Um aluno baixa-se para apanhar uma nota de 100 dólares quando um professor o interrompe e pergunta o que está a fazer? “Estou a apanhar esta nota de 100 dólares”. O professor questiona: “Pense um pouco: nas últimas horas passaram centenas de pessoas por esta nota. Se ela fosse verdadeira, acha que ainda ninguém a teria apanhado?”. A parábola é trazida por Nuno Cordeiro, Director, Financial Services Risk & Regulation Advisory da PWC, e ilustra a oportunidade da transição para uma economia mais sustentável, pouco óbvia para muitas empresas pelos custos e complexidade envolvidos. “Não gera lucros nem competitividade imediata para ninguém”, reconhece o responsável da consultora, que falava esta quarta-feira em mais uma edição da ESG Talks. Uma iniciativa do Novo Banco, em parceria com a PwC, a NOVA SBE, a EXAME e a VISÃO, com o objetivo de discutir os desafios da sustentabilidade ambiental, social e governança corporativa.
A sustentabilidade enquanto vantagem competitiva não é líquida do ponto de vista da maximização dos lucros. Por cada estudo que estabelece a relação causal entre as duas variáveis, existe outro capaz de a desafiar, nota Rodrigo Tavares. O Founder and CEO do Granito Group e Adjunct Professor of Sustainble Finance da NOVA SBE, afirma, no entanto, que “conseguimos ver que empresas mais sustentáveis têm acesso a capital mais barato, têm melhor performance operacional, funcionários mais envolvidos ou mellhor branding e reputação – são vários os argumentos técnicos”.
Num ponto, todos os especialistas estão de acordo: operações sustentáveis são sinónimo de acesso a capital mais barato, seja junto das instituições bancárias, seja no mercado de capitais. Celina Carrigy, Assessora do Conselho de Administração da CMVM, destaca que “os investidores procuram cada vez mais este tipo de investimentos e estão dispostos a pagar um prémio”. Reconhece que o papel de maior proximidade e granularidade da banca junto das empresas será essencial na divulgação e apoio à transição, mas salienta a “grande oportunidade que existe nos mercados financeiros”, onde a procura por títulos verdes supera a oferta atual e cujas entidades de supervisão e regulação são uma garantia adicional de transparência e veracidade da informação reportada.
Já o sistema bancário tem um papel central na operacionalização desta transição, desde logo pelas exigências regulatórias a que o próprio setor terá de responder. O rácio de ativos verdes sobre a totalidade dos ativos na banca portuguesa fica atualmente pelos 4% – dados da PWC – 50% abaixo do rácio da banca europeia. Nuno Cordeiro nota que seriam necessários cerca de €14 mil milhões em ativos classificados como sustentáveis para equiparar o sistema financeiro nacional ao europeu. Uma pool com impacto também na capacidade de financiamento do próprio setor: “No futuro será mais barato aceder a financiamento do BCE com ativos verdes e sustentáveis do que com quaisquer outros”, aponta o especialista da consultora. O papel instrumental do setor estende-se ainda à divulgação, apoio na operacionalização e exigência de critérios e de reporte junto dos clientes empresariais.
Um caminho até agora reservado, quase em exclusivo, às grandes empresas, mas que, a prazo, terá de envolver todo o tecido empresarial. “Não é tecnicamente possível evoluirmos nesta transição sem envolvermos 99% das empresas”, nota Rodrigo Tavares, aludindo à dimensão das PME na economia nacional. Paulo Dias, Corporate Banking da Corticeira Amorim, empresa que já concluiu três emissões ESG, diz que esta não é apenas uma questão de custos de financiamento mas antes de sobrevivência: “Uma empresa que não entre neste comboio não terá apenas acesso a capital mais caro, terá mesmo dificuldades no acesso ao financiamento. Este é um caminho que todos temos de percorrer e é essencial que o façamos o quanto antes”.
Como envolver as PME nesta transição? Na Corticeira Amorim a exigência das melhores práticas estende-se à toda a cadeia de fornecimento: “As empresas querem ter como fornecedores empresas que os ajudem a descarbonizar”.
Dentro de algum tempo, não será apenas uma questão de competitividade ou da existência de benefícios para as empresas que trilhem o caminho da transição sustentável. O responsável da PWC nota que “existirá o risco de incumprimento legal e há um risco associado à inação”, que, em última análise, afeta todos e o próprio planeta.
“Daqui a 10 anos não vamos ter um debate sobre sustentabilidade, ela estará plenamente integrada nas empresas”, conclui Rodrigo Tavares.