Numa coisa estamos todos de acordo: é preciso tomar medidas para diminuir a exposição de crianças a conteúdos perigosos nas redes, incluindo as mensagens de cariz sexual (conhecidos pela sigla em inglês CSAM). Onde parece não haver consenso é acerca da forma de o fazer.
Em agosto, a Apple anunciou novas formas de combater a exposição a menores, com ferramentas que permitiam detetar conteúdos explícitos ou a opção de controle parental de mensagens, que bloqueia a visualização e envio de fotos com conteúdo sexual. O plano não caiu bem entre as organizações de proteção dos direitos civis, preocupadas com questões de privacidade. Numa carta endereçada ao executivo da empresa da maçã, Tim Cook, e assinada por mais de 90 organizações de todo o mundo, escreveram: “Embora esses recursos tenham como objetivo proteger as crianças e reduzir a disseminação de material de abuso sexual infantil (CSAM), estamos preocupados que venham a ser usados para censurar discurso protegido, ameaçar a privacidade e a segurança de pessoas em todo o mundo, com consequências desastrosas para muitas crianças.”
Esta preocupação foi acompanhada da divulgação de alguns estudos de psicólogos e cientistas da computação que apontavam para um efeito perverso, que os avisos sobre privacidade nas redes sociais não reduzem o compartilhamento de fotos nem aumentam a preocupação com a privacidade. “Na verdade, esses avisos, como os dos recursos de proteção infantil da Apple, podem aumentar em vez de reduzir a partilha de fotos impróprias”, defenderam Bennett Bertenthal, Apu Kapadia e Kurt Hugenberg, no The Conversation. Face a esta reação, a Apple decidiu suspender a aplicação das medidas. Agora uma organização internacional que agrega dezenas de organizações de proteção infantil lança uma carta de apoio às medidas da Apple. “Obrigada, Apple, por mostrar o que mais é possível fazer para proteger as crianças. A contribuição da Apple é extremamente significativa e muito bem-vinda”, divulgou a ECPAT, que congrega mais de cem organizações a nível mundial que se batem pela diminuição do risco de exploração sexual de crianças.
Na carta, já subscrita por dezenas de organizações, incluindo a ECPAT Portugal, sublinha-se ainda: “Embora estejamos dececionados com o atraso, sentimo-nos otimistas pelo facto de a empresa não ter dado nenhuma indicação acerca da intenção de reverter a sua decisão ou de abandonar a política. Pelo contrário, a Apple parece ter a intenção de fazer melhorias, talvez também demorando mais para explicar seus métodos e tranquilizar os críticos que não têm nada a temer em relação à privacidade.”