Tendencialmente, em todas as famílias surgem conflitos, discussões e até desentendimentos que podem durar anos. Este é um tema recorrente em psicoterapia, bem como tantas outras questões familiares. Porque terá a família todo este peso na nossa vida? Seja pela sua influência positiva nas nossas vidas ou, exatamente pela sua ausência, a família é um dos grandes marcos no nosso desenvolvimento.
É na família que fazemos as primeiras aquisições, a aprendizagem de normas e valores, é o nosso primeiro ponto de securização e suporte, é o primeiro elemento a traçar as nossas “balizas”. É também no ambiente familiar que aprendemos a relação com os outros e temos, por isso, uma forte tendência a replicar com os outros os nossos padrões de interação familiar. É ainda neste contexto que percecionamos as emoções e aprendemos a lidar com elas.
Todos estes papéis que a família desempenha são insubstituíveis. Mesmo que mais adiante e, noutros contextos, se desenvolvam outras competências, estas aquisições primárias acompanham-nos pela vida fora. O ser humano desenvolve-se e constrói a sua identidade desde muito cedo, sendo a família o seu primeiro modelo. É por esta razão que, compreendendo o desenvolvimento familiar e os padrões de interação entre os vários elementos do sistema familiar, conseguimos compreender muito do funcionamento do individuo.
Da família esperamos amor, encorajamento, incremento e reforço da autoestima, suporte e companheirismo. Contudo, não há famílias perfeitas e não há educação imaculada. Todos as famílias erram, mas é exatamente esse o conceito de família: um grupo que se ama e apoia, independentemente dos erros e falhas de cada um.
Quando somos crianças, temos uma grande necessidade de suporte familiar. Somos dependentes a vários níveis e sentimo-nos vulneráveis. À medida que crescemos, vamo-nos autonomizando, criando inclusivamente algum distanciamento familiar. A adolescência e juventude são, habitualmente, fases pautadas por um maior isolamento e distanciamento familiar. Nada de errado existe neste comportamento. Ele é adaptativo. Esta é uma fase exploratória, em que o ser humano se abre a outras ideias, contacta com outras realidades e olha para as coisas além daquilo que lhe foi ensinado no contexto familiar. Em casos de maior instabilidade, pode gerar-se uma convivência muito conflituosa, passando a estar nesses momentos perante uma situação disruptiva. Contudo, até nestas fases as pessoas continuam a amar-se incondicionalmente. Chegados à idade adulta, gera-se uma tendência para a reaproximação, para a saudade e para o usufruir novamente da companhia da família, mas agora, de forma muito mais madura e já, de igual para igual.
Mas, o que nos faz afinal querer tanto este amor e suporte familiar?
O ser humano tem em si uma grande necessidade de pertença…de pertencer a um grupo, a uma comunidade, a uma religião, a uma terra, a outra pessoa…a uma família. Este sentimento de pertença é organizador para nós, faz-nos ter um ponto de referência, uma base e uma raiz. Traz-nos uma história e uma sensação de conforto para o futuro. Sentir que pertencemos a algum local dá-nos segurança. Talvez isto nos leve, em última instância, a correr em direção à família. Como diz a canção portuguesa “quero voltar para os braços da minha mãe”. Será pela sensação de conforto? De proteção? De reencontro connosco e com quem somos? Ou será tudo junto?
Recordemo-nos que as famílias falham, mas, acima de tudo amam-se e, no limite, os elementos deste grupo tendem a unir-se e a ser suporte uns para os outros. E, isto organiza-nos, dá-nos uma identidade e um sentimento de pertença.
Aproveitemos por isso os momentos em família. Usufruamos da sua companhia e atividades em conjunto. Sejamos tolerantes e lembremo-nos que, estas talvez sejam as pessoas que mais nos amam e a quem mais amamos.