Desde 2015, os preços das casas em Portugal tiveram um aumento médio de 9,1% ao ano, uma das taxas de crescimento mais rápidas da Europa, segundo a Moody’s. O mercado imobiliário tem sido suportado pelo crescimento económico estável, as baixas taxas de juro e a procura por parte de investidores. Mas, agora, essa tendência de valorização do imobiliário pode estar a chegar ao fim, segundo um relatório divulgado pela agência de notação financeira esta quinta-feira. Os analista da Moody’s apontam cinco razões que poderão levar a um arrefecimento nos preços, apesar de salientarem que ainda há um forte e importante fator que pode dar apoio ao mercado.
Abrandamento da economia
A Moody’s prevê que a economia cresça apenas 0,4% este ano e 0,8% em 2024. Isto depois de a tendência ter sido de um crescimento acima da média europeia desde 2014, excluindo o ano da crise pandémica em 2020. Com o arrefecimento esperado da economia à espreita, os analistas da agência sublinham que os fatores que ajudaram a apoiar o mercado imobiliário – como a descida do desemprego, aumento da confiança dos consumidores – podem estar agora a desvanecer-se. “O atual abrandamento da economia significa que começa a existir uma erosão num fator chave de apoio ao mercado de habitação”, afirmam.
Inflação e juros altos
O problema não é apenas o do abrandamento da economia. Em simultâneo, o custo de vida em Portugal tem aumentado de forma significativa, retirando poder de compra aos portugueses. “O aumento da inflação e das taxas de juro tem constrangido os orçamentos familiares e pressionado os custos com o serviço de dívida, afetando a procura no mercado de habitação e colocando pressão nos preços”, observam os analistas da Moody’s.
Os especialistas da agência notam ainda que em Portugal o acesso a crédito para a compra de casa pode ser mais difícil que noutros países devido às medidas macroprudenciais do Banco de Portugal, que recomenda limites ao rácio entre o valor do empréstimo e o do imóvel a adquirir, ao peso dos custos com o crédito no rendimento (incluindo nesse cálculo uma eventual subida significativa dos juros) e à maturidade dos contratos. “As medidas de política macroprudencial ajudam a conter os riscos à medida que os custos com os empréstimos forem subindo. Ainda assim, o facto é que estas medidas impedem alguns potenciais compradores de casa de terem acesso ao crédito, o que irá pesar na procura por imobiliários”, concluem os analistas da Moody’s.
Ainda assim, neste ponto, há um fator que pode ajudar a mitigar este efeito. “A proporção de casas compradas em Portugal sem recurso a crédito é elevada, o que indica que, até certo ponto, o mercado imobiliário é menos dependente do acesso ao crédito do que o de outros países”, constatam os especialistas da agência americana.
Menos procura de investidores
Antes de o Banco Central Europeu (BCE) começar a subir juros, os investidores deparavam-se com falta de alternativas para aplicar o seu dinheiro. Os depósitos e as obrigações pouco ou nada rendiam e o imobiliário começou a recolher as preferências na tentativa se encontrar um retorno mais generoso. Mas com Frankfurt a carregar no acelerados das taxas de juro, as rendibilidades de ativos de taxa fixa ficaram mais atrativas, o que pode levar a que alguns investidores se retirem do mercado imobiliário para apostar naqueles ativos, refere a Moody’s.
A instituição mostra-se ainda cautelosa em relação à procura de investidores estrangeiros, que representaram 11,7% das compras em Portugal. “Provavelmente, serão mais relutantes do que a população portuguesa a investir no mercado de habitação do país num clima económico difícil”, defendem os especialistas da agência. Além disso, realçam que o provável fim do programa de vistos gold é mais um fator que irá prejudicar a procura dos investidores estrangeiros.
Menor confiança dos consumidores
A Moody’s nota que, nos últimos anos, a elevada confiança dos consumidores em Portugal foi um pilar importante nos preços das casas. No entanto, nos últimos meses, a inflação elevada e as perspetivas de desaceleração da economia levaram a que a confiança tivesse uma quebra acentuada. O último inquérito aos bancos sobre o mercado de crédito já mostrava isso, com as instituições financeiras a notarem que a queda na confiança dos consumidores – em conjunto com as subidas das taxas de juro e do sentimento negativo em torno das perspetivas para o mercado imobiliário – afetou a procura por crédito à habitação no último trimestre de 2022.
Mercado sobreavaliado
A Moody’s defende que “o mercado imobiliário em Portugal mostra sinais de sobreavaliação, o que exacerba os riscos de uma correção nos preços”. A agência nota que “algumas medidas de valor fundamental – como o price to rent [rácio que divide o valor do imóvel pelo valor da renda] e o price to income [rácio entre os preços das casas e o rendimento disponível] – distanciaram-se das médias de longo prazo”, o que indica que as subidas nos preços foram além dos fundamentos económicos. “As correções seguem-se geralmente a períodos em que as subidas nos preços dos ativos excedem os seus valores fundamentais”, avisam os analistas da Moody’s. E há indícios de que foi isso que aconteceu em Portugal. Os modelos aplicados pela agência para avaliar o mercado imobiliário português mostram que o mercado tem preços excessivos face aos fundamentais da economia desde 2017, sem que tenha havido ainda uma correção.
Os especialistas da Moody’s notam que, no passado, as correções acabaram sempre por chegar após períodos de crescimentos explosivos nos preços, como na crise financeira de 2008 e na crise de dívida soberana de 2011-2012. E alertam que, atualmente, se pode estar na iminência de uma correção no mercado.
Falta de oferta pode limitar quedas nos preços
Apesar de todos os argumentos a apontar para uma quebra nos preços das casas, há um fator que pode ajudar o mercado a resistir: a oferta limitada de imóveis que continua abaixo da procura. Neste ponto, a Moody’s não espera que o stock venha a aumentar em breve. Aliás, os analistas da agência admitem que “o aumento dos custos de produção e a falta de mão de obra podem até levar a uma redução na oferta de nova habitação”. Assim, concluem, caso exista uma correção, “a falta de oferta irá limitar a dimensão da descida dos preços”.