Milena do senhor Kafka frequentava a nossa casa naquela altura mandou-me comprar cigarros voltei sem eles na tabacaria esqueci-me do nome Ainda melhor disse assim não vou fumar o pai ofereceu-lhe os seus egípcios Com estes morre-se cedo sorriu e acendeu Ambos morreram pouco depois - pela mão da Alemanha Listopad, Frantisek, Curricula, Dauphin, Praga, 2011 Chovia em português a escutar o cor-de-rosa em cada gota o sotaque da Boémia e o coração volta facilmente e sem inibições pela porta das portas Chovia em português as mangas cosidas descoserei Listopad, Frantisek, Poesie II - Sebrané spisy - svazek II., Dauphin, Praga, 2012. Cada palavra A língua portuguesa crescia nos meus lábios assombrosos de outro jeito escoa o poema às três da manhã quando volta a casa ébrio pela língua checa de outro jeito sofrem os versos cerca das cinco da madrugada a nostalgia portuguesa da pura insónia Quem ambas servisse, quem vivesse com uma mulher a esconder um outro amor Cortinas em movimento tremem na pele láctea do dia Territórios desconhecidos nas horas extra da vida Cada palavra já é o poema Listopad, Frantisek, Rosa Definitiva, Cherm, Praga, 2007 Comprar-te-ei um cavalo em língua checa trotaremos juntos até à Torre de Belém perderemos a gramática enterraremos na terra patrulhas inúteis quando a noite acordar adormeceremos ao colo Listopad, Frantisek, Rosa Definitiva, Cherm, Praga, 2007 A luz portuguesa ajudou-me a encontrar as sandálias na areia As botas de esqui ficaram em Praga as pedras em cima delas na clarabóia da noite Primeiros cinco versos, Listopad, Frantisek, Rosa Definitiva, Cherm, Praga, 2007 Curriculum 57 Foi ontem que eu encontrei o que perdi hoje samambaia de aspetos verbais a síntaxe amanhecerá ó meu verso último Listopad, Frantisek, Curricula, Dauphin, Praga, 2011 Curriculum 33 Na bifurcação há vento quase sempre por isso veste uma camisola escrevo versos para os filhos mas noutro século Listopad, Frantisek, Curricula, Dauphin, Praga, 2011 Curriculum 5 Saudade enorme saudade imensa o campo insustentavelmente longo numa só noite envelhecerei Olhar-se ao espelho obsessivo como o cabelo se tornou grisalho preparado para a saída pelo portão dos portões a gestapo deteve o teu pai disseram Nunca voltou nunca voltar silenciar silêncio Traduzir a dor para uma outra língua Listopad, Frantisek, Curricula, Dauphin, Praga, 2011
Poemas de Jorge Listopad
Por ocasião do centenário nascimento de Jorge Listopad, publicamos uma seleção de poemas do escritor
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