Portugal é um país de risco sísmico moderado, com uma probabilidade de ocorrência de sismos catastróficos relativamente reduzida face a países como Itália, Turquia ou Grécia. Porém, Lisboa, a seguir a Istambul, é a cidade europeia com maior risco sísmico ao nível do potencial impacto que um sismo poderá ter, quer pela densidade populacional, quer pelo estado do edificado. Os últimos sismos mais significativos de que há registo datam de 1531, 1755, 1909, 1969 e 1980, sendo o de 1755 o mais marcante.
Para nós, embora tendencialmente fortes, os sismos são raros, o que não incentiva à prevenção, em ambas as esferas pública e privada. Uma coisa é certa, à luz dos estudos da comunidade científica: um terramoto equiparável ao de 1755 (magnitude elevada na famosa escala de Richter, que varia entre 0 e 10), com origem a sul do Algarve ou no vale inferior do Tejo (zonas de falha na crosta terreste que afetam Portugal), é provável vir a acontecer, só não se sabe quando. Se tal acontecesse à data de hoje, as estimativas apontam para um impacto no PIB de 30 a 40%.
Não obtante, importa notar que o problema não são os sismos em si, mas a capacidade dos edifícios e infraestruturas para resistir aos sismos. Em Portugal existe legislação que obriga ao cálculo sísmico explícito das construções desde 1958, data em que foi publicado o primeiro regulamento e cuja revisão, em 1983, deu origem à legislação técnica atualmente em vigor, que por sua vez, desde 2019 e até 2022, se encontra em fase de transição para o regulamento europeu, denominado de Eurocódigo 8. A existência de normalização específica, ao incrementar o grau de exigência, juntamente com a adaptação dos modelos de ensino nas escolas de engenharia, tem-se traduzido num aumento médio da resistência sísmica das estruturas. Uma forma aproximada e expedita de avaliar a vulnerabilidade da nossa habitação, com base na regulamentação, passa por comparar a data de construção com o ano em que o regulamento entrou em vigor, mais uma tolerância de 2 anos (período de tempo médio entre a publicação das leis e a conclusão das primeiras habitações).
O regime regulamentar poderia, contudo, ser mais eficaz, se houvesse uma maior preocupação da parte dos donos de obra e proprietários relativamente à segurança estrutural, contratando as competências e capacidades necessárias e exigindo informação mais detalhada, e se a fiscalização ao nível do projeto e da obra fosse reforçada. Atualmente basta uma simples declaração do autor do projeto dizendo que cumpre com a legislação em vigor, o que acaba por ser insuficiente para garantir a sua adequada aplicação.
Outra questão a salientar é a reabilitação de edifícios existentes. Antes de 2019, ano em que foi emitida a Portaria 302/2019, não havia qualquer exigência legal para a verificação da segurança sísmica no caso de obras de ampliação, alteração ou reconstrução. Em acréscimo, as intervenções ao nível da recuperação e remodelação de edíficios antigos, principalmente no caso de estruturas de alvenaria, tendem a ser mais complexas e o conhecimento técnico para a sua conceção e execução é, regra geral, reduzido. Neste sentido, ao longo dos anos, para adaptar os edifícios a novos usos e acrescentar novas funcionalidades, têm sido cometidas várias irregularidades, aumentando a vulnerabilidade sísmica, como a aplicação de materiais não adequados e a eliminação de paredes e pilares, ou até cortando barras de madeira nas construções em gaiola, da época pombalina.
A inação em Portugal para enfrentar o problema sísmico de forma preventiva deve-se não só à falta de sensibilidade e capacidade da administração pública para implementar, monitorizar e controlar as medidas mais adequadas, mas também à falta de consciência e conhecimento do público em geral, que acaba por priorizar outros aspetos relacionados com o conforto da habitação.
O acréscimo de custo de um edifício calculado e construído com a adequada resistência sísmica, normalmente, não ultrapassa 3% do valor da obra; na situação de obras de reabilitação, é mais variável, dependendo da vulnerabilidade sísmica e das necessidades de reforço. Em todo o caso, o investimento deverá ser ponderado com os potenciais impactos físicos e económicos aquando da ocorrência de um ou mais sismos, além de outras vertentes relativas à habitabilidade, conforto, promoção, comercialização e gestão dos ativos construídos.
A cultura de prevenção e mitigação do risco sísmico deve ser amplamente promovida, a um nível equiparável ou superior ao de ações que têm vindo a ser levadas a cabo, por exemplo, na área da eficiência energética e sustentabilidade ambiental. Esta disseminação deverá basear-se no triângulo universidades-governo-privados.
Existem já iniciativas entre universidades e entidades públicas, por exemplo, no sentido de avaliar a vulnerabilidade sísmica de edifícios existentes através de um indicador da resiliência aos sismos, carecendo, contudo, de vontade política e privada, tempo e recursos para a sua execução. A sensibilização da população, proporcionando mais e melhor informação, é um fator crítico para responder à problemática do risco sísmico, ao nível da prevenção e da própria reação em caso de sismo – consequentemente, o poder político também ficaria mais sensibilizado para este assunto.
Finalmente, nota-se que, por exemplo, o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) não evidencia qualquer medida relativa à segurança e reforço dos edifícios e infraestruturas face à ação sísmica, denotando a ausência de uma visão estratégica neste domínio. Porém, a saber que a natureza não espera por nós, e a ocorrência de um sismo no futuro com efeitos potencialmente devastadores deve ser considerada.