Ambiente: o que está (mesmo) a falhar no clima?

Ambiente: o que está (mesmo) a falhar no clima?

É uma notícia que quase deixou de ser notícia: o ano que agora terminou tornou a marcar a temperatura média da atmosfera mais alta desde que há registos. Já no ano anterior acontecera o mesmo, com 2023 a bater o máximo.

Mas, da mesma forma que uma andorinha não faz a primavera, um ano quente não prova, por si só e para lá de qualquer dúvida, o aquecimento global. Sim, 2024 é o ano mais quente, mas podia ser apenas uma anomalia – não fosse o caso de ser o episódio mais recente de uma longa série.

Em vão Guterres elegeu o clima como prioridade, mas tem sido impotente para impedir fracasso atrás de fracasso nas cimeiras do clima

Não é coincidência que os dez últimos anos sejam os dez mais quentes que se conhecem. Faz parte de uma tendência. A média entre 2015 e 2024 ficou 1,28°C acima da média 1850-1900 (que costuma ser referido como “período pré-industrial”), de acordo com os dados do C3S – Serviço Copernicus para as Alterações Climáticas, da União Europeia. Os dez anos anteriores, 2005-2014, ficaram 0,92°C acima. Os dez antes disso, 1995-2004, 0,75°C. E os dez ainda anteriores, 1985-1994, 0,55°C.

Ou seja, se analisarmos e compararmos o aumento da temperatura média global da atmosfera nestes períodos de dez anos, temos uma subida de 0,2°C, depois de 0,17°C e, finalmente, uns extraordinários 0,36°C.

Esta evolução bate certo com as estimativas da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA, a agência federal dos EUA que monitoriza as condições da atmosfera e dos oceanos), que, no seu relatório climático de 2023, conclui que está a haver uma aceleração significativa do aquecimento: o aumento da temperatura média por década desde 1850 é de 0,06°C, mas a partir de 1982 é de 0,2°C. Mais do triplo.

Claramente, o mundo não está a conseguir travar as alterações climáticas. E com Trump ao leme dos EUA, as coisas podem piorar ainda mais.

O colapso dos sumidouros de CO2

Além de ter sido o mais quente, 2024 teve ainda a particularidade de ser o primeiro ano a ultrapassar a meta ideal do Acordo de Paris, 1,5°C, e por uma margem considerável: o aumento ficou em 1,6°C. É uma marca apenas simbólica, uma vez que será necessário que a média ultrapasse este valor num período alargado de anos. Por exemplo, o El Niño ajudou a impulsionar a média de 2024, tal como já havia feito em 2023; no entanto, sem o efeito galopante das alterações climáticas, este fenómeno recorrente nunca conseguiria fazer subir tanto as temperaturas. Mas não deixa de funcionar como espelho do falhanço.

Esse falhanço é especialmente claro na concentração de dióxido de carbono na atmosfera, que também voltou a bater o recorde, com 425,4 ppm (partes por milhão – significa que, em cada milhão de moléculas na atmosfera, 425 são de dióxido de carbono). Este valor representa um aumento superior a 50% face ao período pré-industrial. O Met Office sublinha que esta subida meteórica é “incompatível” com a limitação do aquecimento a 1,5°C. “Limitar o aquecimento global a 1,5°C exigiria que o aumento do CO2 diminuísse, mas na realidade está a acontecer o contrário”, disse, à BBC, Richard Betts, do serviço meteorológico e climático do Reino Unido.

E agora? Os fogos de LA não foram suficientes para Trump recuar na intenção de retirar os EUA do Acordo de Paris

De 2023 para 2024, a concentração de dióxido de carbono subiu 3,6 ppm, quando, para manter os 1,5°C do Acordo de Paris à vista, não poderia ter subido mais de 1,8 ppm, pelos cálculos do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC). Metade do que subiu efetivamente.

A culpa é, obviamente, da emissão de gases com efeito de estufa, decorrente da atividade humana. Todos os anos, emitimos cerca de 40 mil milhões de toneladas de dióxido de carbono. Mas parece haver mais fatores a contribuírem para isso, numa espécie de tempestade perfeita. Um deles é a diminuição acentuada da capacidade de absorção e sequestro de dióxido de carbono por parte das florestas e dos matos. Uma investigação de 2023 concluiu que, nesse ano, o balanço entre a emissão e a absorção de CO2 das árvores, das plantas e do solo em geral foi praticamente nulo, devido aos incêndios, às secas e à desflorestação. Esse facto é notório na Amazónia, mas também no Ártico – devido aos incêndios e ao aquecimento (que tende a fazer libertar o metano guardado nos solos gelados), a tundra tornou-se um contribuinte líquido de gases com efeito de estufa. O degelo, por seu lado, faz reduzir o efeito albedo da superfície da Terra, o que leva a que menos radiação solar seja refletida; logo, mais o planeta aquece.

O último tiro em Paris

Do ponto de vista puramente técnico, só é “obrigatório” que as emissões de dióxido de carbono desçam em 2025. Segundo a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, “para limitar o aquecimento global a 1,5°C, prevê-se que as emissões de gases com efeito de estufa atinjam o pico antes de 2025, no máximo, e diminuam 43% até 2030”.

Portanto, se 2024 tiver representado o pico de emissões, ainda vamos a tempo, partindo do princípio de que, nos cinco anos que faltam até 2030, seremos capazes de cortar para quase metade as emissões (o que é um tanto fantasioso). As previsões, porém, não apontam para aí. O Met Office estima que, este ano, a subida vai ser menos acentuada do que no ano passado, mas, em termos absolutos, vai continuar a ser uma subida.

E a entrada de Donald Trump na Casa Branca é mais uma facada no já de si semimoribundo Acordo de Paris. Entre as dezenas de ordens executivas que assinou logo no primeiro dia, encontra-se a saída dos EUA do pacto que tenta limitar as emissões, a que se somam o fim dos apoios à compra de carros elétricos e as promessas de aumentar a extração de combustíveis fósseis.«

Um ano a ferro e fogo

Alguns dos dados climáticose meteorológicos mais relevantes de 2024

Europa
Batido o recorde de ano mais quente desde que há registos. No Sudeste de Espanha, níveis históricos de precipitação resultaram em cheias que mataram mais de 200 pessoas.

África
Ano mais quentedesde que há registos.

Ásia
Segundo ano mais quente.

Américas
Ano mais quente. Secas históricas na Amazónia e na Califórnia, que estiveram na base de incêndios catastróficos. O furacão Helene foi o mais mortífero nos EUA desde o Katrina, tendo provocado 219 mortes.

Antártida
Menor extensão máxima de gelo marinhoda História conhecida.

Ártico
Segundo ano mais quente e sétimo com menor quantidadede gelo marinho.

Mais na Visão

Mais Notícias

VISÃO Se7e: Este ano junho chega mais cedo!

VISÃO Se7e: Este ano junho chega mais cedo!

Keep the coins, I want change: um mapa para a sustentabilidade empresarial em 2025

Keep the coins, I want change: um mapa para a sustentabilidade empresarial em 2025

A poesia que sai à rua em Salvador

A poesia que sai à rua em Salvador

CARAS Decoração: 10 espreguiçadeiras para aproveitar o bom tempo

CARAS Decoração: 10 espreguiçadeiras para aproveitar o bom tempo

Matérias-primas: quatro portugueses entre os 47 projetos estratégicos da UE

Matérias-primas: quatro portugueses entre os 47 projetos estratégicos da UE

Fatal Fury: City of the Wolves em análise: O veterano volta ao ativo

Fatal Fury: City of the Wolves em análise: O veterano volta ao ativo

Um viva aos curiosos! David Fonseca na capa da PRIMA

Um viva aos curiosos! David Fonseca na capa da PRIMA

Gmail vai passar a mostrar resumos de emails longos

Gmail vai passar a mostrar resumos de emails longos

10 chapéus para adicionar aos favoritos

10 chapéus para adicionar aos favoritos

"O Esquema Fenício": O fantástico sr. Anderson

Vendas da Tesla na Europa estão em queda

Vendas da Tesla na Europa estão em queda

BYD Dolphin Surf: o 100% elétrico com preço de gasolina

BYD Dolphin Surf: o 100% elétrico com preço de gasolina

CARAS Decoração: a obra de Calatrava numa edição de arte limitada

CARAS Decoração: a obra de Calatrava numa edição de arte limitada

Conheça os se7e arraiais menos óbvios em Lisboa

Conheça os se7e arraiais menos óbvios em Lisboa

Vencedores e vencidos do 25 de Abril na VISÃO História

Vencedores e vencidos do 25 de Abril na VISÃO História

Quis Saber Quem Sou: Será que

Quis Saber Quem Sou: Será que "ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais?"

Em “Sangue Oculto”: Nelson tira Júlia da prisão

Em “Sangue Oculto”: Nelson tira Júlia da prisão

Semicondutores: O petróleo da era digital

Semicondutores: O petróleo da era digital

Desfile de celebridades no Festival de Cinema de Cannes

Desfile de celebridades no Festival de Cinema de Cannes

Parabéns, bicharada!

Parabéns, bicharada!

Inês Herédia e Gabriela Sobral anunciam separação

Inês Herédia e Gabriela Sobral anunciam separação

Portugal 2050: desafios e oportunidades na transição verde

Portugal 2050: desafios e oportunidades na transição verde

De Zeca Afonso a Adriano Correia de Oliveira. O papel da música de intervenção na revolução de 1974

De Zeca Afonso a Adriano Correia de Oliveira. O papel da música de intervenção na revolução de 1974

Porto, Matosinhos e Vila Nova de Gaia recebm a 9ª edição do Festival DDD - Dias da Dança

Porto, Matosinhos e Vila Nova de Gaia recebm a 9ª edição do Festival DDD - Dias da Dança

Vídeo: A festa final de 'Miúdos a Votos'

Vídeo: A festa final de 'Miúdos a Votos'

Desfile de elegância e ousadia na semi-final dos “International Emmy Awards” em Portugal

Desfile de elegância e ousadia na semi-final dos “International Emmy Awards” em Portugal

Cancro: Não é verdade que os tumores são menos

Cancro: Não é verdade que os tumores são menos "agressivos" quando se é mais velho

Salgueiro Maia, o herói a contragosto

Salgueiro Maia, o herói a contragosto

Silence Nomad Inverter: um aparelho anti-apagão

Silence Nomad Inverter: um aparelho anti-apagão

CARAS Decoração: 10 ideias para transformar o velho em novo

CARAS Decoração: 10 ideias para transformar o velho em novo

Dor no peito: enfarte, refluxo ou ansiedade?

Dor no peito: enfarte, refluxo ou ansiedade?

Laura Tarouca e José Rui Esteves Marcos:

Laura Tarouca e José Rui Esteves Marcos: "Temos um amor adulto, sólido"

Dia da Criança: 5 sugestões para te divertires

Dia da Criança: 5 sugestões para te divertires

A Nike está em dificuldades, mas Elliott Hill saiu da reforma para lhe restituir o domínio perdido

A Nike está em dificuldades, mas Elliott Hill saiu da reforma para lhe restituir o domínio perdido

Mais uma noite de

Mais uma noite de "glamour" na passadeira vermelha do Festival de Cinema de Cannes

25 peças para receber a primavera em casa

25 peças para receber a primavera em casa

Raquel Prates e Juan Carmona: elegância e paixão criativa

Raquel Prates e Juan Carmona: elegância e paixão criativa

Dior apresenta coleção Cruise Collection 2026

Dior apresenta coleção Cruise Collection 2026

Helena Isabel em topless no México:

Helena Isabel em topless no México: "Veste qualquer coisita"

Microsoft introduz novidades no Bloco de Notas

Microsoft introduz novidades no Bloco de Notas

Dores de cabeça: quando é hora de ir ao médico?

Dores de cabeça: quando é hora de ir ao médico?

Defesa: O renascer de uma velha indústria?

Defesa: O renascer de uma velha indústria?

Um novo clássico na sua rotina de pele madura

Um novo clássico na sua rotina de pele madura

A Sagração da Primavera - Quando a morte é também fonte de vida

A Sagração da Primavera - Quando a morte é também fonte de vida

Eduardo Sá: “ Muitas vezes os pais vão desistindo dos filhos em suaves prestações”

Eduardo Sá: “ Muitas vezes os pais vão desistindo dos filhos em suaves prestações”