Com o início do Europeu de Futebol de 2024, associado à passagem da equipa das quinas aos oitavos de final, fiquei seriamente convencido que os ataques ao Ministério Público tivessem um breve momento de tréguas. Não podia estar mais enganado!
São presença assídua em canais de televisão e rádios comentadores, alguns com residência fixa, que sabem e falam de tudo: desde pastéis de nata até mísseis scud, como diria Herman José.
Esta forma de ocupar espaço televisivo não é propriamente recente, mas foi amplamente exponenciada pelo período pandémico da Covid-19, com presença de esclarecidos imunologistas, pneumologistas e intensivistas que elucidavam o cidadão quanto ao tratamento, evolução e cuidados a ter com a doença que a todos nos afetou.
Também desde o dia 24 de fevereiro de 2022, com o início da invasão Russa à Ucrânia, o espaço mediático passou a ter a presença assídua de generais, estrategas militares e especialistas em diplomacia e relações internacionais que nos vão dando conta dos avanços e recuos no teatro de operações, bem como dos apoios obtidos por cada um dos países beligerantes.
Mas o que verdadeiramente me intriga e preocupa é que em relação à Justiça, mais concretamente em relação ao Ministério Público, muitos dos comentadores que vão surgindo no espaço mediático não têm qualquer ligação à área jurídica.
É comum ter economistas, engenheiros, sociólogos, historiadores e até alguns jornalistas a comentar o dia-a-dia dos tribunais, sem ter a mínima ideia da estrutura do ordenamento jurídico português, muito menos da orgânica e funcionamento dos tribunais, em especial do Ministério Público, limitando-se a lançar para o ar comentários completamente incoerentes e contraditórios, a roçar uma certa ignorância, dos quais deviam ter algum pudor.
Mas não, não têm qualquer pejo porque não fazem ideia do que estão a falar, limitando-se a utilizar o jargão de maledicência que carateriza determinados espaços de comentário.
Por outro lado, como é sabido, circula agora por aí “O Manifesto” que apela à iniciativa política para uma verdadeira reforma na justiça, que avançou sob a égide de princípios iluminados e recolheu certamente o apoio de muitos cidadãos de boa-fé que não faziam ideia do que estavam a assinar. Mas, como tantas vezes acontece, sob a aparência da bondade das intenções podem esconder-se estratégias subversivas com objetivos obscuros.
Após uma singela leitura do manifesto, também denominado de sobressalto cívico, resulta evidente que os seus subscritores – reconhecidas personalidades da sociedade portuguesa – não pretendem uma verdadeira reforma na justiça, mas sim uma alteração estrutural do Ministério Público – pilar essencial do Estado de Direito Democrático -, que seja mais conveniente aos poderes instalados.
Será este manifesto uma reação ao rigor, empenho e dedicação que os Magistrados do Ministério Público estão a ditar na concretização das suas investigações e que, ao que parece, estão a incomodar uma certa franja da sociedade portuguesa?! Deixo a questão.
Mas este grupo de personalidades tem diariamente espaço nos meios de comunicação social que utilizam para lançar críticas à ação do Ministério Público, sejam críveis ou imaginárias, mudando os seus interlocutores – os subscritores – consoante o canal televisivo ou o dia da semana, sendo evidente que alguns deles parece nem terem lido o manifesto, ou então não fazem a mínima ideia do que falam.
Percebo agora a irritação do Mister Jorge Jesus, quando em declarações à SIC em 01.06.2014 disse: “Custa-me ver pessoas, que são médicos, advogados a falar sobre futebol. Eu não sei falar sobre medicina. Como é que eles sabem falar sobre futebol? Faz-me uma ‘ganda’ confusão… Uma ‘ganda’ confusão, ‘ganda’, não digo grande, mas sei o que é grande. Isto é cultura aqui de Lisboa.”
É verdade Mister Jorge Jesus, em Portugal existe uma série de personalidades que são completamente ineptas, mas teimam em aparecer no espaço público só para marcar presença. Também a mim me faz uma “ganda” confusão e eu não sou de Lisboa.
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