Em apenas cinco meses, a Worldcoin mais do que duplicou o número de utilizadores em Portugal – passou de 60 mil para mais de 130 mil. E a contar.
Os números poderiam não impressionar se considerar, por exemplo, que esta empresa já vale mais de mil milhões de dólares e tem como fundador nada mais, nada menos do que o agora-omnipresente Sam Altman, também cofundador da OpenAI (a tecnológica que está a abalar o setor) e, por inerência, criador do famigerado ChatGPT. Mas se considerar, por outro lado, que nenhum dos dois grandes serviços da Worldcoin foi sequer lançado, então o número ganha outra relevância.
A Exame Informática já deu a conhecer, detalhadamente, a Worldcoin no final do ano passado. De forma resumida, é uma startup de origem americana que está a desenvolver dois produtos: uma criptomoeda, que tem o mesmo nome da empresa, que está a ser dada (literalmente dada, sem qualquer custo) a quem se registar na aplicação da empresa; e um sistema de autenticação digital que tem por base um código gerado após uma digitalização do rosto e dos olhos (mais particularmente as íris) dos utilizadores.
Os planos da empresa têm sofrido alguns solavancos – basta recordar que o lançamento da criptomoeda Worldcoin chegou a estar prometido para 2022 e ainda não se concretizou –, mas a recente popularidade explosiva do ChatGPT voltou a dar um empurrão à startup. Isto porque à medida que a ideia de uma internet cheia de conteúdos feitos e publicados por robôs (bots) parece cada vez mais próxima, isso faz aumentar a necessidade de um sistema de autenticação que prove que as pessoas são quem dizem ser. E a Worldcoin está a desenvolver um. É como se Sam Altman, com duas empresas diferentes, estivesse a criar o problema (com o ChatGPT) e a solução (com a WorldID).
“Consideramos que estamos a entrar na era da Inteligência Artificial e pensamos em como é que conseguimos trazer o conceito de humanidade para o mundo digital”, disse Pedro Trincão, líder de mercado da Worldcoin para Portugal e Espanha, numa apresentação à imprensa, esta terça-feira, na qual a Exame Informática marcou presença.
“A parte da identificação está a ressonar com muitas pessoas, porque não é algo sobre o qual tenham ouvido falar muito e porque é um problema de primeira ordem quando pensas em IA”, sublinhou também Tiago Sada, gestor de produto da Worldcoin. “Estes são desafios reais, não são apenas engenheiros num laboratório a pensar em problemas hipotéticos”, acrescentou.
O WorldID é, de forma resumida, um sistema de zero knowledge proof (prova com zero conhecimento). A ideia é que alguém consiga provar ser quem é, mas sem precisar de partilhar dados pessoais para o fazer. Um exemplo prático: com um sistema de zero knowledge proof, o António consegue autenticar-se numa rede social ou na aplicação de um banco, mas sem que a rede social ou o banco tenham ficado com o nome, e-mail ou número de telefone do António.
Isto é possível, pois a digitalização da íris dos utilizadores é transformada num longo código de caracteres únicos (hash). E este código só pode ser gerado numa orbe da Worldcoin (a esfera platinada usada durante o processo de registo na aplicação da empresa). A orbe processa a informação, garantindo que o utilizador é um humano vivo (a esfera tem sensores de temperatura para fazer essa verificação) e essa informação é depois transferida para a aplicação móvel do utilizador.
“O zero knowledge proof verifica que uma informação é verdadeira ou falsa, mas sem enviar informação. Nós não enviamos informação, apenas verificamos que a pessoa é quem diz ser”, adiantou Pedro Trincão.
A partir daqui, as empresas que integrarem o sistema de autenticação da Worldcoin nos seus sites e aplicações sabem que os utilizadores que usarem o WorldID são humanos e quem dizem ser. É como se a WorldID fosse um cartão de cidadão de prova da nossa humanidade na internet.
É difícil falar da Worldcoin e da WorldID sem, ao mesmo tempo, dar esta explicação mais alongada sobre o que são e como funcionam. Isto porque a abordagem que trazem para o mercado é diferente da maioria seguida pelas grandes empresas de internet. Para a Worldcoin, os utilizadores são números e caracteres, literalmente – em vez de guardarem um nome de utilizador, um e-mail ou um número de telefone, só guardam a hash gerada no momento do registo (é possível fornecer o número de telemóvel no registo, mas é opcional). E sempre que alguém usar a WorldID para se autenticar num site, esse site também só terá acesso à hash e nunca a qualquer outro dado pessoal (pelo menos por parte da Worldcoin).
A Worldcoin lançou, no final de março, o kit de desenvolvimento (SDK) que permite aos programadores integrarem a plataforma de autenticação WorldID nas suas aplicações e sites. E está pronta para este seu novo ato.
À procura de parceiros em Portugal
Sendo Portugal o principal mercado de testes da Worldcoin (que também está em fase ‘beta’ em Espanha, Chile, Argentina, Quénia, Uganda e Índia, totalizando 1,4 milhões de utilizadores nestes mercados), é também por cá que a empresa pretende testar o lançamento do WorldID.
“Esperamos que nos próximos meses possamos lançar algumas integrações [em serviços] aqui em Portugal. Queremos que seja algo que seja benéfico para os utilizadores”, adiantou Ricardo Macieira, responsável pelo crescimento da startup no mercado europeu.
Durante a apresentação foi também revelado que a Worldcoin fez um investimento no Porto, onde tem agora, através de um parceiro local, um centro de apoio ao cliente, no qual já emprega 35 pessoas, número que pretende aumentar para 50 já nas próximas semanas. Além disso, nos sete postos físicos que a Worldcoin tem atualmente Portugal (um no Porto e seis em Lisboa, menos do que os 13 que tinha no final de 2022), trabalham 50 pessoas (que não são funcionários da Worldcoin, são contratados por empresas especializadas em marketing presencial e ganham uma comissão cada utilizador registado).
Já a moeda Worldcoin propriamente dita será lançada, segundo Tiago Sada, ainda na primeira metade de 2023. “Somos um projeto para garantir a prova de humanidade e para garantir que os humanos prosperam na era da Inteligência Artificial. E isso significa ter [um serviço de identidade] e a parte financeira. Os serviços financeiros são a aplicação definitiva para o uso da identidade”, concluiu o responsável.
Nota de redação: Notícia atualizada para clarificar o investimento feito pela Worldcoin no Porto