Coerência, determinação, sucesso. A política precisa de special ones. E o País quer Mourinhos em tudo. Qualquer talento que desponte, passa a ser um novo Mourinho. Haverá putativos Mourinhos na Ciência, na diplomacia, talvez nos negócios. No futebol, há inúmeros: o Paulo Sérgio, contratado pelo Sporting, ou o André Vilas Boas, que muitos dão por certo no Porto. Ninguém admite que o sucesso não se copia, com meia dúzia de frases articuladas ou um cabelo à romana e barba de três dias. Que não resulta de contágio pelo contacto próximo com os que o obtêm. Que o segredo de tudo é algo que as elites ignoram (planeamento) e o povo desconhece (produtividade). O sebastianismo nacional não desarma: um Mourinho tem de andar na casa dos 40 anos, falar bem e ostentar uma imagem moderna. Este podia ser, também, o retrato robô de um charlatão – ou o de um proxeneta – mas corresponde ao conceito que temos do homem providencial. Na política, tal efabulação não foi estranha ao sucesso de José Sócrates, no PS. Nem ao êxito recente de Pedro Passos Coelho, no PSD.
José Mourinho, o herói do momento, é, porém, o menos português dos nossos compatriotas. A diferença começa pelo discurso: ele diz o que pensa. Se acha que vai ganhar, afirma que vai ganhar. O ressentimento nacional chama a isto arrogância. Ele chamou-lhe, em Madrid, auto-estima e confiança. Eu chamo-lhe honestidade e coragem.
A marca da diferença continua no método: Mourinho não deixa para amanhã o que pode fazer hoje. Trabalha muito, gere e motiva equipas, documenta-se, estuda, planeia e executa. Quantos de nós o fazemos?
E o divórcio relativamente à praxis lusitana termina nos resultados: sabe o que quer, tem objectivos e cumpre-os. Faz rupturas e assume opções. Numa sondagem, nunca responderia “talvez”, “mais ou menos” ou “assim assim”, items que, em Portugal, obtêm, normalmente, a maioria das respostas, em inquéritos de opinião.
Esta atitude determinada – que funcionou, durante algum tempo, na política, com o estilo Sócrates – só tem êxito duradouro se for secundada pelos resultados – coisa de que o primeiro-ministro não se pode gabar. É que a segurança de nós próprios, bem como a determinação, não é um fim (como em Sócrates) mas um meio (como em Mourinho) para chegar a uma meta. De um certo ponto de vista, Manuel Alegre e Cavaco Silva, provavelmente os principais candidatos a Belém, têm uma costela de Mourinho, na atitude, ao menos, na auto-estima. Mas ao primeiro falta método, trabalho e pragmatismo. Ao segundo, falta, sobretudo, Mundo. E a ambos falta tempo.
O tipo de esperança que Mourinho oferece a quem o contrata é um catalisador ausente da política portuguesa, desde que Cavaco ganhou a sua segunda maioria absoluta, em 1991. A esperança que nos dá Mourinho é um bem concreto, demonstrável, alcançável pelo método e pelo trabalho. A que os políticos nos querem dar baseia-se na intuição, no estilo evangelista e na crendice. Mourinho responsabiliza-se pela esperança. Os políticos responsabilizam-nos por ela. Não adianta procurar um novo Mourinho. É que isso não existe.