Há quase mais de um século que os relógios na Índia marcam uma diferença de quase 30 minutos para a maioria dos países. A Índia, que se estende por cerca de 3 mil quilómetros no Sul da Ásia, abrange geograficamente o que, teoricamente, seriam dois fusos horários diferentes, unificados num só. Ou seja, ambos os seus extremos – de leste a oeste – possuem uma diferença de duas horas de posição do sol, que nasce quase duas horas mais cedo no leste do que no extremo oeste da Índia. A explicação por detrás deste fenómeno remonta a um legado do domínio britânico que ainda se mantém e que pode ser observado como um símbolo de união do território.
Até ao século XIX não existia uma regularização do tempo, sendo que a maioria dos territórios funcionava através dos seus próprios horários que podiam variar de cidade em cidade, aldeia em aldeia. A situação começou a mudar com o desenvolvimento dos meios de transporte a vapor que passaram a fazer a ligação entre diferentes territórios e a aproximar as populações do mundo. Na Índia, a conceção sobre o tempo só começou a mudar com a chegada da Companhia das Índias Orientais, uma organização comercial britânica que foi assumindo, progressivamente, o controlo da região.
Em 1792, a Companhia passou a gerir um dos primeiros observatórios da Ásia, denominado de Madras, dando início ao processo de unificação do tempo na região. Atualmente conhecido como Chennai, Madras foi um dos primeiros observatórios modernos criados na Ásia, fundado em 1786, por William Petrie. Uma década mais tarde, os astrónomos responsáveis pelo observatório declararam que a hora de Madras passaria a ser a base da hora indiana. Contudo, o “Tempo de Madras” só ficou oficialmente estabelecido em 1905.
Foram necessárias algumas décadas para regular o fuso horário em todo o território num processo que, apesar de alguma resistência por parte da população, foi fomentado através do crescimento das linhas de caminhos-de-ferro do país que passaram a atravessar o país. “Os caminhos-de-ferro tinham um enorme poder sobre as potências coloniais. Os ritmos de trabalho já não estão ligados ao patrão do fundo da rua, ao sino da igreja e às outras 20 pessoas com quem se vai trabalhar. Agora é determinado pelo caminho de ferro que chega uma vez por dia” explicou Geoff Gordon, um investigador de direito internacional da Universidade de Amesterdão, em entrevista à CNN.
Na mesma época, o mundo começava a debater a necessidade de estabelecer bases para os horários dos diferentes países. O desenvolvimento dos transportes e a necessidade de uma melhor coordenação das viagens ferroviárias transcontinentais e navegações marítimas levaram, assim, ao estabelecimento dos primeiros fusos horários internacionais. Através de uma conferência realizada em Washington D.C., em 1884, ficou decidido que os fusos passariam a basear-se no Meridiano de Greenwich – uma linha de longitude que passa pelo Observatório de Greenwich, em Londres. O resto do mundo passou, assim, a situar-se horas à frente – leste – ou atrás – oeste – do Tempo Médio de Greenwich – conhecido pela sigla GMT – com diferenças de hora em hora.
No início do século XX, várias associações científicas pressionaram as forças na Índia de forma a alinhar a hora da Índia com o GMT. Neste sentido, a Royal Society, em Londres, propôs dois fusos horários, ambos com adições de uma hora completa em relação ao Meridiano – seis horas de avanço para o leste e cinco para o oeste. A recomendação foi rejeitada pelo governo colonial indiano, que optou por permanecer com uma hora unificada intermédia à proposta. A Índia passou a situar-se cinco horas e meia à frente do GMT, conhecida como a “Hora Padrão da Índia”, ou “Tempo de Madras”.
A nação não é, contudo, a única com um fuso horário peculiar, integrando um pequeno grupo de territórios – como o Irão, Myanmar e partes da Austrália – que partilham essa diferença de 30 minutos.
Tal diferença horária dentro do território tem, contudo, provocado algumas dificuldades para a população de cerca de 1.44 mil milhões de pessoas que habitam o país. O fuso horário único da Índia tem sido alvo de vários debates ao longo das últimas décadas, com movimentos das populações do nordeste do país a exigirem um fuso horário diferente. Segundo especialistas, a variação de luz solar que existe no território pode resultar em consequências para a população, especialmente no leste da índia, onde o sol nasce e se põe muito mais cedo do que no oeste, o que obriga as pessoas a recorrerem à utilização de luzes artificiais mais cedo no dia e, por conseguinte, a um maior consumo de eletricidade.