Recentemente fizeram-me esta pergunta. “Porque acha que temos tanto medo se ser imperfeitos?”. Adoro perguntas que me façam pensar, que não tenham uma resposta óbvia e direta. Esta foi uma delas. Fiquei surpreendida pela simplicidade da pergunta e pela dificuldade na resposta. Comecei a deambular pelos meus pensamentos, pelas centenas de consultas realizadas, pelas problemáticas que atendo, pelos padrões que observo…
Todos sabemos, nem que mais não seja de forma teórica, que a perfeição não existe e que o mundo e o ser humano são imperfeitos. Mesmo assim, mais ou menos consciente, desejamos não ser nós esse ser imperfeito. Mas porquê?
Desejamos a perfeição porque é isso que nos ensinam desde cedo. A perfeição é observada em múltiplos contextos e de variadas formas. Logo, poderemos estar a falar de perfeição quando vestimos aquele vestido de princesa aos dez anos, quando tiramos 18 valores no exame do secundário e entramos na universidade que queremos ou quando “conseguimos para nós” aquela pessoa lindíssima. Poderemos olhar para isto como formas múltiplas de perfeição. Se pensarmos noutra cultura que não a ocidental e concretamente a portuguesa, os sinónimos de perfeição serão seguramente outros, todavia, na cultura em que estamos inseridos, somos confrontados desde cedo com a necessidade de sermos perfeitos… perfeitos para sermos aceites!
Aceites por nós e pelos outros. É como se acreditássemos que não poderemos ser amados na imperfeição. Que apenas a perfeição nos trará a validação, a aprovação, o afeto e o amor dos outros. O problema torna-se ainda maior quando dependemos dessa perfeição (idealizada por nós) para nos aceitarmos e para nos amarmos. Como se apenas o perfeito fosse digno de ser amado.
Mas, nada mais errado que isto. Não conseguimos eliminar o peso e a pressão social para atingirmos determinados objetivos e nos compormos de determinada forma. Contudo, devemos olhar para isso apenas como uma linha orientadora e não nos culpabilizarmos por aquilo que não conseguimos atingir. Devemos dar o nosso melhor para alcançarmos os nossos projetos e objetivos, mas não façamos depender o nosso amor próprio dessas metas e não devemos temer ser menos amados por isso.
Seguramente, ao olhar em volta, estaremos repletos de bons exemplos disto. Exemplos de pessoas que falham e continuam a ser amados, exemplos de pessoas que erram e são perdoadas. O ser humano tem um lado perverso que nos incute pressão, mas ao mesmo tempo, tem uma capacidade enorme de perdoar e de amar. Os pais amam de forma incondicional, os casais perdoam-se vezes sem conta, os amigos conhecem os nossos defeitos e mesmo assim permanecem nas nossas vidas, os filhos vivem frustrados com os “nãos” que recebem mas admiram os pais e os colegas de trabalho vivem em “guerras” mas compreendem que as relações são isso mesmo e passam a vida a dizer que não há contextos perfeitos. Será exatamente por sermos seres imperfeitos?
Respondi a essa pessoa que temos tanto medo de ser imperfeitos porque achamos que apenas sendo perfeitos somos dignos de ser amados, seja por nós mesmos, seja pelos outros. No fundo, esta busca de perfeição é uma busca por amor, afeto e aprovação.