Codex 632, romance do jornalista José Rodrigues dos Santos publicado em 2005, foi o primeiro de uma série de 12 romances se focam no historiador e especialista em criptografia Tomás de Noronha, personagem imaginada pelo escritor, que tenta descobrir quem era, e de onde vinha, o navegador Cristóvão Colombo.
Esta história vai, agora, passar para o ecrã, numa co-produção da brasileira Globo com a RTP, e será protagonizada por Paulo Pires. Numa breve entrevista ao jornalista no jornal 2, da RTP 2, a propósito da série baseada no seu livro, José Rodrigues dos Santos afirmou que, apesar de existir “um discurso de que Cristóvão Colombo era genovês”, este romance mostra, “usando documentos verdadeiros, que não existe uma única prova sólida de que ele fosse de facto genovês”, acrescentando que, “na verdade, há sugestões de que ele poderia ser português”.
“Quando [o romance] foi publicado, houve historiadores que apareceram em público a dizerem que achavam também que ele era português”, acrescentou ainda. E rematou, abordando o papel “desmistificador” dos romancistas no que toca a assuntos históricos. “Muitos temas são mitificados e quem os vem desmistificar e derrubar muitas vezes não são os académicos, não é o discurso político, não é o discurso mediático. São os romancistas, os cineastas, que pela primeira vez tocam no assunto e que permitem que depois se faça uma investigação académica mais apurada”, afirmou.
Após as suas alegações, vários historiadores mostraram-se indignados e acusaram o jornalista de “desprezo implícito pelo trabalho académico”. Roger Lee de Jesus, historiador, licenciado em História, mestre em História Moderna e doutorado na mesma área na Universidade de Coimbra, escreveu, numa publicação na sua conta de Twitter, que o comentário de José Rodrigues dos Santos era uma “vergonha nacional” e acusou o jornalista de “difundir teorias da conspiração da História, sem qualquer sustento nem credibilidade”.
Em declarações à VISÃO, o historiador garante novamente que “as alegações de José Rodrigues dos Santos sobre a naturalidade de Colombo não têm sustento documental” e que “apesar de haver vários movimentos que defendam que Colombo seria português, não há qualquer documento explícito que o comprove e há um consenso historiográfico sobre o assunto”.
“O problema de José Rodrigues dos Santos e de outros jornalistas é fazerem afirmações sobre um campo científico que não dominam. Uma coisa são os seus romances, nos quais pode dizer tudo o que quiser pois está no campo da ficção. Outra coisa é afirmar que tal se baseia em factos”, acrescenta o especialista, referindo que “a visibilidade que José Rodrigues dos Santos tem como jornalista e figura pública, com espaço de antena regular na televisão, acaba por lhe dar crédito junto do grande público”.
“Ao fazer afirmações desta natureza, está por sua vez a dar visibilidade e crédito a estas mesmas teorias, que não têm fundamento”, garante também, “teorias que têm por base leituras enviesadas e interpretações forçadas das fontes históricas, misturando sempre uma dose de teoria da conspiração sobre os motivos deste suposto segredo, e ignorando que no século XV e XVI seria praticamente impossível manter e alimentar um segredo desta natureza numa personalidade que ganhou a dimensão de Colombo”.
Roger Lee de Jesus lembra também que o jornalista fez “afirmações do mesmo género sobre outros assuntos historiográficos, como as origens marxistas do fascismo”. “No fundo, como a História é um campo que diz culturalmente muito a muita gente, ignora-se a metolodogia e as bases críticas da área e entra-se no campo dos achismos e das opiniões sem fundamento”, remata.
A nova série da RTP1, realizada por Sérgio Graciano, terá seis episódios – o primeiro é emitido esta segunda-feira, 2 de outubro – e conta também com vários atores brasileiros, tal como Betty Faria.