairro, por considerar que eles não têm direito de lá residir. Mas já lá vamos. Helena, no espaço de duas semanas, conseguiu sobressair em dois momentos: primeiro por ter sido muito vocal nas críticas à série Rabo de Peixe, depois por ter sido ainda mais vocal na sua rua, gritando para uma vizinha: “Deixam entrar qualquer pessoa neste país, qualquer merda entra neste país, é o problema, havia de ser eu… Nem sequer entravas. Vai para a tua terra!” Estranhamente vi mais celeuma em torno da primeira opinião do que da segunda. Não apreciar o trabalho que deu José Condessa a conhecer ao mundo? Crime de lesa-pátria. Não aceitar gente nascida noutras partes do mundo? Aparentemente normal. É certo que a primeira polémica surgiu porque Helena foi mais longe: não se tratava apenas de não ter apreciado a série da Netflix, ela afirmou com orgulho que não via nada português. Nem séries nem música, nada. O que é um excelente cartão-de-visita, pois percebemos logo que estamos perante uma especialista em generalizações imbecis. Só não sabíamos que iria tão longe.
Agora ficámos a saber que além de não ser fã de produtos culturais portugueses, não aprecia seres humanos produzidos no estrangeiro. A sugestão “volta para a tua terra” é absurda. Se está a falar com vizinhos, e não com um alemão que alugou um Airbnb durante três dias, é óbvio que a terra deles é a mesma que a dela. Depois de saber que havia imagens da tal altercação, a comentadora justificou-se, alegando estar muito cansada. Deve sofrer de uma patologia rara e ainda pouco estudada, a narcoxenofobia. Os doentes não só têm episódios de hipersonolência como, já entorpecidos, são acometidos de uma súbita vontade de trabalhar no SEF e não deixar entrar ninguém. “É uma falta de civismo, uma falta de respeito pelo outro”, disse Helena Isabel, naquilo que parecia ser uma sensata autocrítica, mas afinal era sobre o ruído da vizinhança. “Porque é que eu tenho de gostar de pessoas que não sabem viver em comunidade?”, pergunta, desesperada, Helena Isabel. Não tem de gostar. Pode até fazer queixa delas à polícia. Mas o fundamento da queixa tem de ser “fazem barulho depois das oito da noite”, e não “fazem barulho depois das oito de Lisboa, nove em Moçambique, de onde nunca deviam ter saído”. Quando falamos de opinion makers na TV pensamos num Marques Mendes ou num Pacheco Pereira, mas se calhar os resultados eleitorais que ultimamente nos têm chocado são mais fruto do trabalho das Helenas Isabéis.
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