Afastei-me muito novo da Igreja Católica. Filho de pais católicos progressistas, pregadores e praticantes convictos da tolerância, tive a sorte de poder, desde muito cedo, pensar pela minha própria cabeça. Tive o privilégio de viver a minha dissensão sem culpas, sem castigos ou sequer repreensões. Lembro-me como se fosse hoje: declarei um dia que não tencionava continuar a ir à missa todos os domingos (nem ao barbeiro com a regularidade costumeira). Sem mais. Na altura foi um gesto que tinha mais de desafio à autoridade do que de pensamento consolidado. Mas foi o que foi. Devia ter 14 ou 15 anos e precisava de afirmar a minha independência e a minha diferença. A consolidação e a densificação desse afastamento foram-se fazendo depois, paulatinamente, num percurso de muitos caminhos. Um, mais intelectualizado, pontuado por algumas conversas com alguma Igreja (digamos assim para não particularizar demasiado) profundamente desagradáveis que ainda hoje recordo com repulsa, que me afastou em definitivo do conservadorismo dogmático da Igreja. Outro, mais relevante, de questionamento espiritual, que desembocou no meu particularíssimo deserto de fé.
Dos meus pais, faço questão de repetir, nunca ouvi, em particular nos momentos formadores da minha adolescência, uma só crítica ou um lamento que fosse. Só respeito, genuíno, por um caminho divergente feito pelo meu próprio pé.