O ano de 2023 começou a meio de um terramoto dentro do Governo: no final de dezembro do ano anterior, Pedro Nuno Santos – ministro das Infraestruturas – e o seu secretário de Estado, Hugo Mendes, tinham-se demitido por causa da indemnização de meio milhão de euros dada à ex-administradora Alexandra Reis.
Mas se o virar do ano começou quente na relação entre a TAP e o Governo, a temperatura não viria a arrefecer.
Assistimos à demissão de Christine Ourmières-Widener, em direto nas televisões, por parte de dois ministros, e à nomeação em tempo recorde do novo presidente. Dois meses e muitas madrugadas de uma Comissão Parlamentar de Inquérito; uma sessão de agressões no ministério das Infraestruturas; mais demissões e a intervenção do SIS (Serviço de Informações de Segurança).
Greves de funcionários; muitos atrasos nos aeroportos; um processo de privatização em curso; um processo no tribunal contra a TAP por parte da ex-CEO Christine Ourmières-Widener (e a exigência de uma indemnização choruda). E, depois de tudo isto, um lucro histórico, à boleia de um turismo exuberante, mesmo depois de mais um ano sem que fosse tomada a decisão acerca do novo aeroporto de Lisboa.
Os números
O ano de 2023 da TAP daria, certamente, um filme. Mas daqueles com um final feliz de 177,3 milhões de euros. Trata-se do maior lucro líquido alguma vez obtido pela companhia aérea portuguesa, que compara com o lucro de 65,6 milhões registado no ano anterior.
“Os bons resultados de 2023 confirmam o caminho de recuperação efetuado nos últimos anos pela TAP. Recorde de receitas, ultrapassando a marca dos EUR 4 mil milhões, margens operacionais robustas e resilientes, e uma clara trajetória de desalavancagem, confirmam a solidez financeira do Grupo”, diz Luís Rodrigues, presidente executivo da empresa, em comunicado.
As receitas anuais escalaram mais de 20% para os 4,2 mil milhões de euros, com uma forte ajuda do aumento de vendas de passagens aéreas (+25,4% para os 3 mil milhões) e da manutenção (+24%). As receitas com a carga e o correio caíram 33%. O EBITDA – lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações – foi de 832 milhões de euros (+54% em termos homólogos).
No total, a empresa transportou mais de 15,8 milhões de passageiros, um aumento de 15,2% face a 2022.
Do lado dos gastos operacionais, que também subiram 20,2% para os 3,2 mil milhões, destaca-se o aumento do custo com o pessoal (+73,4%) devido aos acordos que a empresa estabeleceu com os trabalhadores ao longo do ano.
Nos últimos 20 anos, a empresa apresentou lucros por 12 vezes, mas os grandes prejuízos registados entre 2020 e 2021 – devido à pandemia – mais do que ofuscaram os resultados positivos. Neste período, entre lucros e prejuízos, o saldo é negativo em mais de 3 mil milhões de euros. Se descontarmos o efeito destes dois anos, o prejuízo total encolhe para pouco mais de 230 milhões.
Quatro trimestre tirou brilho
Apesar das contas de encher o olho no ano como um todo, a empresa portuguesa regressou aos prejuízos entre outubro e dezembro de 2023, com um saldo negativo de 26,2 milhões de euros, com as receitas a manterem-se praticamente estáveis nos mil milhões de euros.
Neste período, o custo com o pessoal mais do que duplicou passando de 122 para 270 milhões de euros, uma vez que foi neste trimestre que a TAP estabeleceu os acordos de empresa.
“Embora o aumento dos custos seja relevante, o processo dos novos acordos de empresa foi crucial para restabelecer as bases de uma operação fluida e eficiente”, começa por explicar a empresa, no mesmo comunicado, justificando o prejuízo com custos extraordinários de 54,4 milhões.