Não queria começar estas crónicas candidatando-me a levar com um taco da Juve Leo, mas arrisco: a seleção portuguesa acabou o seu segundo jogo no Mundial da Rússia com uma fornada de jogadores que, ainda há pouco tempo, estava sob o efeito Bruno de Carvalho e isso notou-se na produção da equipa. É a vida. Pela amostra dada no jogo com Marrocos, só o guarda-redes Rui Patrício não revela mazelas dos recentes episódios do balneário de Alcochete e parece estar a recuperar bem. Não fosse ele e teríamos ido do Rússia-2018 ao México-1986 num Saltillo.
Já Fernando Santos não gostou nada do que viu a partir do banco e disse-o, irritadíssimo, no final. Parece que a equipa não gosta de ter a bola nos pés, resmungou ele. Agora imaginem se o treinador tivesse visto o jogo na televisão: a defesa portuguesa ia parecer-lhe a A1 de madrugada: às escuras e propícia aos aceleras marroquinos. De resto, até foi uma sorte a polícia de trânsito (vulgo VAR) não estar de faxina, caso contrário quem bufava era o Pepe por ter jogado a bola dentro da área com a mão que tinha mais ao pé.
Convém, no entanto, não desesperar: da época das vitórias morais a campeões da Europa, andámos demasiado tempo a empatar, como se sabe. Foram muitas décadas a penar e a lamentar a falta de milagres, mesmo tendo uma multinacional de referência para o efeito. No fundo, é isto: se querem ópera, não a peçam a um engenheiro.
Apesar do triunfo escanzelado e do facto de Portugal ter terminado os 90 minutos a rezar a todos os santos, o jogo permitiu retirar algumas notas positivas. A maior delas foi perceber que, enquanto avançado, Gonçalo Guedes é um ótimo defesa esquerdo. A considerar, portanto.
Quanto a Cristiano Ronaldo, agora em versão barbicha, fez tudo o que é apanágio dos deuses e ao quinto minuto descansou. Só faltavam 85 para jogar, mas não se pode levar a mal: já basta o que lhe cobram de impostos aqui ao lado. Na verdade, desde pequeno que o rapaz anda lá fora a fazer pela vida e a pôr comida na mesa. Na dele e na nossa. E isto de ser génio da lâmpada numa equipa que se assemelha a uma família disfuncional tem muito que se lhe diga. Obrigado, pois, dona Dolores, e não se apoquente: o seu rico filho pode dever ao fisco espanhol aquilo que os tribunais portugueses gastam por ano em papel, mas o País, na verdade, deve-lhe muito.