A tento, mas sem recorrer a dramatizações. O Comité de Segurança da Saúde da Comissão Europeia (HSC, na sigla original) reuniu-se na segunda-feira, 19, com o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC) e a Agência Europeia de Medicamentos (EMA), para discutir a evolução da situação da doença mpox na União Europeia (UE) e a eventual necessidade de outras medidas conjuntas. Este encontro surge na sequência do anúncio da Organização Mundial da Saúde (OMS), a 14 de agosto, de voltar a considerar a doença como emergência internacional de saúde pública, face ao aumento dos surtos em África e à existência de uma nova estirpe do vírus (denominada Ib ou 1b), supostamente mais transmissível e mais letal, sobre a qual ainda há pouca investigação. No entanto, as autoridades sanitárias europeias concluíram que não há necessidade de impor controlos nas fronteiras a viajantes provenientes de zonas de maior risco de mpox, nem de iniciar a vacinação contra o vírus para a população em geral.Os alertas aumentaram quando foi anunciado o primeiro caso da variante Ib na Europa, mais concretamente na Suécia, em meados deste mês.
Na semana passada, o ECDC afirmou que “é altamente provável que a UE/EEE [União Europeia e Espaço Económico Europeu] tenha mais casos importados de mpox causados pela clade I (termo utilizado para nova forma do vírus), atualmente a circular em África. No entanto, a probabilidade de transmissão sustentada na Europa é muito baixa, desde que os casos importados sejam diagnosticados rapidamente e medidas de controle sejam implementadas”.“Hoje falei com o ministro dos Assuntos Sociais e da Saúde Pública da Suécia, Jakob Forssmed, para discutir os últimos desenvolvimentos após a notificação do caso mpox clade I na Suécia. A vigilância e a preparação são de extrema importância”, já tinha escrito Stella Kyriakides, comissária europeia para a Saúde e Segurança Alimentar, na rede social X (antigo Twitter), garantindo que “a UE continuará a prestar todo o apoio necessário”, perante eventuais importações de mpox.E por cá?Em Portugal, segundo informação da Direção-Geral da Saúde (DGS), “desde a deteção, a 3 de maio de 2022, dos primeiros casos de mpox, e até 31 de julho de 2024, já foram confirmados 1 197 casos: 953 casos reportados entre maio de 2022 e maio de 2023 e 244 casos notificados no sistema SINAVE entre junho de 2023 e julho de 2024”. Em julho de 2024 (após a ausência de notificação de casos entre maio e junho), foram reportados três novos casos, todos na região Norte, aparentemente sem associação entre si, dois deles com história de viagens ao estrangeiro no período de incubação da doença. Relativamente a agosto, não foram fornecidos dados (só serão conhecidos nas primeiras semanas de setembro). “Todos são da clade IIb do vírus monkeypox, não tendo sido identificado nenhum caso pela clade I”, acrescenta a entidade portuguesa. Para o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, “é claro que é essencial existir uma resposta internacional coordenada para travar este surto e salvar vidas”. Políticas de vigilância eficazes, testes laboratoriais, investigação epidemiológica e capacidades de rastreamento de contactos deverão conter o perigo. As diferenças relativamente à Covid-19 são significativas, uma vez que a mpox não é provocada por um vírus respiratório e, aparentemente, há pouca transmissibilidade de quem está infetado sem sintomas. “Com base no que sabemos, o vírus é transmitido principalmente através do contacto pele com pele, e pele que apresenta lesões da doença, incluindo durante as relações sexuais”, afirmou Hans Kluge, diretor da OMS na Europa. As formas de controlar esta doença infecciosa são conhecidas.
As diferenças relativamente à Covid-19 são significativas, uma vez que a mpox não é provocada por um vírus respiratório e, aparentemente, há pouca transmissibilidade de quem está infetado sem sintomas
Assim, é improvável que enfrentemos uma nova pandemia global. O problema africanoEmbora o episódio sueco desperte o mundo desenvolvido, os riscos são desproporcionalmente maiores no continente africano. O epicentro do atual surto é a República Democrática do Congo (RDC), onde se concentram 96% dos casos e mortes – o país relatou mais de 16 mil mortes em 2024, sendo 70% de pessoas com menos de 15 anos. Os números escondem a verdadeira dimensão do problema, uma vez que a testagem e a confirmação em laboratório são deficientes, sobretudo nas zonas rurais. Existem 13 países africanos afetados, nove deles pela primeira vez com casos confirmados de mpox, incluindo alguns que fazem fronteira com a RDC (Burundi, República Centro-Africana, Congo, Ruanda e Uganda), bem como o Quénia. Nas últimas décadas, têm existido surtos ocasionais de mpox, sobretudo na RDC, na Nigéria e noutros países africanos. O episódio mais aflitivo ocorreu em maio de 2022, quando a doença se espalhou por múltiplos países, mas neste caso tratava-se da variante II, com uma menor taxa de mortalidade – abaixo de 1%, enquanto na variante I oscila entre 1% e 10% (os dados mais recentes na RDC apontam para 4% nesta subvariante Ib). A 23 de julho de 2022, a OMS declarou pela primeira vez o surto como uma emergência internacional de saúde pública. Na altura, foram assinalados mais de 95 mil casos, que causaram mais de 150 mortes em países não endémicos. Na semana passada, Jean Kaseya, diretor-geral do Centro Africano de Controle e Prevenção de Doenças, afirmou que o continente necessitaria de dez milhões de vacinas para ultrapassar a mpox, mas estão apenas garantidas 200 mil doses da empresa dinamarquesa Bavarian Nordic, graças a um acordo coordenado com a Comissão Europeia. São históricas as dificuldades nos acessos às vacinas, em comparação com as amplas reservas dos países desenvolvidos. No passado, os apelos a doações não foram eficazes. Vejamos quão generosa a comunidade internacional se mostrará agora.“Este não é apenas um assunto africano. A mpox é uma ameaça global, uma ameaça que não conhece fronteiras, etnia ou credo”, apontou Kaseya, em conferência de imprensa.