Em véspera de um jogo decisivo, foi notório o esforço de Fernando Santos para tentar desanuviar o ambiente em torno da seleção e, sobretudo, em torno de Cristiano Ronaldo, muito pressionado pelas fracas exibições e a falta de produtividade dos primeiros dois jogos disputados no Euro 2016. E comparou-o a Amália Rodrigues, explicando que, são ambos símbolos de Portugal. Quereria explicar, assim, a excessiva atenção, nacional e internacional, que recai, nestas alturas, sobre o “Melhor do Mundo”.
Cá para mim, porém, aquilo em que o engenheiro estava a pensar (e se não estava, podia) era no famoso fado de Amália, o Estranha Forma de Vida (letra da fadista e música de Alfredo Marceneiro). Porque o que se tem assistido, nas últimas semanas, em torno da carreira da seleção nacional e do seu maior craque não é mais do que a demonstração clara desta estranha forma muito portuguesa de encarar a vida. Diria mesmo, desta relação esquizofrénica que os Portugueses têm com o futebol.
Senão, vejamos.
Chegámos a França como candidatos ao título. As palavras foram do selecionador, é certo, mas povo e comentadores embarcaram em arco. Sobretudo depois da goleada à Estónia, ninguém nos agarrava. Tínhamos uma equipa imparável. O “Melhor do Mundo”, o meio-campo do Sporting (para os sportinguistas), o furacão Renato (para os benfiquistas) e até o Quaresma parecia finalmente disposto a aparecer. Bem, tínhamos uma defesa de velhotes, mas como ganha quem marca mais golos, a coisa ia resolver-se do meio-campo para a frente. Ah, e tínhamos um treinador do caneco, habituado a fazer brilhares com uma equipa de “coxos” gregos.
Chegou o jogo com a Islândia e… pimba! Com a primeira desilusão, passaram todos de bestas a bestiais. Mas a coisa ia resolver-se logo a seguir, com a Áustria. Chegou o dia e… pimba, outra vez. Com a agravante de Ronaldo ter falhado o penalti que nos garantiria, desde logo, a qualificação para os oitavos de final. Caiu o Carmo e a Trindade. E lá vieram as queixas do costume. Que o Fernando Santos não sabe que sistema utilizar. Que devia era jogar o Adrien. Para outros, com o Renato já estávamos na final (confesso que sou dos que tende a acreditar nesta teoria). Como é que é possível ir para um Europeu jogar sem ponta-de-lança? E, claro, o eterno culpado de tudo: Cristiano Ronaldo. “Só joga no Real Madrid”. “Está velho”. “Passa o jogo a olhar para o ecrã gigante”.
Eis senão quando, com a conjugação de resultados inesperados, sobretudo de Espanha e Inglaterra, Portugal chega à véspera do jogo do tudo ou nada a apenas um ponto de se qualificar e a uma vitória de poder entrar no “caminho mais curto para a final”. Se vencer o seu grupo, a seleção entra no “ramo” da competição que exclui Alemanha, Itália, Inglaterra, Espanha, França (todos ex-campeões) como hipotéticos adversários até à final. E se isto acontecer, podem crer, estaremos, outra vez, a caminho da final. Para ganhar, claro!
Ora, se isto não é um fado da Amália, é o quê?