Um intrapreneur é semelhante a um empreendedor, com a grande diferença que actua dentro de uma empresa ou organização já estabelecida. Este conceito tem cerca de três décadas (usado pela primeira vez em 1985 por Gifford Pinchot III), e surgiu numa fase em que quase não existia disponibilidade das empresas para darem liberdade de acção, e recursos financeiros, aos colaboradores que pretendiam lançar novos negócios, produtos ou serviços.
Numa época em que (felizmente) Portugal tem tantos empreendedores, start-ups, incubadoras e afins será importante realçar o papel dos intrapreneurs dentro das organizações. Esta é uma das áreas em que as empresas portuguesas podem melhorar e assim tornarem-se mais inovadoras.
Casos de sucesso
Hoje em dia temos vários exemplos de empresas que passaram do conceito à prática pois perceberam que é uma das melhores formas de desencadear inovação e reter talento.
Google – Gmail: permite que os colaboradores tirem 20% do seu tempo para projetos pessoais. Alguns dos melhores produtos da Google saíram destes projectos, sendo que o mais conhecido será o Gmail. Foi Paul Buchheit o criador do Gmail, tendo iniciado o projeto em 2001 que culminou com o seu lançamento em 01 de abril de 2004.
3M – Post-it: às vezes o intra-empreendedorismo pode acontecer por acaso. Spencer Silver, um cientista da 3M, estava a tentar criar um adesivo extremamente forte para usar numa tecnologia aeroespacial. Em vez disso, acidentalmente, criou um adesivo leve e que colava em diferentes superfícies sem deixar resíduos desagradáveis. Não desperdiçou esta criação e guardou-a até encontrar um uso para a mesma, oque aconteceu após alguns anos quando conheceu Art Fry, outro cientista da 3M. Foi então que começaram a desenvolver um produto juntos e criaram o Post-it.
Sony – Playstation: Ken Kutaragi, um funcionário da Sony, relativamente júnior, passava horas a jogar Nintendo com as suas filhas. De forma a tentar tornar a consola mais poderosa e mais fácil de utilizar desenvolveu o que é hoje uma das marcas mais reconhecíveis no mundo inteiro, a Sony Playstation. Mas, não foi simples atingir o sucesso, pois alguns dos managers da Sony ficaram pouco impressionados com o seu trabalho, pensando que era um completo desperdício de tempo. Felizmente, alguém numa posição mais sénior na organização viu o valor do produto e avançou com o mesmo. Esta situação também demonstra que é necessário estar atento à inovação que aparece nas organizações e não deixar que a própria empresa trate de a “matar” por ser diferente do que vende.
Facebook – “like”: Originalmente chamado de “botão fascinante,” o botão do Facebook logo hoje conhecido por “Like” foi um protótipo que apareceu num dos famosos hackathons do Facebook.
Como podemos constatar, a inovação pode nascer de pequenos passos que são dados por colaboradores nas organizações. Mas para tal acontecer tem de existir liberdade para estes desenvolverem as suas ideias. Irão acontecer erros e falhas, se calhar os seus empregados vão trabalhar menos 10 ou 20% ou têm mesmo de organizar um hackathon ou outros eventos. Mas o mais importante é ter uma cultura organizacional que abrace esta ideia de intrapreneurship e que a mesma sirva o propósito final da empresa e dos seus colaboradores.
Mas será que é um intrapreneur?
Se não é, mas quer ter sucesso no mercado de trabalho de hoje, deve pensar em tornar-se um.
Um intrapreneur revela foco no negócio e tem capacidade de inovar, com a vantagem de desenvolver a sua ideia enquanto trabalha dentro de uma empresa já existente. Em termos de gestão de risco é muito mais favorável, pois continua a trabalhar para a sua empresa, não tendo assim a desvantagem dos empreendedores que deixaram os seus empregos para criarem empresas.
Para ser um intrapreneur tem de agir como se a empresa onde trabalha fosse sua. Esta atitude será o seu grande factor diferenciador, contrariando, aliás, a grande maioria dos colaboradores das organizações.
Mas as empresas com “boas práticas” incentivam o intrapreneurship com o intuito de promoverem a inovação. Assim, os seus funcionários são convidados a questionar o modus operandis da empresa e a pensar em novas linhas de produto, serviço ou formas de operar.
Contudo, deverá saber que se não é um intrapreneur poderá desenvolver competências para se tornar um.
Quais as características de um intrapreneur?
Ágil – não tanto no sentido de ser adaptável ou flexível (apesar de também ser necessário), mas mais na perspectiva de conseguir antecipar tendências de mercado
Resiliência – o falhanço irá acontecer… tem de estar preparado/a para não desistir.
Argucidade – se conseguir aperceber-se de áreas de melhoria na sua empresa poderá inovar a partir dai. Poderá ainda ser capaz de “ligar os pontos” e desenvolver novos produtos ou serviços através de outros já existentes.
Capacidade de comunicação e persuasão – são características essenciais para quem vive dentro de organizações e pretende impor uma ideia ou levar outras pessoas a acreditarem no que está prestes a criar
Analítico – essencial para perceber se a sua ideia é interessante, se tem exequibilidade, se será uma mais-valia para a empresa ou mesmo para a sociedade.
Pensar por si – se simplesmente viver em conformidade com o padrão social e a generalidade da população muito dificilmente poderá inovar.
Ter um bom network – ajudará não só a apresentar a sua ideia às pessoas certas, mas também a desenvolvê-la, recolhendo opiniões sobre o que está a fazer.
Energia – é uma característica de praticamente todos os intrapreneurs e entrepreneurs. Fazer acontecer. Haverá (muitos) momentos em que só contará consigo e só você será capaz de mover montanhas para passar para o nível a seguir.
Paixão – Se você não acreditar dificilmente outros acreditarão.
Tolerar ambiguidade – ser um intrapreneur obriga a um grande esforço intelectual, pois terá necessariamente de saltar da sua rotina para algo inovador e por vezes disruptivo onde nem sempre há uma definição de qual o próximo passo. Vai ter de conseguir viver no limbo da indefinição.
Capacidade de organização – é esta característica que lhe permitirá ser um intrapreneur sem ser despedido, ou seja, se não se organizar vai certamente deixar tarefas por executar, sendo que naturalmente as que sofrem são as rotinas do negócio onde se encontra.
Olhando para estas características penso muitos se identificaram com as mesmas e até alguns se atreverão a pensar que as têm todas. Será assim? Reflicta e procure perceber à sua volta se é mesmo assim. Estas características são desejadas por causa todas as organizações seja para áreas de inovação como para outras, mas são raras as pessoas que as conseguem conjugar numa dose tal em que atingem um equilíbrio interior que lhes permite serem elas próprias e assim poderem pensar, inovar e empreender, dentro ou fora das organizações. Tendo estas características, a grande diferença de um intrapreneur para um entrepreneur é a aversão ao risco do primeiro e a coragem do segundo para dar o “salto” que muitos pensam dar mas que nem todos conseguem.
Sobretudo devido ao enorme desenvolvimento tecnológico assistimos hoje a uma enorme onda de inovação, mas as grandes empresas continuam em ter dificuldade em inovar. Isso acontece porque quando se atinge uma determinada dimensão os investidores tornam-se mais conservadores, os seus líderes menos empresariais e os seus trabalhadores menos dispostos a arriscar o seu lugar por terem ideias “out-of-the-box”. Mas sem inovação as empresas ficam confortavelmente a viver dos sucessos do passado e, eventualmente, acabam por definhar ou mesmo desaparecer.
É imperativo que o intra-empreendorismo corporativo seja alimentado e que as empresas criem condições para que os seus colaboradores possam dar azo à sua imaginação e com isso ajudem os negócios a crescer.
* (O autor escreveu este texto com base na ortografia antiga)