Todos os dias 4, mês após mês, Rui Pedro Oliveira, 41 anos, repete o ritual de almoçar ou jantar com a mãe, viúva desde 4 de outubro de 2012. É uma forma de homenagear o pai, falecido antes de ver o mais recente projeto do filho ganhar asas para voar. Quando não está no Porto, onde nasceu, a refeição em companhia materna é substituída pela visita a um monumento religioso. Seja em Nova Iorque ou em Portugal. Foi o que aconteceu a 4 de abril deste ano. “Estava a sair de um compromisso profissional em Lisboa numa sexta-feira, e como já não ia a tempo de estar com a minha mãe, decidi que passaria por Fátima”, conta à VISÃO. Uma decisão que lhe havia de mudar os dias.
Passaram sete meses desde que Rui Pedro teve a sua espécie de aparição, no maior santuário do País. “O que eu tive foi uma ideia para comemorar o centenário das aparições de Nossa Senhora de Fátima aos três pastorinhos, em 2017: fazer um filme totalmente digital, com avatares ou hologramas tridimensionais, em vez de atores. Pensei numa coisa moderna, que pudesse ser vista por crianças e adultos, e que fosse feita ao melhor estilo da Pixar [empresa de animação digital, pertencente à Disney, e autora de sucessos de bilheteira como Nemo ou Toy Story]”.
A mente de Rui Pedro Oliveira é fértil em ideias. Uma delas está patenteada em 148 países e diz respeito a uma superlente capaz de transformar o iPhone numa câmara quase profissional. Por isso, ninguém à sua volta achou o projeto megalómano ou descabido. E ninguém achou que a ideia morreria sem ver a luz do dia.
Um tripeiro no Vaticano
O empreendedor do Porto pôs-se imediatamente em campo. Falou com o vereador da câmara local, reuniu-se com o reitor do Santuário para obter o seu aval para o filme, aproveitou uma ida aos EUA para contactar profissionais de empresas de animação, mandou e-mails, procurou equipas e até já foi recebido no Vaticano, pelo Cardeal José Saraiva Martins.
“Recebi amavelmente na minha Residência Oficial, no Vaticano, o sr. Rui Pedro Oliveira, detentor da chancela de produção do filme animado sobre o Centenário das Aparições de Fátima, a ser lançado mundialmente, em maio de 2017”, escreveu o cardeal numa carta que dirigiu ao núncio apostólico em Lisboa, Monsenhor Rino Passigato. “Aconselho que o projeto seja do conhecimento imediato de Sua Santidade, o Papa Francisco “, acrescentava, na missiva datada de 7 de outubro de 2014.
Decidido a que a ideia chegue mesmo ao Papa, de quem pretende obter uma lista de algumas instituições de apoio a crianças que possam beneficiar com os lucros do filme, Rui Pedro está prestes a viajar para Telavive, onde se reunirá com Henrique Cymmerman, o jornalista, também nascido no Porto, que se tornou íntimo do Sumo Pontífice. Por lá tentará ainda a sua sorte junto de potenciais financiadores ou patrocinadores para o megaprojeto que pode custar cerca de uma dezena de milhões de euros.
O autor espera encontrar o mesmo entusiasmo que sentiu em Fátima, quando Marco Daniel Duarte, diretor do Serviço de Estudos e Difusão do Santuário, disse: “Daqui a 100 anos já não estaremos cá, mas este filme sim”.
Os meses mais longos
Restam 32 meses para produzir o filme e apresentá-lo aos mais de mil milhões de católicos espalhados por todo o mundo, dos 12 aos 100 anos. “A animação será uma mostra do que melhor se faz em Portugal, em termos tecnológicos, e será lançada em simultâneo em todos os países de grande expressão católica, falado em cinco línguas (português, espanhol, inglês, italiano e polaco) e legendado em mais de 20 dialetos.
A ideia é que seja difundido em canal aberto e gostava que fosse o Papa a dar ordem de difusão”, assume Rui Pedro, que já pensa no merchandising, nos DVD’s com extras e, quem sabe, em minisséries.
Das 30 pessoas já contratadas para este projeto, muitas puseram logo mãos à obra. É o caso de Marco di Lucca, Virginie Bourdin e Félix Balbas, os escultores digitais que fizeram parte da equipa criativa de Avatar, Harry Potter ou Cinderela. Todos se instalaram em Portugal para trabalharem com Miguel Abreu, dono da Sketchpixel, empresa responsável pela produção cinematográfica do filme. Outro núcleo, coadjuvado pelo Instituto Politécnico de Tomar, tem a cargo a investigação histórica necessária para reconstituir os acontecimentos de há 100 anos junto a uma azinheira.
A banda sonora será elaborada por “um ilustre compositor e maestro português, cuja identidade ainda não pode ser divulgada por motivos contratuais”, diz Rui Pedro Oliveira, acrescentando que “terá a participação da orquestra DIVAN (composta por palestinianos e judeus), sediada em Sevilha, e chefiada por um judeu argentino, amigo do Papa Francisco”.
Os primeiros bonecos/avatares dos protagonistas Francisco, Jacinta e Lúcia também já estão desenhados. Ainda sofrerão upgrades semanais, até ganharem vida no ecrã, mas já têm cor, roupa e feições. São uma espécie de três pastorinhos do século XXI. Versão 2.0.
Quem é quem?
Pessoas que já estão a trabalhar no projeto que irá para o ar a 13 de maio de 2017
RUI PEDRO OLIVEIRA: Autor da ideia do filme e também CEO da Imaginew, que tem a chancela do Santuário de Fátima para fazer o filme sobre as aparições
MIGUEL ABREU: Líder da equipa e dono da Sketchpixel, empresa de Braga que desenvolve conteúdos tecnológicos, como realidade aumentada e holografia
MARCO DI LUCCA, FÉLIX BARBAS E VIRGINIE BOURDIN: Escultores digitais que participaram em sucessos de bilheteira como: Avatar, Maléfica, X-Men, Harry Potter e Senhor dos Anéis
MARCO DANIEL DUARTE: Presidente da Comissão do Centenário das aparições
CRISTINA ALVES: Ex-jornalista da RTP e coordenadora da investigação histórica que dará origem ao argumento
CARDEAL SARAIVA MARTINS: Recebeu Rui Pedro Oliveira no Vaticano e ordenou que fosse dado conhecimento do filme em projeto ao Papa Francisco