O Papa Francisco não para de me surpreender positivamente. Não só é contra a austeridade e contra o capitalismo selvagem, como é a favor dos pobres e dos presos (que visitou numa cadeia de Roma), e como gosta de dialogar com os agnósticos e mesmo os ateus, por todos serem, por igual, filhos de Deus. Fala, aliás, com as mulheres, ao mesmo nível do que com toda a gente, crentes ou não crentes. Está a lutar contra a corrupção no Vaticano – que sabe que existe – e, da mesma forma, contra a pedofilia. Trata-se de um Papa diferente de tudo o que conhecemos.
Na quinta-feira, 16, recebeu uma delegação de novos embaixadores que apresentaram as suas credenciais ao Vaticano. Do Quirguistão à Antígua e Barbados, do Grão-Ducado do Luxemburgo ao Botsuana, aos quais dirigiu um discurso bem interessante. Disse Sua Santidade, entre muitas outras coisas, cito:
«A humanidade está neste momento a viver uma espécie de viragem na sua história. Não podemos deixar de nos alegrar com os resultados positivos, que concorrem para o bem-estar autêntico da humanidade, por exemplo, nos campos da saúde, educação e comunicação (ou seja o Estado Social). Mas há que reconhecer também que a maior parte dos homens e mulheres do nosso tempo continua a viver dia a dia numa recariedade de consequências funestas. Aumentam algumas patologias, com as suas consequências psicológicas; o medo e o desespero apoderam-se do coração de numerosas pessoas, até mesmo nos países considerados ricos; a alegria de viver vai diminuindo; a imoralidade e a violência estão a aumentar; a pobreza torna-se mais evidente.»
É um Papa que faz a diferença em relação a todos os outros e que reage com sabedoria contra a crise que a União Europeia está a viver
E o Papa Francisco sublinha que «uma das causas desta situação reside na relação que temos com o dinheiro, aceitando o predomínio sobre nós e as nossas sociedades». Mais à frente, no seu discurso, afirma que «seria desejável a realização de uma reforma financeira que fosse ética e produzisse, por sua vez, uma reforma económica salutar para todos». E sintetiza, de modo incisivo: «O dinheiro deve servir, e não governar.» Recordando «ao rico, em nome de Cristo, que deve ajudar o pobre, respeitá-lo, promovê-lo», e exortando à solidariedade e à ética. É, de facto, um Papa que faz a diferença em relação a todos os outros e que reage com sabedoria contra a crise que a União Europeia está a viver. Aliás é amigo do grande Presidente italiano, Giorgio Napolitano, e do atual primeiro-ministro, Enrico Letta.
Escrevi há dias que a Igreja portuguesa estava, a meu ver, demasiado silenciosa em relação à crise financeira, económica, política, social e ambiental que estamos a viver. Como disse Sócrates, «ligada a uma máquina de respiração assistida». Um Governo moribundo, paralisado e com as contradições, ao que parece insanáveis, que existem entre os dois partidos da Coligação, que põem de facto em causa a maioria do Governo.
A Igreja pouco se tem manifestado com exceções notáveis, como o bispo das Forças Armadas, D. Januário Torgal Ferreira, o provincial franciscano, padre Vítor Melícias e frei Bento Domingues, entre outros.
Entretanto, deu-se um acontecimento que, não sendo eu religioso, mas tendo a consciência da importância da Igreja na sociedade portuguesa – o que me fez ajudá-la no pós-25 de Abril, quando foi atacada, como é reconhecido –, me deu muita alegria: a nomeação do novo Patriarca, D. Manuel Clemente.
Conheço-o desde quando ainda não era bispo do Porto e sempre tive por ele uma enorme admiração e respeito. É um homem de grande cultura, um historiador com obra publicada e, permito-me dizêlo, um grande eclesiástico. Participámos em alguns debates públicos e sei, por isso, do que estou a falar. D. Manuel Clemente quebrou algum silêncio da Igreja portuguesa e juntou-se claramente ao que tem dito Sua Santidade. Contra a política de austeridade, o empobrecimento e o desemprego que gera na população. Excelente sinal!