Tivemos um primeiro trimestre melhor do que o previsto, com o produto interno bruto a travar a sua longa trajetória de queda. Com sorte, teremos batido no fundo, mas a subida para níveis de crescimento simpáticos continua a ser uma promessa longínqua, dificultada por uma economia europeia também pouco animadora. O pior de tudo isto continua a ser o desemprego que se agrava de dia para dia, sem se vislumbrar qualquer política que seja capaz de lhe por cobro. A verdade é que não há, não pode haver, economia saudável com taxas de desemprego como as que temos hoje, e, sobretudo, quando a falta de trabalho tem cada vez menos almofada social, deixando no ar promessas muito preocupantes de exclusão e conflitos sociais graves.
Parece o “choradinho” do costume, mas o panorama continuará muito cinzento… a não ser que comecem a soprar outros ventos da Europa. É, mais uma vez, a triste realidade, mas esta dependência de terceiros não é um problema apenas nosso. É, também, e desde logo, dos gregos, bem como dos irlandeses, italianos e espanhóis. E também dos ingleses, dos franceses e da generalidade dos parceiros europeus, descontentes com o nível de crescimento, verdadeiramente anémico, dos últimos tempos. A solução está, sobretudo, nas mãos de terceiros, dos parceiros que, como a França (ou uma Alemanha, com juízo), têm mais peso e mais força. Mas nós podemos fazer parte desses “terceiros”, alargando uma frente que cresce todos os dias.
As presidenciais francesas vieram, de facto, alterar os dados do problema. O novo Presidente francês aposta claramente numa política que junta crescimento ao rigor orçamental. E aposta numa imposição dessa política aos parceiros europeus mais ortodoxos. A verdade é que Hollande chega na altura certa – e não é por acaso. A sua eleição deve-se, em primeira linha, à vontade de mudança interna dos eleitores franceses, mas é indiscutível que espelha, também, um desencanto geral com as políticas seguidas pela aliança “merkosy”, sentimento partilhado pelas inúmeras vozes que se erguem, preocupadas, dentro e fora de França e da Alemanha, dentro e fora do espaço europeu, contra a política de austeridade sem crescimento imposta pela chanceler Merkl.
Chega na altura certa para impor esta mudança, porque tudo está a ganhar proporções alarmantes. Porque a Grécia é um caso muito sério e pode ter consequências imprevisíveis para o euro e para o projeto europeu. Mas também porque a “bem-comportada” Itália de Mário Monti exige outras políticas como condição necessária para conseguir arrumar a casa. E porque as crescentes e preocupantes dificuldades de Espanha, e do insuspeito Mariano Rajoy, também as reivindicam de uma forma evidente, apesar do discurso “contorcionista” do chefe de Governo espanhol.
Por tudo isto, o enfoque no crescimento ganha agora outra relevância, não só reafirmado de forma mais viva por quem já tinha a noção da sua importância – caso de alguns dos membros da Comissão Europeia, Durão Barroso incluído – como também defendido por gente para quem assumir esta prioridade era, até há bem pouco tempo, uma autêntica heresia.
Passos Coelho devia apanhar boleia destes novos ventos que atravessam a União para ganhar tempo e margem de manobra. É preciso fazer alguma coisa para travar o desemprego e para sairmos do marasmo económico.
A verdade é que o rigor orçamental de que precisamos e a que estamos obrigados não é incompatível com (todas as) políticas de estímulo ao crescimento. Pelo contrário, o que se está a verificar é que muitas medidas de austeridade, se aplicadas em conjunto e sem “contramedida” de crescimento, podem mesmo ter efeitos altamente perversos no objetivo pretendido de consolidação das contas públicas – para além dos efeitos inaceitáveis a nível do tecido social, a registar recordes não só de desemprego como de marginalização e de pobreza extrema.
Como será também verdade que Passos Coelho já teve tempo de perceber o erro que cometeu ao querer fazer mais do que lhe era exigido pela troika. Todas as reformas, mesmo que bem conseguidas, têm, pelo menos, um custo de adaptação. As chamadas reformas estruturais não escapam a esta regra. Ora, não é possível reformar com sucesso sem garantir os recursos necessários para financiar os custos da mudança. E, não os tendo, o melhor é ficar quieto.
Chegou a altura de aproveitar a mudança de maré e pedir uma navegação mais calma e menos penalizante. Mas com a segurança de quem sabe o que está a fazer e pode garantir as condições para fazer aquilo a que se propõe. E isso só se consegue com grande coesão política interna.
Por tudo isto, é inaceitável este permanente jogo de aproximação/afastamento entre PSD e PS no que respeita à definição das grandes opções políticas que o País está hoje obrigado a negociar com o exterior. Não só em termos de consolidação das contas pública mas também – e é preciso que o primeiro-ministro assuma isto de uma vez por todas – de combate à recessão.
Tempos houve em que o Governo tinha, estrategicamente, de estar calado, à espera de que alguém, lá fora, reparasse na necessidade de fazer alguma coisa pelo nosso crescimento. Mas esse tempo já passou. Todos nós, europeus, precisamos, rapidamente, que seja atribuída prioridade ao objetivo de crescimento. Crescer não é uma opção, é uma questão de sobrevivência. E dar prioridade ao crescimento não significa, necessariamente, repetir os erros do passado – embora, a verdade seja dita, as grandes infraestruturas preconizadas pelos defensores de um novo Plano Marshall não sejam, neste ponto, um bom presságio…