Quando se soube que um juiz tinha desafiado, para uma luta de artes marciais mistas, o director nacional da PSP – que, em caso de derrota, teria de ir à televisão admitir que era “um idiota” –, fiquei contente. Imaginei que Portugal tinha um daqueles prodígios que conseguira licenciar-se em Direito e concluir a formação no Centro de Estudos Judiciários ainda antes dos 12 anos. Com pena, descobri que não. O juiz chamava-se Rui Fonseca e Castro e era, ao que me garantiam, um homem adulto. E assim ficou bem clara a diferença entre quem gostava de lutas nos anos 70, nos Estados Unidos, e quem gosta de lutas agora, em Portugal. Norman Mailer pôde escrever o livro The Fight, sobre o combate entre Muhammad Ali e George Foreman, no Zaire, e a mim resta-me escrever sobre a hipotética luta entre o juiz Fonseca e Castro e o polícia Magina da Silva, que ocorrerá apenas na nossa imaginação.
Mesmo imaginária, creio que pode ser uma luta interessante. De um lado, um homem que comandou o Grupo de Operações Especiais; do outro, um jurista que não acredita na existência da pandemia. Se é verdade que Magina da Silva deve ter bastante experiência de combate corpo a corpo, não deixa de ser igualmente verdadeiro que Fonseca e Castro, só por esta descrição, também parece ter levado muitas pancadas na cabeça. Em resistência, em princípio, equivalem-se. O que reforça a minha opinião de que seria um combate muito equilibrado. Olhando para a compleição física e a atitude de ambos os lutadores, creio que Magina da Silva começaria por assentar dois bons sopapos nas ventas judiciárias de Fonseca e Castro, partindo-lhe o nariz. No entanto, o juiz negaria estar em desvantagem, uma vez que não acredita em fracturas. Talvez Magina da Silva insistisse, mas, como é evidente, Fonseca e Castro iria contrapor que não acredita em narizes. Estas considerações iriam certamente irritar Magina da Silva, que, com mais três ou quatro golpes, colocaria o juiz a dormir e o árbitro daria o combate por terminado, dando a vitória ao director da PSP. Seria, portanto, e como já referi, um combate equilibrado, uma vez que o juiz, que foi advogado nos últimos dez anos, recorreria da decisão do árbitro para a Relação e, quatro anos depois, para o Supremo, que sete anos mais tarde decidiria pelo empate, uma vez que nessa altura já ninguém se lembrava deste episódio – que era, aliás, o que eu gostava que me acontecesse a mim.
(Crónca publicada na VISÃO 1466 de 8 de abril)