É de janeiro de 1990 a imagem mais excêntrica do Presidente da República cessante, Aníbal Cavaco Silva. Ágil, atlético, aventureiro e em calções de banho e óculos escuros, o então primeiro-ministro, de 50 anos, subiu a um coqueiro em São Tomé e Príncipe como se toda a vida tivesse andado a subir a árvores exóticas.
Foi apanhado pelo repórter Fernando Gaspar, do Expresso, e a fotografia ajudou a reforçar a imagem de self made man, de político eficaz e de homem comum que o governante procurava inspirar. Outros episódios tornaram-se marcantes na vida de Cavaco Silva por terem ficado registados em imagem – a célebre história do bolo rei é outra das que vem à cabeça mais depressa -, mas esta contribuiu mais para a construção da sua aura de político trabalhador que subiu a pulso do que qualquer outra.
Se fosse hoje, dir-se-ia que foi uma excelente ferramenta de marketing político. E até talvez tenha sido, atendendo a que Cavaco tinha na sua entourage profissionais da comunicação bem atentos e encartados. De qualquer forma, não havia campanha eleitoral à vista (as legislativas seriam 21 meses depois da passagem por São Tomé) e a atitude, além de musculosa, surgiu casual.
A fotografia do inícios dos anos 90 é icónica e pode ser encarada como um símbolo da escalada social e política do filho de uma família modesta, que veio de Boliqueime para Lisboa e chegou ao cargo mais elevado da Nação. Pareceu-me apropriado recordá-la no momento em que Aníbal Cavaco Silva prepara a sua saída do Palácio de Belém – uma espécie de descida do coqueiro.
Curiosamente, sempre olhei para a imagem partindo do pressuposto de que o primeiro-ministro estava a subir à árvore. Até hoje. Hoje, pareceu-me que ele estava a descer.