Recorrer a asteroides para a produção de comida? A ideia até pode parecer – no mínimo – incomum, mas está a ser estudada por um grupo de cientistas do Instituto para a Exploração da Terra e do Espaço da Universidade de Western, no Canadá.
A investigação, publicada recentemente na revista The International Journal of Astrobiology, sugere que os hidrocarbonetos – compostos de carbono presentes nos asteroides – podem ser transformados em alimentos, semelhantes a iogurtes ou batidos, que podem vir a ser consumidos por astronautas.
A transformação envolve a decomposição do asteroide – através de um processo químico e físico – que resulta em componentes orgânicos – os hidrocarbonetos – utilizados depois para alimentar bactérias. Após comerem, as bactérias crescem e tornam-se o próprio alimento – designado por biomassa – com propriedades nutricionais semelhantes às dos alimentos que comemos todos os dias.
A ideia teve origem no projeto ReSource, da Agência de Projetos de Investigação Avançada de Defesa dos EUA, que tinha por objetivo transformar os resíduos plásticos, utilizados na alimentação das tropas americanas, em comida. “Não querem deitá-los [recipientes] fora; não querem queimá-los; não querem embalá-los”, explicou Joshua Pearce, professor da Universidade de Western e investigador do estudo.
A equipa tentou transformar os recipientes de plástico em alimento através de um processo de pirólise – que envolve o aquecimento de plástico na ausência de oxigénio – mas as primeiras tentativas de criar biomassa não foram bem-sucedidas. “Temos de passar por todos os rigorosos estudos de segurança para garantir que não são tóxicos”, disse Stephen Techtmann, um dos investigadores.
O projeto levou Pearce a investigar se o mesmo processo poderia ser aplicado a asteroides que, na perspetiva dos micróbios, não diferem muito do plástico por possuírem muito carbono. “Quando olhamos para os produtos de decomposição da pirólise que sabemos que as bactérias podem comer, e depois para o que existe nos asteroides, a correspondência é bastante razoável”, disse Pearce.
Uma investigação publicada na revista Astrobiology em 2022, da autoria da cientista Annemiek Waajen, provou que os micróbios comem, de facto, asteroides. Waajen alimentou bactérias com pedaços de material de meteoritos e verificou que estes consumiram o carbono, crescendo no processo, lembra o New York Times.
A equipa de cientistas da Universidade de Western utilizou o asteroide Bennu enquanto modelo de rocha espacial. Pedaços do asteroide – com uma massa total de cerca de 85,5 milhões de toneladas – foram transportados para a Terra no ano passado – no âmbito da missão Osiris-Rex, da NASA. Segundo os seus cálculos, no pior cenário, os compostos de Bennu seriam capazes de sustentar um astronauta durante cerca de 600 anos. Já se a transformação for bem-sucedida, o astronauta teria alimento para cerca de 17 mil anos. Assim, de acordo com o estudo, para sustentar um astronauta durante um ano, seriam necessárias entre 5 500 e 175 mil toneladas de asteroide.
Os investigadores terão agora de fazer testes de toxicidade para garantir que o seu consumo é seguro. “Já prometi que serei o primeiro a dar uma dentada”, referiu Pearce.