JL: Kinorama termina a sua tese de doutoramento à volta do 3D. De que se trata?
Edgar Pêra: É o meu derradeiro filme 3D, tão cedo não me meto noutra. Fechei um capítulo.
Porquê?
Prende-se não só com toda a complicação que é a pós produção, mas também com a exibição. As salas de cinema de autor raramente têm projetores 3D. Por isso, os filmes acabam por passar em 2D e isso não me interessa. Além de que é muito difícil fazer filmes 3D com orçamentos para documentários…
Acaba por trabalhar nos elos perdidos do cinema, aqueles que não se chegam a concretizar…
No fundo são utopias de cinema. O Kinorama fala disso. É um filme autorreflexivo, que põe outras pessoas a falar do meu trabalho. Há um feedback em relação ao Espectador Espantado. Entra em diálogos com os meus filmes anteriores em 3D.
O 3D não vingou?
Enquanto não houver cinema autoestereoscópico não irá vingar. Hoje as pessoas não querem estar tão imersas no filme, querem ver o telemóvel ou olhar para uma pessoa que está ao lado sem tirar os óculos. Eu queria fazer um filme nos dois sentidos. Usar a paleta na convergência, o foco e o desfoque. Este filme é uma síntese do meu trabalho.
Chegou a alguma conclusão?
Como dizia o Pessoa, não me venham com conclusões, que a única conclusão é morrer. As conclusões são pistas. O Martell, no filme, diz que o artista tem que apontar caminhos, não basta denunciar, é preciso criar utopias. É o que tento fazer.
Escolheu o Jackass como complemento?
Para mim o Jackass é do pouco cinema de vanguarda que consegue agitar, pôr as pessoas desconfortáveis. Naqueles primeiros minutos do filme é um festival… a dez mil imagens por segundo todo o tipo de atrocidades que eles fazem aos próprios corpos. Nos anos 70 era muito mais fácil ir ao extremo, as pessoas não aguentam um filme como o Viva La Muerte, do Arrabal.
Sabemos que agora está a preparar um filme sobre Fernando Pessoa e os heterónimos. Em que fase está?
Contamos acabá-lo pelo fim do ano e começar a ronda dos festivais. É uma viagem pela cabeça do Pessoa. Noventa e tal por cento dos diálogos são dele, mas a história é totalmente ficcionada, é a história de um serial killer que quer matar os heterónimos.