O espaço é o infinito e com ele surgem um conjunto de mistérios que estão a ser desvendados. A História do Universo em 100 Estrelas é um livro que ajuda a conhecer algumas das principais estrelas que compõem o céu que ambicionamos conhecer.
Florian Freistetter, autor do livro, é doutorado em Astronomia pela Universidade de Viena. Vencedor do IQ Award pelo seu trabalho como investigador, lançou em 2008 o blogue de astronomia Astrodicticum simplex, um dos blogues científicos mais lidos da Alemanha.
Esta semana apresentamos a estrela HD 10180, a que tem muitos números e muitos planetas.
A História do Universo em 100 Estrelas
HD 10180: Muitos números e muitos planetas
A estrela HD 10180 é extraordinária. Trata-se de uma estrela parecida com o Sol, que se encontra a cerca de 127 anos-luz na constelação de Hydrus. À primeira vista, não se distingue, mas os telescópios do Observatório Europeu do Sul estudaram-na ao longo de seis anos, e em 2010 obteve-se o resultado: giram à volta da estrela pelo menos seis planetas, possivelmente sete e até podiam chegar a ser nove. Até ao momento, nunca se tinham encontrado tantos numa única estrela (com exceção do Sol, claro está). A maior parte destes planetas são maiores e mais pesados do que a Terra e, ordenados de acordo com a distância que os separa das suas estrelas, denominam-se: HD 10180 c, HD 10180 d, HD 10180 e, HD 10180 f, HD 10180 g e HD 10180 h.
É necessário? Porque é que se usam sempre estas combinações de números e letras complicadas e desagradáveis? De onde é que saem estas denominações? E porque é que os astrónomos não pensam em nomes razoáveis para as estrelas e os corpos celestes?
Não conseguem fazê-lo, e isto não acontece por serem todos pessoas frias, sem romantismo e criatividade. Simplesmente, há demasiados planetas e estrelas e é preciso encontrar uma maneira útil de os organizar.
Na Antiguidade davam-se nomes a sério, por assim dizer, às estrelas, mas isso também não acontecia com todas, apenas com as mais brilhantes. Sirius, ou Sírio, por exemplo, é um nome que tem origem na palavra do grego antigo seirios e talvez tenha alguma coisa que ver com as lendas mitológicas sobre as sereias. Na Índia, a estrela chama-se Makara Jyothi, os sumérios conheciam-na como Sukudu, a seta, e assim por diante até mais de cinquenta nomes próprios de diferentes culturas.
Aqui evidencia-se também o primeiro problema que se coloca com os nomes das estrelas: quando a mesma estrela recebe diferentes denominações, como é que saberemos de qual se trata? Até há 150 anos, a
coisa talvez não fosse para tanto, mas a ciência moderna é internacional e, para que a comunicação seja eficaz, é necessária uma forma de procedimento sistemática, que seja compreensível e lógica para todos.
O primeiro a introduzir um sistema assim para denominar as estrelas foi o astrónomo alemão Johann Bayer, no início do século xvii. Bayer classificou as estrelas pelas constelações em que se encontravam
e ordenou-as em função da sua luminosidade. Depois a denominação formou-se com letras gregas e o nome em latim das constelações. Assim sendo, Sirius, por exemplo, passou a ser a Alpha Canis Maioris, a estrela
mais brilhante da constelação do Cão Maior. No século xviii, o astrónomo britânico John Flamsteed idealizou um sistema parecido: classificou as estrelas pela sua posição nas constelações e numerou-as correlativamente, por isso, no seu sistema, Sirius converteu-se na 9 Canis Maioris.
Nos catálogos de Bayer e Flamsteed havia alguns milhões de estrelas. Mas com o tempo os telescópios foram melhorando e era preciso atribuir um nome às novas estrelas que se descobriam no firmamento.
Na maior parte das vezes, fazia-se com a ajuda de uma sigla que indica a que catálogo em concreto se refere e uma combinação de números e letras que ou descreve a posição que a estrela ocupa no céu ou simplesmente constitui um número correlativo no catálogo.
A estrela HD 10180, lar de muitos planetas, é, por exemplo, a estrela número 10 180 do catálogo Henry Draper, que foi compilado entre 1918 e 1924 no Observatório de Harvard e recebeu o nome do astrónomo
Henry Draper. Inclui mais de 300 mil e, portanto, com frequência podemos ver a sigla HD no nome das estrelas.
No entanto, a astronomia, como é evidente, continua a catalogar estrelas, motivo pelo qual existem muitos outros catálogos que utilizam as suas próprias siglas. A compilação mais exaustiva até à data é a do
observatório espacial Gaia, que contém 1 692 919 135 estrelas que se denominam com o acrónimo Gaia DR-2 e determina as posições de quase 1700 milhões de estrelas.
Naturalmente, os astrónomos são conscientes de que os nomes «a sério» não só soam melhor como, além disso, são mais adequados para falar sobre astronomia com o grande público. Por isso, em 2016 a União
Astronómica Internacional criou um grupo de trabalho cujo objetivo era abordar este problema. Classificou-se e unificou-se a confusão de nomes próprios que existia desde a Antiguidade, e algumas estrelas que
até esse momento só tinham aborrecidos nomes de catálogo receberam nomes que se propuseram e decidiram mediante concurso. Até ao momento, a União Astronómica Internacional reconheceu oficialmente
330 estrelas; no entanto, a HD 10180 ainda não foi considerada.