“A bazuca vai ajudar a economia portuguesa.” Temos ouvido diferentes versões desta afirmação vezes sem conta, por governantes, políticos, responsáveis europeus ou empresários, referindo-se ao impacto do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Mas qual será a dimensão desse efeito? O último Boletim Económico do Banco de Portugal ajuda-nos a compreender melhor.
A mais recente versão do PRR, colocada em consulta pública pelo Governo a 15 de fevereiro, não trazia estimativas de impacto económico da totalidade dos 13,9 mil milhões de euros em subvenções, nem uma avaliação projeto-a-projeto, que permitisse saber quais devem ou podem ser prioritários.
O Banco de Portugal apresenta agora um conjunto de estimativas macroeconómicas cujos resultados apontam para que “o nível do PIB em 2026 seja entre 1,1% e 2,0% superior ao que ocorreria na ausência do PRR”.
“No curto prazo, o estímulo do PRR transmite-se à economia através do aumento do investimento, que desencadeia um aumento da procura interna, das importações e do emprego. As exportações também aumentam, beneficiando do estímulo ser coordenado na Europa”, pode ler-se no documento apresentado hoje pelo banco central. “No médio prazo, com a acumulação de stock de capital, aumenta a capacidade produtiva da economia. Adicionalmente, a modernização do stock de capital e a adoção de novas tecnologias aumentam a eficiência com que os fatores produtivos são utilizados.”
O intervalo entre 1,1% e 2% é explicado pela complexidade do exercício, o que levou à utilização de três modelos diferentes para obter essa estimativa. Além do PIB, as mesmas simulações sugerem que o nível do emprego estará 0,2% a 1,4% mais elevado em 2026 graças ao PRR.
“As nossas previsões são que o efeito mais ou menos permanente em 2026 possa estar entre 1,1 e 2 pontos do PIB. O PIB seria mais baixo em 2026”, afirmou Mário Centeno, durante a conferência de imprensa de apresentação da publicação. O governador do Banco de Portugal notou que se tratava de uma “análise preliminar”, com “efeitos complexos”, mas que sugeria um impacto positivo e “importante”.
Apesar de o impacto positivo ser claro, o BdP identifica algumas interrogações que será necessário esclarecer nos próximos meses. Entre eles estão o timing de chegada ao terreno do dinheiro, a capacidade de execução desses fundos e a forma como eles se distribuem entre investimento/despesa e setor público/privado, assim como a capacidade do programa para melhorar o ambiente de negócios e as externalidades positivas que possa gerar.
“Os aspetos acima referidos prendem-se em larga medida com as questões de implementação – prazos e agilização – e governação – controle, transparência e eficiência dos projetos – do PRR”, escreve o Banco de Portugal. “A magnitude do estímulo financeiro e os prazos de execução do plano constituem desafios importantes à sua implementação.”
A instituição liderada por Mário Centeno nota ainda que o PRR pode traduzir-se em poupanças para o Estado e para as empresas que, se bem utilizadas, poderão aumentar a capacidade produtiva do País, algo que as estimativas referidas anteriormente não refletem.
Recorde-se que o documento preliminar do PRR, datado de outubro, tinha mais informação. Sem PRR, o Governo assumia que Portugal iria crescer ao seu nível potencial entre 2020 e 2030 (1,8%), chegando ao final da década com o PIB ainda 4% abaixo do nível que atingiria se não tivesse existido a pandemia. Com o plano, a expectativa é que cheguemos a 2030 no ponto em que estaríamos sem Covid-19. “O caráter transformador das medidas a apoiar no âmbito do PRR evidenciam que, na sua ausência, o crescimento do PIB no período 2021-26 seria, em média, 0,5 pontos percentuais inferior”, lia-se no documento.
Em outubro, o Governo era bastante mais claro, revelando mesmo os multiplicadores orçamentais, o impacto económico que cada euro de despesa tem na atividade económica. A versão preliminar do PRR falava de um multiplicador de 0,9 em 2021, 1,1 em 2022 e 1,5 entre 2023 e 2026.