Artigo originalmente publicado na Exame Informática Semanal nº.108 (24/05/2019)
Já sabemos, de muitos vídeos do Youtube, que os Tesla são capazes de bater até superdesportivos em aceleração. Neste aspeto, a versão Performance do Model S (o P100D) é a mais rápida entre os Tesla, sendo capaz, com modo Ludicrous, de fazer dos 0 aos 100 km/h em apenas 2,6 segundos. Mais rápido, por exemplo, que qualquer Lamborghini ou Ferrari produzido em série. E mais rápido que o Model 3 Performance que “se fica” pelos 3,4 segundos.
Mas também sabemos que o Model S e o Model X são carros grandes, muito desenvolvidos a pensar na realidade americana, onde se dá mais importância à aceleração em linha reta e ao conforto do que ao comportamento em curva. E também ficou claro em diversos testes que nem mesmo a versão Performance do Model S consegue manter o desempenho elevado durante muitas voltas a um circuito. O aquecimento do sistema de travões e da bateria levam a que o carro perca desempenho após algum tempo em utilização intensiva. Nada de invulgar para um sedan grande e pesado. Ao fim de contas, o S não foi projetado para esse tipo de utilização.
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No Driving Center do circuito de Paul Ricard, em Marselha, pudemos testar o Tesla Model 3 Performance em situações de condução limite usando sempre o Track Mode
Thomas Fenetre
Model 3 Performance: «ao gosto europeu»
O Model 3 é bem mais compacto que o Model S e, como ficámos a saber em conversa com os engenheiros da Tesla que nos acompanharam em Paul Ricard, foi decidido que iria ser concebido mais ao “gosto europeu” desde a fase inicial do projeto. Apesar de não ser apresentando como um desportivo, mas sim como um familiar de dimensão média, a verdade é que este carro, na versão Performance, demonstrou na nossa análise ser capaz de uma dinâmica incrível, e até de competir com algumas referências do segmento dos sedans desportivos, como é o caso do BMW M3. Não somos os únicos com esta opinião: um teste recente da conhecida revista britânica Top Gear concluiu que o Tesla Model 3 Performance era capaz de bater o poderoso BMW M3 em pista.
Considerando a experiência da análise ao Model 3 Performance, aceitámos o desafio que nos foi lançado pela Tesla: testar o Model 3 Performance em pista e em Paul Ricard, um dos circuitos mais conhecidos da Europa. Juntamo-nos a uma mão cheia de outros jornalistas em Marselha onde pudemos levar o Model 3 Perfomance ao limite, tanto em pista, onde fizemos muitas voltas, como em traçados de teste para verificar as capacidades dinâmicas, incluindo a possibilidade de fazer drifting – uma nova experiência para nós num elétrico, ainda por cima com tração integral.
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É muito fácil manter o carro na trajetória certa. Mesmo em Track Mode os algoritmos dão uma ajuda importante. Mais ao gosto dos amadores do que dos pilotos
Thomas Fenetre
Tesla controla tudo
Neste evento tivemos a rara oportunidade de trocar ideias com alguns dos engenheiros responsáveis pelo desenvolvimento de subsistemas fundamentais, incluindo carroçaria, bateria, motores e software de controlo. Ao contrário do que é habitual na indústria automóvel, a marca gerida por Elon Musk desenvolve todos os sistemas mais importantes internamente. O que significa que na Tesla não são aplicados sistemas desenhados para serem adaptados a vários carros, mas sim sistemas desenvolvidos especificamente para os modelos onde são utilizados.
Os motores, a carroçaria, a bateria, o sistema de infoentretenimento e até a rede de carregamento rápido. Tudo é desenvolvido “em casa”. O que permite, garantem os engenheiros com quem falámos, otimizar todo o carro de modo integrado. Por exemplo, quando se cria os sistemas de controlo de tração e de gestão dos motores, torna-se mais fácil garantir que os dois funcionem em harmonia e que aproveitem ao máximo as capacidades um do outro. O mesmo pode ser dito para outras conjugações, como bateria com motor, ou conjunto motor/bateria com a carroçaria ou bateria com carregadores. Este é, garantiram-nos os engenheiros, a razão que melhor justifica a maior eficiência dos carros da marca relativamente a outros elétricos. Um facto se analisarmos os consumos segundo as normas de teste WLTP onde, por exemplo, o Model X é, em média, 30% mais eficiente que os SUVs elétricos concorrentes já disponíveis
Máxima eficiência
A evolução da eficiência dos Tesla tem sido evidente com o aprimoramento dos modelos. Foram feitas várias melhorias intermédias, não visíveis nos veículos, que permitiram chegar já, segundo os responsáveis da marca, aos 92% de eficiência na conversão da energia armazenada em energia cinética. Muito acima dos menos de 30% de eficiência num veículo com motor de combustão.
O exemplo mais recente foi trazido pela nova arquitetura dos motores elétricos do Model 3. Como estes motores demonstraram ser mais eficientes que os anteriores, foram já aplicados aos Model S e X, que ganharam autonomia e performance. Esta é uma das outras vantagens da Tesla: como depende muito pouco de fornecedores externos, esta marca tem por hábito ir evoluindo os carros de modo progressivo ao invés de apresentar novas versões com intervalos de um ou dois anos.
No Model 3 que, como referimos, foi desenvolvido mais ao gosto dos europeus, foram feitas otimizações com vista ao comportamento dinâmico. Por exemplo, a divisão da massa é quase perfeita: 48:52 (48% de peso na frente e 52% do peso atrás). Ainda mais importante, todos os componentes pesados estão entre os eixos, incluindo a bateria e os motores (traseiro e frontal). O que permite que o carro tenha um comportamento típico de um carro com motor central, a arquitetura preferida para os superdesportivos.
Mas há outros pormenores que fazem a diferença para quem valoriza a condução mais desportiva, como o volante de apenas 354 mm de diâmetro e com uma relação de direção de apenas 10:1. O que significa que se trata de uma direção muito direta. Também os travões são mais poderosos graças a pinças Brembo e são usados pneus de alta performance da Michelin. Tudo de série na versão Performance. A este respeito, é importante referir que conduzimos carros de série sem quaisquer alterações ou afinações, veículos que fomos levantar ao Service Center mais próximo (Marselha). Pode parecer um pormenor, mas não é. Em eventos similares de outros fabricantes é comum que os carros usados tenham sido sujeitos a afinações específicas para a pista.
Todas as características mencionadas fazem com que o Model 3 “comunique” muito com o condutor. Sentimos perfeitamente onde estão as rodas e o que estão a fazer e o comportamento é muito previsível, com a tração integral e o controlo de tração praticamente instantâneo (outra vantagem dos elétricos) a compensar sempre que é necessário e manter o carro na linha pretendida pelo condutor. Num dos testes feitos em estrada aberta, tivemos a oportunidade de ser conduzidos por um piloto experimentado e só podemos descrever a experiência como impressionante: curvas apertadas feitas a velocidades que normalmente só estão ao alcance de carros de competição, acelerações estonteantes e travagens fortes. O carro não demonstrou fadiga, mesmo depois de muitos quilómetros de utilização “abusiva”.
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Mesmo após muitas voltas e muita borracha queimada, o Model 3 Performance manteve o desempenho. Um comportamento muito diferente do Model S ou X
Thomas Fenetre
Track Mode
Praticamente tudo o que dissemos acima já conhecíamos do nosso teste do Model 3 Performance nas estradas nacionais. O que não conhecíamos ainda era a sensação de conduzir nos limites com o Track Mode (Modo de Pista) ativado. Não o fizemos durante o teste por cá por razões óbvias: segurança e respeito pela legislação. Mas quando se tem uma pista e um espaço amplo, com todas as escapatórias de segurança e fechado ao público, ao nosso dispor, tudo muda.
Apesar do desempenho extra que permite, o Track Mode não vai convencer os mais puristas porque nunca desativa por completo os algoritmos de controlo do carro. Aliás, nem essa é uma verdadeira opção devido à forma como os motores e o controlo de tração dos Tesla funcionam. O Track Mode dá mais controlo ao condutor. Aumenta, por exemplo, as possibilidades de o pneu rodar acima dos limites de tração, o que permite queimar mais borracha e fazer com que o carro se atravesse nas curvas. Mas mesmo neste modo, a tecnologia é usada para melhorar o desempenho. Talvez até mais do que no modo de condução normal. Isto porque a Tesla desenvolveu algoritmos e uma programação mais adequada a uma condução agressiva que, por exemplo deixa escorregar propositadamente os pneus porque, depois de estudarem o comportamento dos Michelin PS4S, os engenheiros da Tesla concluíram que esta opção permitia um pouco mais de velocidade.
Outra diferença que se sente bem no Track Mode é o nível de regeneração. Quando se levanta o pé do acelerador se sente ainda mais a desaceleração imposta pela regeneração que recupera energia para as baterias (até 0,3 G). Uma técnica que tem a vantagem de permitir ganhar uns microssegundos na travagem (enquanto o pé move-se do acelerador para o travão o carro já está a desacelerar muito), e, simultaneamente, poupar mais os travões, garantido assim que ficam eficientes durante mais tempo.
Mas está longe de ser tudo. No Track Mode, o sistema de refrigeração da bateria e dos motores do Model 3 funciona de forma diferente. Para começar, logo que ativamos este modo o sistema pré-arrefece a bateria usando o compressor (ar condicionado para a bateria) de modo a garantir que as células se mantenham frescas durante mais tempo. Depois, e talvez o mais interessante, a própria massa térmica armazenada na bateria pode ser usada para arrefecer os motores. Isto através da ligação de dois circuitos de refrigeração que normalmente se mantém separados: o da bateria e o dos motores. Os algoritmos recolhem constantemente dados dos diversos sensores térmicos existentes no carro de modo a ligar/desligar os dois circuitos de refrigeração, combiná-los, aumentar ou diminuir a regeneração… tudo para garantir máximo desempenho durante muito tempo.
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Os testes incluíram vários momentos em que fizemos o Model 3 derrapar e fazer peões. Uma experiência surpreendente para um carro elétrico com tração integral
Thomas Fenetre
Convincente
Depois de várias horas em pista e de muitas curvas em drifting só podemos dizer que ficámos rendidos às capacidades dinâmicas do Model 3 Performance. O que é ainda mais impressionante é que o Track Mode nem estava disponível quando o carro foi lançado. Surgiu, como muitas outras funcionalidades, através de uma atualização remota. Ou seja, os primeiros compradores do Model 3 Performance nem sabiam que iriam ganhar um “carro de corridas” gratuitamente através de uma atualização de software. E, sem poderemos revelar muitas coisas – a isso obrigam os acordos de confidencialidade – podemos desde já dizer que estão a ser desenvolvidas outras atualizações que vão aumentar ainda mais as possibilidades de controlo e configuração do Model 3.
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Depois de algum tempo a aprender a pista e a conhecer melhor o carro ficámos convencidos que, apesar de não ter sido criado para isso, o MP3 Performance pode ser “um carro de corridas” A Tesla criou o carro mais completo do mercado: é um familiar de utilização económica muito bem equipado tecnologicamente, mas também é um desportivo divertido de conduzir
Thomas Fenetre