O nº 9 do JL, de 23 de junho de 1981, é o único, nestes 40 anos de jornal, em que uma ‘imagem’ do seu diretor – ou seja: o autor destas linhas – apareceu na capa. Mas a culpa não foi sua, isto é: minha… Eu conto. Tendo ido à Bahia, a Salvador, e feito uma entrevista a Jorge Amado, essa edição teria essa entrevista, intercalada com uma espécie de perfil, como prato forte – tanto mais que o autor de Gabriela, cravo e canela, então o escritor de língua portuguesa mais traduzido e lido em todo o mundo, talvez no auge da sua fama, nomeadamente no nosso país. E, como tinha feito antes relativamente às capas com o Carlos de Oliveira, o José Gomes Ferreira e Fernando Pessoa/ Guerra Junqueiro, para a deste nº 9 pedi um “retrato” do Jorge Amado ao João Abel Manta – inigualável criador de todas as capas e ilustrações das dez peimeiras edições do JL. Mas o João Abel, em vez de fazer o retrato só do Jorge, pôs-me lá no cantinho, de chapéu de palha e camisa de marujo, a entrevistá-lo. Título da peça, no interior, ocupando três páginas: “Jorge Amado, um velho marinheiro da vida e da prosa”.
Mas o texto que abria o jornal, de uma conhecida cidadã alemã, Ilse Losa, que fugida do nazismo viera para Portugal, aqui se casara, radicara e tornara escritora, o texto de abertura era outro: um importante artigo/ensaio sobre o seu compatriota, que o nazismo também forçou ao exílio, um dos maiores escritores da primeira metade do século passado – Thomas Mann. Mais concretamente, sobre os 32 cadernos de “diários”, mais de 5118 páginas, de que Peter de Mendelssonh publicara uma seleção. Outro ensaio, mais à frente, é de José Carlos Seabra Pereira, então um jovem docente da Universidade de Coimbra: “Em torno de uma falsa heteronímia na obra poética de João de Barros”. É a primeira vez que ‘aparece’ nas p. do JL, o que por acaso se recorda neste nº em que está tão presente (ver pp. 14 a 16, 3 e 18)…
Outros textos mais extensos: o escultor Jorge Vieira entrevistado por Rogério Rodrigues; “Açores, a autonomia de ‘um país mais vago que um sonho'”, por António Brandão Moniz; na crítica, Matias Aires na leitura de Henrique Barrilaro Ruas e um dos livros de Jorge de Sena sobre Camões analisado por Alberto Pimenta; a secção de arquitetura assinada pelo arqº José Manuel Fernandes; e nas colunas ou crónicas, três de página inteira: “Tangem as guitarras de Alcácer e Sebastião não aparece”, por Miguel Esteves Cardoso, a atentíssima “Zona Tórrida”, de Irineu Garcia, no caso sobre os 25 anos de Grande Sertão: Veredas, e o “Escrituralismo”, de José Sesinando (de quase uma página, “Quem as meias pretas calça”, por Jorge Listopad).
David Mourão-Ferreira escrevia sobre os Poemas de Políbio Gomes dos Santos, Eugénio Lisboa sobre Jonathan Griffith (“O tradutor traduzido”), Arnaldo Saraiva sobre “o insulto e o 25 de Abril”. Mais críticas, mormente de cinema e teatro, além das de fotografia (por António Sena) e de música (por João de Freitas Branco). O insubstituível “Guarda Livros”, em formato diferente, aconselhava “Leituras para férias”: mais de cem livros, cem!, com a escolha a caber fundamentalmente, claro, aos “nossos” Eduardo Prado Coelho e Fernando Assis Pacheco.
Enfim, de registar ainda que no domínio das crónicas, além das já citadas, “comparecem” mais as de três cronistas regulares – Alexandre Pinheiro Torres, Augusto Abelaira e Nuno Júdice. Já em matéria de notícias/cachas, destaque para duas: a APE prepara o II Congresso de Escritores e, sobretudo, o próximo lançamento de Fernando Pessoa – Uma fotobiografia, antecipando-se parte substancial da introdução da sua organizadora, Maria José de Lancastre.