Há algumas semanas e de forma quase casual, observando uma criança de volta de um iPad, dei-me conta de que ela via através do YouTube um vídeo com personagens e cenários do universo dos Lego Duplo. Quando lhe perguntei o que estava ver disse-me isso mesmo, “Legos”. No entanto, começo a ver algumas cenas de violência, assaltos, tiros, que não são habituais.
Com a curiosidade e a inquietação aguçadas a pesquisa levou-me ao encontro de mais filmes desta natureza e que estão ao alcance de um dedo de qualquer idade, a busca do YouTube disponibiliza-os sem grande exigência, basta começar a ver “Lego” e vão aparecendo visíveis na barra direita do ecrã.
No entanto a questão é mais complexa, este aproveitamento de cenários e personagens conhecidos e apreciados pelas crianças é alargado e envolve o Ruca, a Pocoyo e a Peppa Pigs, por exemplo.
Ao abordar esta questão com pais com filhos pequenos constatei que apesar de alguns, muito poucos, se terem apercebido disto, a maioria não tinha dado conta.
Entretanto, há alguns dias li que a administração do YouTube estava a desenvolver esforços no sentido de evitar o acesso das crianças a estes conteúdos. Não sei se o conseguirá com eficácia pelo que julgo mais importante a atenção que nós adultos que lidamos com as crianças possamos dar a esta questão.
É reconhecido que em muitas famílias as crianças muito novas têm acesso a este tipo de equipamentos. A sua utilização por crianças muito pequenas não é de todo recomendada. Para as outras é sugerido o controlo sobre o tempo de utilização e sobre os conteúdos. Os riscos do excesso de exposição estão identificados e envolvem questões ligadas à saúde, visão e fomento do sedentarismo por exemplo, efeitos no desenvolvimento de competências socias, linguagem e comunicação, induzem menor recurso a outras actividades cuja diversificação é fonte de estímulos e desenvolvimento de competências e capacidades diversas, etc.
Também não são raras as situações em que estes dispositivos são utilizados como serviço de “babysitting”, ou seja, as crianças estão “entretidas” com um qualquer ecrã durante demasiado tempo o que “descansa” os pais.
Neste cenário e sem dramatização julgo que a forma como ajudamos as crianças a lidar com estes materiais é de facto importante e a experiência mostra-me que muitos pais se preocupam com os comportamentos e atitudes que devem adoptar.
Os estilos de vida e as particularidades de cada situação não permitem elaborar “receitas” com as quais e no que respeita à educação escolar ou familiar não simpatizo muito. No entanto, creio que poderemos considerar alguns pontos que nos podem ajudar nesta matéria entendidos como orientações.
Não me parece boa ideia “diabolizar” as novas tecnologias, fazem parte do nosso quotidiano e são excelentes ferramentas de acesso a conhecimento e a entretenimento, quer em contexto familiar, quer em contexto escolar. Assim sendo, afastá-las das crianças não parece o mais ajustado.
Nesta perspectiva, exceptuando crianças muito pequenas e por razões óbvias, a proibição não parece uma boa abordagem. A definição de regras, tempo, atenção aos conteúdos e circunstâncias de utilização será uma atitude bem mais ajustada. Não é, evidentemente, uma tarefa fácil mas parece-me imprescindível que sejamos firmes e consistentes nesse sentido, os riscos são elevados e o bem-estar presente e futuro das crianças merece e justifica o esforço.
Conversar com outros pais, educadores/professores ou técnicos sobre estas questões parece também uma boa iniciativa. Verificamos que não somos os únicos a lidar com dificuldades ou inquietações o que pode minimizar alguma insegurança ou receio e podemos partilhar informações e formas de actuar que podem ser úteis apesar das diferenças de cada situação.
Finalmente, creio que a interacção com as crianças na utilização destes materiais é também uma boa opção. Com as mais pequenas porque possibilita ajuda e orientação no uso e com as mais velhas a interacção funciona como forma de supervisão e alerta para “os alçapões” da “net”.
Esta interacção com as crianças é também importante como forma de promover a sua auto-regulação e autonomia nas viagens virtuais. Estão informadas dos riscos, estão informadas sobre a adequação de conteúdos e quando os filtros dos próprios programas não funcionam as crianças decidirão sobre o que acedem ou não acedem, sobretudo quando estão sós. E como sabemos, muitas crianças estão sós, mesmo quando têm adultos por perto.
Sei que não é fácil este caminho mas creio que é importante o esforço de o percorrer.
Boas viagens pela “net” … para pais e filhos.
(Texto escrito de acordo com a antiga ortografia)