Um grupo de investigadores está a analisar dados de milhares de pessoas com o intuito de criar algoritmos que sejam capazes de prever a ocorrência de homicídios antes de estes acontecerem. O programa destina-se a ajudar as autoridades a prevenir os crimes e identificar antecipadamente pessoas mais prováveis de se tornarem assassinas. O programa começou por ser apelidado de “projeto para previsão de homicídios”, mas está agora a ser tratado por “partilha de dados para melhorar a avaliação de risco”.
A iniciativa foi adjudicada quando Rishi Sunak estava no cargo de primeiro-ministro britânico e está a usar dados de várias fontes oficiais, como nomes, datas de nascimento, género, etnia e um número que identifica as pessoas na base nacional da polícia. O Ministério da Justiça britânico defende que o programa “vai analisar características que aumentam o risco de se cometer homicídio” e “explorar técnicas alternativas e inovadoras de Ciência dos Dados para efetuar uma análise de risco de homicídio”. Segundo as autoridades, apenas são usados dados de pessoas que estão nos registos das polícias.
A existência do programa foi tornada pública pelo grupo Statewatch, que colocou vários pedidos de informação oficiais e obteve dados que confirmam esta iniciativa. Nessa análise, foi possível constatar que os dados de pessoas que não cometeram qualquer ilícito também vão ser escrutinados, como informações sobre danos auto-infligidos ou relacionados com abusos domésticos. Segundo o Statewatch, dados de quem tenha ido às autoridades pedir ajuda também vão ser incluídos no desenvolvimento dos algoritmos.
Uma secção marcada como “tipo de dados pessoais a ser partilhado” lista vários tipos de acusações criminais, mas também a idade com que a pessoa aparece como vítima pela primeira vez e a idade com que teve contacto com a polícia pela primeira vez. Nas “categorias especiais de dados pessoais”, lê-se que o programa vai considerar “marcadores de saúde que se espera terem grande poder preditivo”, como informações de saúde mental, vícios, suicídio, vulnerabilidade, incapacidades e danos auto-infligidos.
Sofia Lyall, do Statewatch, considera esta tentativa de construir um modelo preditivo de homicídio como “arrepiante e distópica”, salientando que este tipo de ferramentas apresenta falhas desde a conceção: “Este modelo mais recente, que usa dados da nossa polícia institucionalmente racista e do Ministério de Administração Interna, vai reforçar e aumentar a discriminação estrutural que molda o sistema legal criminal”, cita o The Guardian.
Os críticos alertam que minorias étnicas e pessoas desfavorecidas terão maior propensão para serem identificadas como potenciais criminosos. “Como outros sistemas semelhantes, vai codificar o preconceito para comunidades racializadas e de baixos rendimentos. Construir uma ferramenta automatizada para perfilar as pessoas como criminosos violentos é profundamente errado e usar dados sensíveis como de saúde mental, adição e incapacidade é altamente intrusivo e alarmante”, afirma Lyall.
O Ministério da Justiça defende que “o projeto está a ser conduzido para fins de investigação apenas. Foi desenhado para usar dados existentes (…) de criminosos condenados para nos ajudar a perceber o risco de pessoas em condicional virem a cometer violência criminal séria. Um relatório será publicado no devido tempo”.