A leitura da acutilante obra do filósofo suscitou-lhe a vontade de refletir sobre a espera e o medo, construindo o seu texto a partir do episódio de Penélope, a que espera anos a fio o regresso de Ulisses, mas tomando como referência Telemaco, o filho do herói da Odisseia, de Homero. Para isso, criou Pathos, interpretado pelo ator Albano Jerónimo. A banda sonora original é de Vítor Rua e o espetáculo, que fica em cena na sala estúdio até ao fim de Janeiro, conta ainda com a participação, entre outros, do grupo das Avozinhas de Palmela. São o coro da ‘tragédia’ de Cláudia Lucas Cheu, 32 anos, dramaturga, encenadora e atriz que quer fazer um teatro que ponha as pessoas a pensar, um verdadeiro “agente cultural”.
JL: Por que quis falar da espera nos tempos que correm?
Cláudia Lucas Cheu: Temos o mito de d. Sebastião e por aí fora. Estamos sempre à espera que nos venham salvar e não agimos. Esperamos que seja alguém a agir por nós. E parece-me que, neste momento, não só em Portugal, mas a nível mundial, faz todo o sentido falar sobre isto. Porque é preciso que as coisas mudem. Estamos na altura de arregaçar as mangas e agir
O que a motivou no livro de José Gil?
Precisamente a ideia de uma cultura que tem vivido sob o medo e a forma como isso é castrador da nossa identidade. Romper com esse medo, como diz José Gil, é a maneira de nos conseguirmos inscrever no mundo.
Espera que o teatro possa contribuir para essa mudança?
Às vezes, as pessoas não conseguem ver uma saída, mas em vez de ficar no mesmo sítio, talvez seja necessário mudar de lugar. É isso que tento com o meu espetáculo, mesmo do ponto de vista da interpretação . Aboli o conceito de personagem. Albano Jerónimo faz o Pathos, mas não é propriamente uma personagem, vai assumindo as várias vozes que estão dentro da nossa cabeça.
Curiosamente dá-lhe um nome que remete logo para um momento da tragédia.
Interessava-me a ideia do destino, do sofrimento,, que também é paixão, no fundo aquilo que conduz à catarse na tragédia. Esse ‘pathos’ interessava-me na própria conceção do espetáculo e não apenas ao nível do texto.
E Glória tem sido entusiasmante ?
É o maior desafio que já tive no teatro. Demorei um ano e tal a escrever o texto e, durante os ensaios, acabei por re-escrever algumas partes. É a vantagem de também estar a encenar. E foi particularmente desafiante trabalhar entre o universo que tinha pensado para o espetáculo e as propostas que albano Jerónimo, que é um ator muito criativo, me foi propondo. Acho que a mistura é bastante interessante. J Maria leonor nunes