No dia 24 de Maio deste ano estava na redacção a trabalhar e partilhava eufórico com vizinhos espantados o que via no ecrã. Uma empresa de que nunca tinham ouvido falar estava a fazer dinheiro a uma velocidade estonteante frente aos nossos olhos. Olhávamos para a página da Pebble no Kickstarter onde tinham acabado de mostrar o que seriam os próximos modelos de relógios inteligentes. Ao fim de um quarto de hora tinham recebido 250 mil dólares, ao fim de meia hora meio milhão, e completada a primeira hora de oferta tinha chovido o milhão pedido para começar a produção.
Eu não estive no primeiro minuto, longe disso mas acabei por me render e tentar comprar um por mais de 200 euros. Nunca o vou receber. Seria o meu terceiro modelo da marca.
Cheguei a estar em pequenos grupos de jornalistas especializados em tecnologia e todos usávamos um Pebble comprado com o nosso dinheiro, quase se tornava uma marca dos que estavam dentro de determinado círculo. Funcionavam com os telefones da Apple e com qualquer Android decente, e esta gente passa a vida a mudar de telefones por obrigação profissional.
Conseguiram uma comunidade de programadores que fazia “caras” para o relógio e pequenos programas gratuitos ou baratíssimos e que era uma das delícias dos utilizadores, a permanente descoberta de um novo desenho ou uma nova aplicação.
Os Pebble eram relógios que acertaram no ponto. Apareceram como projecto no Kickstarter e pediram 100 mil dólares que no fim da primeira campanha de um mês eram quase 5 milhões. Não tinham ecrã touch, os primeiros eram de plástico e com um ecrã a preto e branco. Nada tão glamoroso como qualquer um das muitas marcas que se arrastavam a tentar vender um conceito mal afinado. O Pebble passava para o nosso pulso o essencial e vibrava, o que fez com que eu passasse dias com o telefone em silêncio. Quando queria atender nunca perdia a chamada, se desligava o toque do telefone nem chegava a interromper uma conversa, bastava carregar discretamente no botão certo e o assunto ficava por ali, com a vantagem de mesmo assim ao olhar para relógio saber quem me tinha ligado. Nada daquela angústia de ter que ir ver quem tinha tentado falar comigo.
E a bateria do Pebble durava 5 dias, no meu caso era o suficiente para nas pequenas viagens de trabalho nem me preocupar com o carregador.
Aconteceu-me uma vez sair de casa e levar um outro relógio mais vistoso já a pensar no jantar… Antes da hora de jantar tinha um ecrã preto de um relógio sem bateria no pulso, uma coisa bastante ridícula de se carregar. O Pebble nunca me deixou mal. Além da duração da bateria, avisava que no dia seguinte à tarde poderia já não ter bateria. Sempre com tempo de sobra para tratar disso.
O sucesso da marca foi tal que bateram muitos dos recordes do Kickstarter 20,3 milhões de dólares nos modelos apresentados em 2015.
Dir-se-ia que como iam fazendo novos modelos à medida da procura tinham negócio garantido. Sem que ainda se tenha percebido como, declararam falência, e a Fitbit, umas das concorrentes, foi lá apanhar os restos, o conhecimento, alguns dos que lá trabalhavam e mais coisas, e diz-se que nem assim ficou dinheiro para pagar as dívidas. Esta história será, com certeza, contada ao longo dos próximos meses ou anos e ficaremos a perceber melhor, mas é de facto lamentável que um dos produtos da tecnologia mais bem sucedidos dos últimos anos, e numa área completamente nova tenha desaparecido desta forma inglória. Não tenho a mínima dúvida de que os grandes fabricantes já aprenderam muito com as ideias dos Pebble.