Entre as muitas coisas para as quais não tenho habilidade, dizer adeus talvez seja uma das principais. Como sempre, a minha falta de jeito empurra-me para o dicionário. As acções embaraçam-me, não sou capaz de grandes gestos, mas as palavras eu consigo compreender. Ao que parece, quando dizemos adeus estamos a enunciar uma versão abreviada da expressão “recomendo-te a Deus”. Ou seja, nesse momento somos um utilizador de uma espécie de Tripadvisor divino. O ser humano de quem nos despedimos tem, na nossa opinião, características que Deus poderá apreciar. Essa atitude apresenta três problemas: primeiro, é um pouco suspeito estarmos a recomendar uma pessoa ao Criador precisamente no momento em que vamos afastar-nos dela. “Aqui está uma pessoa da qual me vou afastar. Mas considero que é óptima para Ti.” Não parece a recomendação mais fiável, dadas as circunstâncias. O segundo problema é que estamos a recomendar uma pessoa precisamente a quem a criou. É como aconselhar um livro do Lobo Antunes ao Lobo Antunes. Em princípio, ele sabe que é bom. O terceiro problema é que Deus, se ficar convencido com a recomendação, pode chamar a pessoa para junto de Si – o que talvez não seja exactamente o que pretendemos.
Outras línguas não ajudam muito. Quando os italianos se despedem com “ciao” estão a dizer a palavra escravo – o que parece sinistro. Já quando dizem sinistro estão a referir-se à mão esquerda, por isso é difícil entendê-los. Talvez os franceses sejam mais úteis porque, quando dizem “au revoir”, mantêm a esperança de voltar a ver a pessoa da qual se despedem, sem arriscarem recomendá-la a divindades, o que pode ser perigoso. Talvez seja o equivalente ao nosso até à vista. Suponho que seja o mais seguro.