Produtos que promovem a redução dos efeitos nocivos do tabaco são cada vez mais populares na Europa, sendo percecionados por muitos como formas alternativas de reduzir ou cessar o consumo. Num universo de 37 mil pessoas, inquiridas pelo estudo “Atitudes dos europeus face ao tabaco e aos cigarros eletrónicos”, levado a cabo pela ETHRA (European Tobacco Harm Reduction Advocates), 27 mil assumiram ter conseguido deixar de fumar com a ajuda de vaporizadores e bolsas de nicotina.
A pesquisa, lançada durante o último trimestre de 2020, destinava-se a conhecer a opinião de consumidores de produtos com nicotina sobre as alternativas ao cigarro de combustão. Apesar destes números, e considerando que, só na União Europeia (UE) mais de 12 milhões de pessoas usam diariamente o cigarro eletrónico ou o tabaco aquecido, a mesma pesquisa revela que apenas 37% deste universo acredita que estes produtos têm um efeito menos nocivo na saúde do que o tabaco. Ainda assim, e segundo o estudo da ETHRA, 93% dos utilizadores de vaporizadores inquiridos, revelaram ter optado por estes produtos precisamente pela redução dos efeitos nocivos da nicotina e para melhorar a sua saúde. Outros fatores como o custo mais reduzido do que o tabaco, a disponibilidade de sabores, e a flexibilidade na utilização destas formas alternativas de consumo de nicotina estão entre as principais razões para que os consumidores escolham mudar de hábitos.
Esta mudança no comportamento dos consumidores tem aumentado ao longo da última década, altura em as tabaqueiras começaram a diversificar a sua oferta de produtos, criando novas alternativas ‘smoke-free’ e alterando as suas estratégias em relação ao fumo, ao tabaco, e à nicotina. Uma mudança de paradigma que trouxe uma grande dose de inovação à indústria do tabaco. A opinião é de David Sweanor, professor de direito na Universidade de Ottawa, no Canadá, que marcou presença na edição deste ano do Global Forum on Nicotine (GFN) que, ao longo de dois dias, debateu o futuro da nicotina sob as perspetivas da indústria, dos governos, e dos consumidores. Hoje, refere, “a ciência permite que se entregue nicotina de formas menos prejudiciais do que no tabaco, e sabemos que muitos consumidores estão dispostos a mudar”. Uma opinião partilhada por Derek Yach, presidente da Fundação Smoke-Free World, localizada nos Estados Unidos. “Estamos a viver uma verdadeira revolução na nicotina com a ciência, a investigação e a inovação a trabalhar para o desenvolvimento de novos produtos”. Derek recorda que, em todo o mundo, cerca de 100 milhões de pessoas já usam produtos com menores efeitos nocivos e revela que existem estudos que sugerem que se estes produtos estivessem disponíveis em mais mercados seria possível reduzir as mortes a longo prazo em 3 a 4 milhões.
No entanto, questões regulatórias, tais como a proibição dos produtos ‘smoke-free’ em alguns países ou a redução dos níveis de nicotina para percentagens não aditivas, são obstáculos que a indústria não está a conseguir ultrapassar. “Temos regimes regulatórios sensíveis que ajudam a reduzir o consumo do tabaco mais depressa”, reforça David Sweanor, mas, acrescenta: “não chega”. Para o professor, a inovação neste mercado que vale anualmente em todo o mundo cerca de 1 trilião de dólares, vai sempre acontecer. “A diferença é se queremos ter em conta a saúde pública ou não. Se o mercado se fechar em entidades privadas, os consumidores terão acesso a muito menos informação do que têm agora”. Derek Yach acrescenta: “As políticas relativas a esta indústria têm que ser revistas”. O presidente da Fundação Smoke-Free defende que mesmo entidades como a FDA reconhecem a importância das medidas de redução dos efeitos nocivos, mas reconhece que muitos governos em todo o mundo estão a regular estas ações de forma inversamente proporcional aos riscos.
Faltam alternativas aos consumidores
Não obstante toda a inovação promovida pela indústria do tabaco, bem como a divulgação das alternativas aos cigarros de combustão, estes continuam a ser a forma predominante de consumo de nicotina na Europa. Segundo o estudo da EHTRA, mais de 67% dos fumadores atuais inquiridos querem deixar de consumir, mas não o fazem devido a um conjunto de barreiras, nomeadamente a falta de alternativa de produtos com nicotina, mas com baixo risco para a saúde. Cerca de 31% destes fumadores revelam estar dispostos a experimentar as bolsas de nicotina, cuja venda é proibida na União Europeia (à exceção da Suécia). “A guerra dos Governos contra a indústria do tabaco acaba por ser contra os consumidores”, acredita Jonathan Fell, fundador da Ash Park Global Consumer Franchise Funds, empresa focado em investimentos de longo prazo em diversas indústrias de consumo, incluindo a do tabaco. Em simultâneo, acrescenta, “os grandes players da indústria do tabaco estão a atrasar a campanha pela redução dos efeitos nocivos”.
Para já, e como revela o barómetro da EHTRA, os defensores da redução dos efeitos nocivos aguardam com expectativa as possíveis alterações à Diretiva Europeia para os Produtos de Tabaco (TPD), que restringe a concentração da nicotina a 20 mg/mL, para um volume máximo de depósito de 10 mL, esperando que estes valores possam ser revistos. Nesta pesquisa, 30% dos inquiridos acreditam que deixariam de fumar se este limite fosse aumentado.