“Os médicos e a sociedade abordam os problemas de saúde de forma individual, mas falta um pensamento sistémico, uma componente política”. As declarações são de Luís Bronze, cardiologista e presidente da Sociedade Portuguesa de Hipertensão (SPH) que enfatiza a importância de uma abordagem concertada para a redução da prevalência da hipertensão e das suas consequências nefastas na saúde dos portugueses. Não é por acaso: Portugal tem, segundo a SPH, uma das maiores prevalências de hipertensão na Europa — três em cada 10 portugueses sofrem daquela que é a primeira causa de Acidente Vascular Cerebral (AVC) que, por sua vez, é nada menos do que a primeira causa de morte no país, responsável pela morte de 30 pessoas por dia. Também o enfarte do miocárdio, considerado uma doença silenciosa, é frequentemente causado pela hipertensão. A resposta, defende o médico e militar da Marinha, tem de passar pela criação de condições para uma alteração generalizada do estilo de vida. “A hipertensão já é uma pandemia, mas a vacina é cultural”, defende.
Da mesa para a vida
Um elevado teor de sal na dieta é um importante fator de risco no aumento da pressão arterial: ao provocar um aumento do conteúdo de sódio nos fluidos corporais, contribui para a retenção de água e o consequente aumento da pressão arterial. Esta pode ser considerada a ponta do iceberg da problemática da hipertensão em Portugal, cujo consumo de sal está entre os mais altos da Europa, mais do dobro (10,7 g/dia) do valor recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Mas este é apenas um dos fatores de risco que se relacionam com o estilo de vida (ver caixa). “Tem a ver com um conjunto de fatores culturais, como o incremento das taxas de obesidade, a prática mais baixa de exercício físico e os hábitos de trabalho exigentes e stressantes — o stress no local de trabalho é muito relevante para a pressão arterial”, destaca Luís Bronze. A boa notícia é que estes fatores dependem, em grande parte, dos comportamentos, pelo que podem ser alterados.
Do individual para o social
No entanto, uma abordagem individualizada à alteração de comportamentos não é suficiente. De acordo com o médico e militar, cujo percurso como estudante e profissional o levou a viver em África, no Brasil ou nos Estados Unidos da América, as soluções têm de ter em conta a raiz estrutural do problema: “Portugal passou muito rapidamente de uma sociedade pobre e eminentemente rural para uma sociedade moderna e adotou, nos últimos anos, hábitos que levam a fatores que potenciam o risco cardiovascular”. Entre eles, destaca o número elevado de horas de trabalho e o nível socioeconómico baixo de muitas pessoas, que conduzem a uma “depressão elevada” e a um estilo de vida marcado pelo stress e pela angústia da falta de tempo. “A única certeza em Portugal é a incerteza”, diz referindo-se às mudanças cíclicas associadas aos ciclos políticos.
A urgência de um novo sistema
Por outro lado, “sabe-se hoje que viver só e ter poucos amigos agrava muito a saúde cardiovascular, precisamente porque causa stress” e há, também, “cada vez mais pessoas jovens com hipertensão porque dormem cada vez menos”. Em suma, a evolução da hipertensão revela “cada vez mais ângulos”, razão pela qual Luís Bronze advoga respostas sistémicas: “A noção de que a saúde pertence apenas aos médicos é profundamente errada. Se houvesse o mesmo empenhamento político que houve quanto à Covid-19, seria possível baixar os números da hipertensão. Foi uma das poucas vezes na história em que a decisão política foi influenciada pela visão técnico-cientifica”.
Hipertensão: como prevenir
A maioria dos fatores de risco da hipertensão estão associados ao estilo de vida. Alterar comportamentos pode evitar a doença ou melhorar o prognóstico
Mantenha o IMC igual ou inferior a 30
Ter um Índice de Massa Corporal (IMC) superior a 30 é sinal de obesidade. Este valor é calculado dividindo o peso (em quilogramas) pela altura (em metros) ao quadrado.
Modere o consumo de bebidas alcoólicas
Os homens não devem ingerir mais de duas bebidas por dia (por exemplo 3,3 dl de vinho) e as mulheres não mais de uma bebida por dia (por exemplo 1,65 dl de vinho).
Evite o tabagismo
O consumo de tabaco causa doenças cardiovasculares, problemas respiratórios e cancro do pulmão. Os benefícios de deixar de fumar são imediatos.
Adote uma alimentação saudável
Prefira vegetais, fruta, produtos lácteos magros, grãos integrais, peixe, aves, feijão, sementes, nozes e óleos vegetais. Limite sal, doces, bebidas açucaradas e carne vermelha.
Pratique exercício físico
Uma vida sedentária está intimamente relacionada com um maior risco de obesidade, HTA e doenças cardíacas.
Reduza o stress
Elevados níveis de stress aumentam a pressão arterial. Pessoas expostas a situações de stress têm, habitualmente, estilos de vida menos saudáveis.
Fonte: Adaptado de Sociedade Portuguesa de Hipertensão