Conversámos com António Trindade após o seu almoço no restaurante Aviator 6, no lounge do PortoBay Liberdade, em Lisboa, o boutique hotel de cinco estrelas perto da Avenida da Liberdade. Anfitrião nato, recebeu-nos num dia de muita chuva e anunciada tempestade, já depois de concluída a BTL – Bolsa de Turismo de Lisboa. Em cinco minutos, mudou de roupa, trocando o pullover por uma camisa e um blazer. No bolso guardava pequenos cartões, mas como exímio palestrante que é, nem os consultou para dar início à nossa conversa. Uma intervenção inicial que nos deixou rendidos às suas explicações e aos seus raciocínios sobre turismo e a importância de antecipar a procura e criar boas experiências.
Foi já no fim do encontro que António Trindade recordou o seu passado e o percurso profissional. Vem de uma família madeirense de hoteleiros, do lado paterno, mas não tinha como objetivo ser um deles. No entanto, foi graças a um pedido excecional, precisamente do seu pai, Aníbal Trindade, que começou a trabalhar no ramo um ano antes do 25 de Abril de 1974 e se tornou um visionário do setor turístico. Atualmente, o turismo representa 29% do PIB da Região Autónoma da Madeira, empregando 17% da população ativa do arquipélago.
Licenciado em Direito, na Universidade de Lisboa, exerceu a prática forense durante dois anos antes de se comprometer a aguentar o barco do grupo familiar Dorisol, após a saída de vários diretores em simultâneo. O tempo passou e em 1986, quando Portugal também entrava na CEE – Comunidade Económica Europeia, o empresário foi à procura de sócios para criar a sua marca e ter a verdadeira primeira experiência hoteleira. Aliou-se a David Caldeira, engenheiro químico que trabalhou na banca como economista, e notável da ilha, e juntos associaram-se a hotéis que ou tinham relação familiar com eles ou decidiram juntar-se ao projeto. Em 1988 abriam o Eden Mar, o primeiro hotel do grupo, um quatro estrelas com 146 quartos, inaugurando o conceito de quartos espaçosos e suítes equipadas com kitchenette.
Filho de pai português e de mãe belga, conta-nos como as viagens ao país de origem da mãe levavam horas infindáveis, ora de barco até à Bélgica, ora no regresso de comboio no Sud Express de Paris para Lisboa. Aos 77 anos, é presidente e CEO do grupo PortoBay, mas António Trindade já partilhou a vontade de se manter como chairman do grupo, entrando um novo diretor-executivo ainda este ano. Em breve, haverá novidades no grupo hoteleiro português mais premiado internacionalmente.
Correu bem a BTL – Bolsa de Turismo de Lisboa? Este ano, bateu recordes com 82 mil visitantes…
Nós não temos uma grande dependência do mercado nacional. Mas foi interessante, não só porque veio muita gente de fora, mas porque os nossos habituais clientes também por lá passaram, e não estava à espera. A BTL é a última do ciclo anual das grandes feiras de turismo, depois das três grandes de referência: a World Travel Market, em Londres, em novembro, a Fitur, em Madrid, em fevereiro, e a ITB, em Berlim, logo em princípios de março.
Como pode hoje um hoteleiro ser visionário?
O grande paradoxo que se coloca atualmente na sociedade – em que temos um aumento exponencial da esperança de vida, mas os ciclos de vida dos produtos e das experiências são cada vez mais curtos – é ter de prever o que pode acontecer num espaço de tempo que ultrapasse os cinco anos. A informação que vamos recebendo é tão grande e tão maior do que era há dez ou há 15 anos, que faz com que o ciclo de vida e o ciclo de inovação sejam muito mais rápidos.

Costumo comparar o meu setor com o setor da moda. Temos o exemplo típico da Inditex, dona da Zara, que quando lança uma coleção, coloca-a em lojas estratégicas durante quatro semanas, fazendo assim o teste de estímulo à procura. Depois retira-a, faz as suas contas e tem dois meses para lançar o seu produto, marcado pela imposição da procura. Quando faço um hotel, entre o início da aprovação de um projeto e abrir as portas aos meus clientes, posso facilmente demorar cinco anos. Ou seja, tenho de me adaptar numa perspetiva temporal muito maior. O grande desafio é que a evolução dos cinco anos é muito longa e faz com que tenha de me adaptar às várias vicissitudes e aos diversos ciclos de vida e de inovação.
Sou inovador quando, como detentor da oferta, estimulo a procura, e não quando reajo à procura. Porque quando estou a reagir à procura, corro o risco de perder o ritmo. Vejamos os exemplos da restauração: um restaurante passa de moda com uma facilidade incomparavelmente maior do que passava nas minhas meninice e juventude, em que era algo relativamente perene.
A burocracia também não ajuda?
Infelizmente, vivemos num país onde o setor público não é suficientemente reativo às necessidades de um setor privado ou às necessidades de uma procura. Aí corro o risco de ter os meus projetos ultrapassados no tempo, já não por uma ausência da minha capacidade de visão ou de ser visionário, mas sim por causa da grande burocracia. E isto leva-nos a ter de adaptar as tendências de oferta, correndo sempre um grande risco: quando perco algo no tempo, deixo de ser o visionário que quer estimular a procura, mas entro na fase em que estou a reagir à procura. O facto de haver instituições de regulação tão desfasadas da realidade do turismo faz com que muitas vezes estes ciclos percam o sentido.
Que boas práticas aconselha aos novos hoteleiros?
A política dos “três pês” que o grupo PortoBay defende. A grande diferenciação faz-se conjugando o melhor produto, a melhor promoção, no sentido da melhor distribuição, com as melhores pessoas. Temos uma cultura de ouvir o cliente, de beber do cliente tudo aquilo que ele possa trazer de inovação. Sou mais inovador quando estimulo a procura do que quando reajo à procura. Este é um setor feito para o cliente, de relações humanas.
A oferta customizada, feita à medida do cliente, faz cada vez mais sentido?
Sem dúvida. Há um fator na vida do turismo que é a substituição dos termos boa cama e boa mesa por boa experiência. Por isso, a qualificação das pessoas é também muito importante. Apostámos sempre mais na formação de base sobre a formação académica específica.
É dos poucos grupos hoteleiros a apostar em restaurantes com Estrela Michelin [este ano manteve as duas Estrelas no Il Gallo d’Oro, no The Cliff Bay, que também recebeu a Estrela Verde, emais três restaurantes com recomendação no Guia Michelin].
Reflete o nosso cuidado no preenchimento da experiência. Queremos ter a garantia de que a sustentabilidade da marca se faz pelas boas relações, pelos bons produtos e pelas boas experiências. Consideramos que a gastronomia é uma experiência de eleição durante a estada de um hóspede.
Foi uma estratégia pensada a longo prazo?
Não foi um acaso, nem foi um plano fortemente estruturado e trabalhado. Foi ser suficientemente versátil ao trabalhar o conceito de qualidade, ao ser capaz de diversificar a oferta que levasse o cliente a ocupar os seus tempos livres. Ganhar a Estrela Michelin não era um objetivo. O objetivo tem de ser fazer um produto suficientemente bom que seja reconhecido por qualquer guia.
Portugal tem sabido divulgar a sua gastronomia e os seus vinhos, como os espanhóis fizeram há 20 anos?
Temos de ter a consciência da dimensão de um e de outro país. A evolução da qualidade da gastronomia portuguesa é enorme. Ainda há relativamente poucos anos, um bom prato era aquele que vinha bem cheio e isso agora já não se passa. O consumidor agora tem mais mundo, é mais exigente, mas os chefes também têm mais mundo e estão mais bem preparados.
Qual é a melhor definição de turismo?
Turismo é trazer gente a consumir cá dentro, turismo é exportar cá dentro. Em vez de exportar algo ao preço do produtor, estou a trazer o consumidor cá dentro para pagar a produção, a distribuição, o fator trabalho e, muito importante, o IVA, que é a tributação. Isto tem impacto positivo em todos os setores. Neste momento, em que os Estados Unidos da América vão tributar fortemente as importações, eu digo: vamos ver se temos mais clientes norte-americanos a virem cá consumir porque nessa altura tenho a possibilidade de lhes vender mais e melhor.
O turismo em Portugal não é um só, pois não? Há vários “Portugais”?
O produto que crio está profundamente ligado às características do território. Por isso, quando se fala em pensar no turismo em Portugal, é pensar nas diferentes experiências de Portugal. Cada uma das regiões do País tem as suas características, o que me obriga como empresário a ter de me adaptar a essas mais-valias e perceber qual poderá ser o meu contributo no local. Entendo sempre que o turismo é um fenómeno, é uma indústria de base regional e inamovível. A única exceção têm sido os cruzeiros e mesmo assim têm a sua ligação ao território no interior do navio.
A que se deve o sucesso turístico da Madeira?
A Madeira era o único porto de águas profundas nas ligações marítimas entre a Europa e a África do Sul e a Europa e a América do Sul. Os navios ingleses, alemães e portugueses paravam na Madeira porque não havia a mesma capacidade frigorífica de hoje. Nos anos 20 e 30 do século XX, debandavam do porto do Funchal 20 a 30 barcos por dia. Além disso, a cidade tinha o chamariz de cinco casinos. Os ingleses quando vinham da África do Sul, de regresso a casa, ficavam uma semana para se aclimatarem àquilo que já não era África, mas que ainda não era Europa. A expressão “já chegámos à Madeira” refletia o sítio da mudança de hábitos.
Eu sabia que o empregado que me servia à mesa da Cidade do Cabo até à Madeira, vestia roupa africana em cor caqui; a partir da Madeira já era dinner jacket. A Madeira não era propriamente o destino de sol e praia, mas a ilha subtropical, onde havia um compromisso não só com as realidades tropicais, mas também uma vivência europeia.
Ainda faz sentido falar em época alta do turismo na Madeira?
Já não. Dentro da época alta, existem uns períodos mais baixos do que outros. A Madeira é um caso relativamente excecional porque, por força de várias circunstâncias, faz com que a procura se mantenha a um nível muito elevado durante todo o ano. O grupo PortoBay tem ocupações que ultrapassam os 90% da ocupação ao ano.
E, convenhamos, o Algarve também tem sabido fazer crescer o seu prazo ou os seus períodos de ocupação. E à medida que se vão aumentando as operações, agora situadas entre o final de março e o final de outubro, a pequena restauração e o pequeno comércio têm de perceber que têm de abrir o ano todo.
Com a diminuição do poder de compra, viajar voltou a ser menos democrático?
Essa é uma situação relativamente conjuntural e diz muito respeito a Lisboa. O Porto, no momento presente, tem oferta muito mais aliciante do que Lisboa, porque a capacidade de reação da oferta sobre a procura é efetivamente diferente. Lisboa tem as acessibilidades esgotadas, mas é ainda muito aliciante o preço de uma visita a Lisboa ou de uma saída de Lisboa.
O alojamento local veio redefinir o território?
O contributo do alojamento local para a requalificação urbana é indiscutível. Não era minimamente interessante requalificar imóveis para o arrendamento normal, devido à ausência de liquidez do próprio investimento. Mas tem instrumentos de regulação completamente diferentes dos da hoteleira. As facilidades que se colocam, quer em termos de projeto, quer do próprio funcionamento, não têm rigorosamente nada a ver com a hotelaria. A regulação deve ser tão próxima quanto possível, não só ao aliviar alguns constrangimentos que se colocam em termos hoteleiros, como também nalgumas exigências adicionais que se colocam ao alojamento local.
É um defensor da taxa municipal turística?
A taxa deve ser sempre considerada como uma taxa e não como um imposto. Por isso, é fundamental que seja vista como uma necessidade de contributo do turista para minimizar os impactos negativos que possa causar. Estas taxas devem ter uma abrangência que supera o próprio município e beneficia a região.
Estranharia se na Madeira houvesse manifestações contra o turismo de massa, como aconteceu nas ilhas espanholas?
O madeirense não age dessa forma porque sente que a mais-valia trazida pelo turismo compensa francamente os inconvenientes que eventualmente surjam. Há uma propensão inflacionista, em termos de habitação e dos preços de mercado, mas o que o madeirense sente é que o contributo destas 60 mil camas (metade hoteleiras e metade em alojamento local), para uma população de 250 mil habitantes, quer em termos de emprego, quer em termos de geração de riqueza, são suficientemente compensatórias no que diz respeito a ter este aumento de consumo. Repito: turismo é trazer mais gente a consumir cá dentro. O contributo do turismo é tanto maior quanto o mesmo consumidor estrangeiro possa gerar muito mais riqueza aos outros setores do que o autóctone.
Ainda é possível construir mais na Madeira?
Vou às Baleares ou vou às Canárias e o rácio entre o número de camas e o número de habitantes é em muito ultrapassado. Diria que a Madeira pode ter zonas que já estão superlotadas, sem capacidade de crescimento – a zona de expansão natural do Funchal, que tem os melhores acessos ao mar, os melhores passeios e os melhores restaurantes –, mas há um fenómeno que se passa nas diferentes regiões nacionais, que não é propriamente o alojamento local, é a compra de imobiliário por estrangeiros. A verdade é que posso voar da Madeira para 72 origens, quer dizer que as mesmas 72 origens podem ir à Madeira e ficar para sempre.
A última expansão da pista do aeroporto do Funchal aconteceu há 25 anos. Como se resolve uma nova ampliação?
A pista tem dimensão suficiente. A Madeira é uma ilha com muitas montanhas, tem uma orografia difícil e não foi fácil encontrar a melhor localização. O grande problema do aeroporto não é a sua dimensão, são os seus ventos. Tem havido um atraso enorme na dotação de equipamento para minimizar os efeitos do vento, como também em encontrar alternativas que possam servir a região. O aeroporto da ilha vizinha do Porto Santo tem servido muitas vezes para receber os aviões em momentos de dificuldade e impossibilidade. O que é importante é criar a mobilidade suficiente nas ligações interilhas.
O para-arranca nas obras de melhoria do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, está a prejudicar o turismo?
O Aeroporto de Lisboa não serve só a capital, é um grande hub de abastecimento doméstico nacional, para o Algarve, para o Porto, para a Madeira, para os Açores. Servir preferencialmente os destinos portugueses como fator de atratividade adicional, como fator de alimentação de noites nos outros destinos, é algo que tem de ser assumido como responsabilidade da transportadora nacional. Não só é preciso aumentar as estadas, mas também só deslocando alguns hubs para outros aeroportos nacionais, como Porto ou Faro, fará com que haja mais disponibilidade em Lisboa. Por exemplo, nos voos intercontinentais ou mesmo nos voos europeus, um passageiro fazer Frankfurt-Lisboa-Funchal ou Frankfurt-Porto-Funchal será exatamente o mesmo. Agora a realidade é esta: se se alimentar mais aeroportos alternativos a Lisboa, isso libertará mais lugares para servirem efetivamente a capital.
Fazer o novo aeroporto em Alcochete foi a melhor escolha?
Não sou técnico de aeronáutica, não quero discutir a localização. Alcochete deve ser considerado o grande aeroporto do futuro. Por isso, é fundamental, em primeiro lugar, que se otimize o Aeroporto Humberto Delgado. Um cliente que fique sete noites no hotel vale tanto como sete clientes que fiquem uma noite, a unidade que conta é essa. Perante constrangimentos como o de ter um aeroporto sem capacidade de crescimento, como é que posso responder em termos de oferta a solicitações crescentes da procura? Já que não tenho a possibilidade de ter clientes a mais, então tenho de trabalhar para os ter mais tempo. Este é um fator fortemente diferenciador porque ao passar de duas para três noites, só por isso tenho um aumento de 50%.
Com mais uma crise política e novas eleições legislativas, a venda da TAP volta a ficar suspensa. Como é que este dossier poderá ter seguimento?
Isto é particularmente importante e tem a ver com as opções nacionais na escolha do próximo comprador da TAP. Sou um forte defensor de que a TAP consiga preferencialmente integrar o IAG – International Airlines Group, grupo que controla companhias como a British Airways e a Iberia. Em termos nacionais, é fundamental que percebamos que a nossa capacidade de intervenção à escala europeia precisa de uma dimensão mínima nacional. O mesmo não aconteceria se assumíssemos em conjunto com Espanha uma dimensão ibérica. O caso da Escandinávia, de três pequenos países [Dinamarca, Suécia e Noruega] que souberam integrar-se numa estratégia conjunta, o próprio Benelux [união económica e aduaneira formada pela Bélgica, Holanda e Luxemburgo] e a ligação da Holanda à Alemanha, para ganhar em muitas áreas dimensões mínimas, são três exemplos que devem fazer-nos pensar a sério sobre como definir uma estratégia ibérica de afirmação.

O que ganharíamos em trabalhar em conjunto com Espanha?
Nós somos um país fortemente unitário, com duas regiões insulares. As grandes decisões são sempre assumidas numa base de país unitário, mas muito dependentes da centralidade de Lisboa. E, por isso, outras regiões que não têm peso político, como o Porto ou o Algarve, por exemplo, têm sempre dificuldade em se afirmar, e isto não se passa com Espanha. A assunção do poder regional e do conceito de regionalismo em Espanha tem feito com que haja uma necessidade conjunta a todos os níveis, quer das acessibilidades, quer da afirmação do desenvolvimento económico. Todas as cidades espanholas se cruzam por ligações aéreas e ferroviárias. É esta perceção de uma visão em estrela no desenvolvimento que é preciso ter.
O aumento da oferta hoteleira tem de ser acompanhado pelo transporte aéreo, mas os limites da capacidade aeroportuária são um travão ao turismo. É um círculo vicioso.
Infelizmente. Os hotéis que estão a ser construídos agora foram pensados há cinco ou dez anos. Este ciclo de vida que é maior na oferta e totalmente desfasado do ciclo de procura é um dos grandes problemas desta adaptação em termos de turismo nacional. Aquilo a que se assiste agora no crescimento da oferta em Lisboa eventualmente não aconteceria se houvesse uma informação atual que dissesse que o próximo aeroporto só daqui a dez anos é que vai estar pronto. É fundamental que todos os stakeholders na área da mobilidade, por exemplo, tenham a mesma visão, para que a procura centrada mais em número de noites do que em número de clientes acompanhe o crescimento da oferta.
Os destinos dos voos da TAP condicionam os vossos planos de localização de um hotel?
Preferencialmente, sim. O exemplo do investimento do grupo PortoBay no Brasil [a abertura do primeiro hotel no país, no Rio de Janeiro, em 2007] foi inclusivamente uma segunda opção de investimento. Não fomos para o México, como defendia a nossa empresa parceira Thomas Cook na altura, um dos maiores operadores turísticos europeus, e o Brasil constituía um mercado particularmente importante. São 200 milhões de habitantes, mas só 10%, 20 milhões de brasileiros, viajam. Porque não ter hotéis nos sítios que são grandes geradores de tráfego turístico? Por isso, fomos para o Rio de Janeiro e para São Paulo, em 2009, com uma pequena exceção de Búzios, em 2007, uma unidade só com 20 quartos.
Em que zonas privilegia abrir novos hotéis?
A prioridade a curto prazo é consolidar a operação algarvia. Temos oito unidades hoteleiras na Madeira, tínhamos só uma no Algarve, em ambiente de cessão de exploração, o PortoBay Falésia, em Albufeira, e achámos que era o momento exato para aumentar a nossa capacidade, não só numa lógica de exploração, mas também numa lógica de investimento.
Está a falar da parceria que fez com o grupo da família Humbria Brazão?
Perguntei-lhes se havia interesse em venderem o hotel Blue Ocean, vizinho do lado do PortoBay Falésia, e são eles que nos dizem: “Queremos que sejam nossos sócios nas duas propriedades.” Passámos de 310 para 660 quartos e temos mais projetos que vão suportar o nosso plano de investimentos futuros: mais um hotel no Algarve, na zona velha de Lagos, e um outro na zona velha do Funchal. Queremos consolidar a nossa oferta, ganhar uma dimensão acrescida em termos nacionais, não sem que estejamos francamente abertos a olhar para Espanha.
Esta joint venture é uma forma de fintar os grandes fundos de investimento, responsáveis pelo aumento dos preços do imobiliário turístico?
O aparecimento dos fundos de investimento imobiliário determinou alguma mudança. A visão que tinha como investidor, alguma tolerância sobre os prazos de payback do investimento – se não conseguisse em sete ou oito anos, não perdia a hipótese de melhorar o meu produto, mesmo que o payback fosse aumentado –, fez com que começasse a olhar para o investimento de forma reativa, porque estávamos a ser ultrapassados.
As guerras obrigaram as pessoas a repensar os destinos de férias. A localização geográfica de Portugal tem-nos beneficiado? Mas até quando estaremos salvaguardados?
Enquanto as situações de guerra mais ligadas ao Leste do Mediterrâneo se mantiverem de base regional, seremos ganhadores porque há um princípio de vasos comunicantes no Mediterrâneo, sempre. A oferta turística é superior à procura turística numa base relativamente estável da Europa. Os contributos que tem havido de mercados intercontinentais, nomeadamente do dos Estados Unidos para a Europa, têm sido importantes. Estão criadas as condições para que haja uma diferenciação da nossa oferta turística. Evidentemente, há fatores que alteram esta concórdia. Em primeiro lugar, são os investimentos feitos na bacia Leste do Mediterrâneo em termos turísticos e diria com particular ênfase na Turquia, um grande concorrente da bacia ibérica.
Não podemos esquecer-nos de que a Turquia tem uma Turkish Airlines com 300 e tal aviões com uma ligação intercontinental muito grande, mas serve-se da lira turca. O turismo tem uma importância suficientemente grande para fazer com que a moeda se altere em função da evolução do tráfego para o país. Depois tem muitos exemplos de investimentos verticais, ligados ao transporte, à operação turística e ao hotel.
Alguma vez sentiu a desvantagem da insularidade?
Para um madeirense, o mar é um fator de ligação ao mundo, de libertação e de mudança. Durante muitos anos, até quase meados do século XX, a Madeira era uma região particularmente pobre e vivia das remessas de emigrantes que os barcos levavam para a Venezuela, a África do Sul e o Brasil. Não podemos esquecer-nos de que uma terra de 250 mil habitantes atualmente tem mais de um milhão de madeirenses, de primeira e segunda gerações fora da região.
B.I.
> Nome
António Jorge Mammerickx da Trindade
> Vida
Nasceu a 10 de fevereiro de 1948. É licenciado em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, mas só exerceu advocacia durante dois anos. Toca piano e fez parte do conjunto musical Sweet Lovers, em que tocava viola baixo
> Carreira
Além da atividade hoteleira, tem um passado na política. Foi vereador da Câmara Municipal do Funchal, durante três mandatos, e foi deputado do Partido Socialista duas vezes na Assembleia Legislativa Regional e outras duas na Assembleia da República
Números do Grupo PortoBay
89% ocupação
Taxa de ocupação média anual, em 2023 e 2024
€129 milhões
Receitas em 2024, um crescimento de 11% face ao ano anterior: 116 milhões de euros em Portugal e 86 milhões de reais (14 milhões de euros) no Brasil
4 050 camas
No total dos 1 689 quartos espalhados por 17 hotéis de quatro e cinco estrelas em Portugal (Madeira, Algarve, Lisboa e Porto) e no Brasil (Rio de Janeiro, Búzios e São Paulo)
5 distinções
No Guia Michelin 2024: renovação das duas Estrelas Michelin e a Estrela Verde para o restaurante Il Gallo d’Oro, mais três recomendações para o Avista, o Horta e o Avista Ásia
”
Artigo publicado originalmente na Exame nº 489