Há poucos dias, fiquei a pensar no que me disse um trabalhador da administração pública: “Uma greve de protesto? Para demonstrar descontentamento? Mas que as pessoas estão descontentes já toda a gente sabe! Eu é que não vou dar um dia de salário ao Sócrates!” Outro interrogava-se: “Muito bem, vou para a greve geral. E depois, o que é que eu ganho com isso?” Palavras que confirmam uma teoria do filósofo, ensaísta e colaborador da VISÃO, José Gil: “As pessoas estão a perder o sentido de solidariedade. Perante uma crise extrema, é cada um por si.” E palavras a que Torres Couto responde (pág. 52), sobretudo, com o argumento do da necessidade de reforço da legitimidade sindical.
Mas este egoísmo latente não se deve apenas à crise. A pergunta é
pertinente: o que é que as pessoas ganharam, nos últimos anos, com greves?
Alguma reivindicação foi satisfeita? Algum despedimento evitado? Algum salário aumentado? Que resultados concretos têm os sindicatos para apresentar? A própria ideia de protesto não se terá banalizado de mais, com a queixa e a reclamação sistemática? Não deixa de ser irónico que a única grande empresa, no setor privado, onde os trabalhadores conseguiram resultados, foi a Autoeuropa, que não conhece greves, mas sim uma negociação contínua, responsável e onde toda a gente veste a camisola. Uma alternativa às formas clássicas de luta sindical, que António Chora, líder da Comissão de Trabalhadores, com a ajuda de patrões ponderados (tão diferentes dos portugueses!…), implantou. Mas ali já se vive em padrões alemães como se depreende do aumento de 3,9% que conseguiram para 2011…
A última grande luta sindical que produziu resultados foi a contestação dos professores contra o sistema de avaliação imposto pelo primeiro Governo de Sócrates. Curiosamente, o desiderato foi alcançado com poucas ou nenhumas greves. Uma estratégia de desgaste contínuo, com presença maciça nos órgãos de comunicação social e nos blogues, marcação cerrada à então ministra da Educação em todas as suas aparições públicas, chantagem da classe na declaração da intenção de voto (antes, tradicionalmente socialista), “catequização” de alunos e pais contra o Ministério, táticas de guerrilha culminadas com as batalhas em campo aberto, nas grandiosas manifestações em Lisboa eis os ingredientes da luta. Luta que se desenvolveu para lá dos sindicatos, de uma forma frequentemente inorgânica e voluntarista: pode mesmo dizer-se que a própria Fenprof foi a reboque, aflita para apanhar o comboio das iniciativas não enquadradas do movimento de base.
Nestas páginas [edição n.º 925 da VISÃO], tentamos perceber quais as tendências das formas de protesto do futuro: presença nas redes sociais ou resolver tudo à bomba? Ao falar da iminência de uma revolta social, Isabel Jonet, do Banco Alimentar, pode estar a referir-se a formas violentas e paralegais de luta. Formas que escapam ao controlo sindical, este baseado em estruturas antiquadas, formatadas para o século passado e ineficazes, do ponto de vista dos ganhos para os trabalhadores que representam. Greve geral, muito bem. Decerto, terá adesão esmagadora. E o que ganhamos nós com isso?