Filipe Paixão, 38 anos, não hesita quando afirma que, se o seu diagnóstico de cancro do pulmão tivesse chegado há dez anos – e não há dois – muito provavelmente não estaria a partilhar connosco a sua história. Refere-se especialmente ao facto de ter vindo a beneficiar de terapêuticas inovadoras recentes, que lhe têm prolongado a vida, permitindo-lhe ter a doença controlada.
Felizmente, o caso de Filipe Paixão não é único, pois há cada vez mais possibilidades de tratamento dirigido e eficaz para este tipo de cancro, o qual, segundo os dados mais recentes do Observatório Global do Cancro (Globocan 2022) da Organização Mundial da Saúde, é não só o cancro mais frequente no mundo, como também aquele que mais vidas tira. Em Portugal, e de acordo com a mesma fonte, o cenário é igualmente preocupante, com este tipo de cancro a aparecer como o que mais mortalidade causa – é responsável pela morte de mais de cinco mil pessoas por ano – sendo o terceiro mais frequente, só ultrapassado pelos cancros colorretal e da mama, em primeiro e segundo lugares, respetivamente.
Com as estatísticas a darem conta da enorme dimensão do problema, é necessário continuar a sensibilizar para os fatores de risco desta doença, bem como para os seus sinais e sintomas. É que, quanto mais cedo for diagnosticado, tanto maior é a probabilidade de sobrevivência. Hoje, dia 1 de agosto, assinala-se o Dia Mundial do Cancro do Pulmão.
Tabaco – inimigo, sim, mas não o único
Entre os principais fatores de risco para o desenvolvimento de cancro do pulmão, a pneumologista Ana Figueiredo, presidente do Grupo de Estudos do Cancro do Pulmão (GECP), destaca o tabaco, lembrando que “entre 85 a 90 % dos novos casos são detetados em fumadores”. Como tal, sublinha que “somente com a eliminação de todos os tipos de tabagismo na população é que os casos de cancro do pulmão podem ser reduzidos”.
Mas a verdade é que há casos como os de Filipe Paixão, a quem foi diagnosticado um cancro do pulmão aos 36 anos, sem nunca ter sido fumador, e ter vivido sempre fora de cidades e em ambientes limpos e sem presença de tabaco ou equivalente. Como tal – e este é um dado muito relevante, e para o qual importa chamar a atenção – existem outros fatores de risco além do tabaco, já que “contaminação ambiental, fatores genéticos ou alterações moleculares, também podem ser fatores de risco para cancro do pulmão, embora numa percentagem muito pequena”, salienta Ana Figueiredo.
Quanto aos sintomas que alertam para este carcinoma, a médica explica que são vários e “muitos são comuns a doenças benignas, como a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica [DPOC], o que dificulta o seu diagnóstico”, razão por que todos os sinais devem ser valorizados.
Atenção aos sintomas!
Entre os principais sintomas de cancro do pulmão, a pneumologista Ana Figueiredo destaca os seguintes, aconselhando que, na sua presença, se procure um médico com rapidez.
- Tosse do fumador que se torna irritativa e persistente
- Hemorragia pela boca de sangue vivo ou expetoração escura
- Dor no tórax, ombro e braço
- Dificuldade respiratória
- Pieira ou chiadeira no peito
- Rouquidão e alteração da voz
- Dificuldade em engolir
- Inchaço da face e pescoço
- Fadiga
- Perda de apetite e emagrecimento
- Dor óssea
Tratamentos que salvam vidas
Quando o tumor é detetado precocemente, as possibilidades de tratamento são mais vastas, podendo este ser feito, “na maioria das situações, com cirurgia ou radioterapia, nalguns casos em associação com outros tipos de tratamento”.
Já no caso dos tumores que são detetados em estadios mais avançados e com metastização, ou seja, quando já estão a propagar-se para outros tecidos e órgãos, os médicos dispõem “não só da quimioterapia, mas também da imunoterapia e das terapêuticas-alvo, podendo estas ser utilizadas isoladas ou em associação”, refere a especialista do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Nestas situações, “a escolha baseia-se no perfil molecular do tumor, e também no estado geral do doente e na presença, ou não, de outras doenças que possam impedir o uso de alguns medicamentos”, esclarece.
É precisamente na caracterização do tumor que reside parte importante do avanço científico registado nos últimos anos. Mais concretamente, verifica-se o recurso a biomarcadores que, ao permitirem caracterizar de forma cada vez mais perfeita o tumor, tornam possível um tratamento personalizado.
Graças a esta possibilidade, logo que os especialistas tiveram acesso ao resultado molecular da biópsia pulmonar de Filipe Paixão, este pôde começar a beneficiar de uma terapêutica especificamente dirigida para o seu tipo de tumor (cancro do pulmão com deleção do exão 19 no gene EGFR, um dos tipos mais comuns de cancro do pulmão de não pequenas células), e que ajudou a controlar a doença durante nove meses. Nessa altura, começou a piorar, mas uma boa notícia estava à sua espera: “Felizmente, a progressão da doença coincidiu com o aparecimento de um novo medicamento, com a qual iniciei tratamento de imediato e tive uma excelente resposta.”
Até à data, Filipe Paixão mantém a doença controlada com esta nova terapêutica, tendo sido o “primeiro europeu com a deleção no exão 19 do gene EGFR a fazê-la fora de ensaio clínico”. Nas suas palavras, “o acesso a tratamentos inovadores, principalmente no cancro do pulmão é muito importante”, pois “pode aumentar a longevidade do doente, quem sabe durante muitos anos ou eventualmente entrar em remissão”.
A importância do rastreio
Uma das razões que explica a elevada mortalidade do cancro do pulmão reside no facto de “a maioria dos diagnósticos ocorrer numa fase avançada da doença, em que as taxas de sobrevivência são modestas”, justifica Isabel Magalhães, Presidente da Pulmonale – Associação Portuguesa de Luta Contra o Cancro do Pulmão, frisando que “existem taxas de sobrevivência em estadios iniciais da doença que podem ser até oito vezes superiores às de estadio avançado”. Como tal, defende que “importa promover o diagnóstico precoce, o que é dificultado pela baixa literacia em saúde da população em geral e pelo facto de os sintomas iniciais serem transversais a outras patologias ou, nalguns casos, leves ou inexistentes”.
Uma das formas de conseguir diagnósticos atempados passa pela realização de um rastreio, o qual, se for efetuado através de TAC de baixa dose, “permite reduzir a mortalidade em, pelo menos, 20%”, afirma a responsável, servindo-se dos dados dos principais estudos realizados sobre o tema. Nesse sentido, defende que “a implementação do rastreio populacional em Portugal é da maior relevância e urgência, permitindo salvar vidas, aumentar a qualidade de vida dos doentes e reduzir os elevados custos de tratamento numa fase avançada onde os resultados são ainda modestos”.
Idêntica posição é partilhada por Filipe Paixão, segundo o qual, “não havendo uma cura ou um medicamento que controle a doença de forma eficaz a longo prazo, a prevenção é a nossa melhor arma”.
Mais literacia e equidade em saúde
Quanto às principais necessidades sentidas pelos doentes com cancro do pulmão, Isabel Magalhães aponta, além do rastreio, a importância de haver “uma maior literacia em saúde, promovendo a prevenção da doença e dotando os cidadãos de um maior conhecimento sobre todos os fatores de risco e de sintomas da doença”.
Por outro lado, a presidente da Pulmonale salienta que “é crucial haver um acesso atempado e com equidade ao tratamento para todos os doentes”, sendo que, estando em causa uma patologia complexa, “os doentes deveriam ser tratados em centros de referência, seguindo guidelines atualizadas e com tempos máximos de resposta para cada etapa do percurso do tratamento”. Da mesma forma, o “acesso à inovação em tempo útil” é apontado como uma das necessidades dos doentes, assim como um dos desafios que estes enfrentam atualmente.
Divulgar informação atualizada e credível junto da população em geral sobre cancro do pulmão é um dos principais objetivos da Pulmonale, assim como aconselhar doentes e cuidadores, cooperar com profissionais de saúde e outros parceiros em prol dos doentes com cancro do pulmão, colocar esta patologia na agenda dos decisores, e ainda integrar organismos nacionais e internacionais em defesa dos direitos dos doentes com cancro do pulmão.
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