No início de setembro de 2021, o fotógrafo russo Dmitry Kokh, de 41 anos, especializado em fotografia subaquática e vida selvagem, regressava de uma ansiada expedição pelo mar de Thuktchi, entre Tchukotka, na Rússia, e Point Barrow, no Alasca, quando teve a surpresa da sua vida.
Em agosto, iniciara uma viagem de veleiro que o levara a percorrer mais de 1 900 quilómetros ao longo daquela costa, com o objetivo principal de tirar boas fotografias a ursos polares. E contava encontrá-los principalmente na Ilha Wrangel, famosa em todo o mundo por ser o lar destes gigantes brancos.
Pelo caminho, ele e os seus companheiros foram passando por “paisagens intocadas, aldeias perdidas no tempo, recantos com fauna variada e mares cheios de vida”, escreveria. “Tratando-se da parte mais distante e oriental do Ártico russo, é um lugar muito difícil de alcançar, mas também difícil de esquecer.”
Ao contrário do que esperavam, acabariam por não ver nenhum urso polar na ilha de Wrangel. Talvez o verão muito frio os tivesse mantido no mar, concluíram. Ao fotógrafo, que vive há quatro anos a captar sobretudo imagens de animais debaixo de água, restou-lhe ir dando uso ao equipamento especial que levava a bordo para registar o dia a dia daqueles mamíferos marinhos, em fotografia e em vídeo, a nadarem e a caçarem entre enormes pedaços de gelo.
“Mas a natureza está sempre a enviar-te alguma coisa, quando menos esperas”, nota Dmitry.
Foi já no regresso, quando estavam a passar pela pequena ilha de Kolyuchin, a apenas 11 quilómetros da Península de Chukotka, que alguém na expedição se apercebeu de movimentos nas janelas de várias das casas em ruínas que pertenceram a uma velha estação meteorológica russa. Em 1934, cientistas soviéticos construíram ali uma estação polar da Rota do Mar do Norte. Em 1992, ela foi encerrada e a ilha abandonada.
Coberta de tundra e com apenas 4,5 km de comprimento e uma largura máxima de 1,5 km, a ilha de Kolyuchin passa cerca de nove meses por ano rodeada de gelo. Nos últimos quase trinta anos, tem sido apenas visitada por alguns, poucos, investigadores, e ainda menos turistas, estes sempre acompanhados de guias especializados.
Quem se teria aventurado até ali?
“Quando chegámos perto, eram ursos!”, recorda Dmitry Kokh, sublinhando: “Nunca antes eles tinham sido vistos naqueles edifícios, por isso era uma situação única na vida.”
Ciente disso mesmo, e também do perigo de se aproximar de ursos polares, o fotógrafo captou uma série de imagens “com tecnologia e um pouco de mágica”. Sem entrar em detalhes, e porque têm sido muitas as pessoas a perguntar-lhe como conseguiu tirar estas fotografias, Dmitry já garantiu que não correu nenhum risco.
“Os ursos polares são animais selvagens e podem ser extremamente perigosos para os humanos. Então, se alguém pensa que andei pela ilha a desviar-me dos ursos como o Super-homem, esta pessoa está completamente errada”, escreveu na sua conta no Instagram.
“Portanto, em primeiro lugar, nunca tente aproximar-se de um urso polar”, alerta. “E, em segundo lugar, igualmente importante, as táticas de ‘não perturbe’ são a minha prioridade sempre que estou com animais; por isso, os ursos polares da ilha de Kolyuchin não foram nem perturbados nem feridos.”
Através das suas fotografias e de um curto vídeo que Dmitry Kokh fez na mesma altura, podemos ver como aqueles ursos polares se movimentavam com aparente à-vontade dentro e fora de algumas das casas abandonadas da velha estação meteorológica. Em mais de uma ocasião, os animais parecem mesmo estar a posar para o fotógrafo.
Não sabemos que equipamento foi usado; presume-se que algo acionado remotamente que acabou por suscitar a curiosidade destes ursos polares. Certo é que bastou um dele colocar-se à janela de uma casa, como quem espreita os visitantes, para ganhar um carácter antropomórfico (essa fotografia seria premiada num concurso promovido pela National Geographic). Nalgumas das fotografias, estes gigantes brancos parecem mesmo vizinhas à conversa. Noutras, é como se estivessem a deambular num parque de diversões decrépito.
Dmitry Kokh interessa-se pela natureza desde miúdo. Chegou a pôr a hipótese de estudar Biologia, mas acabou por não seguir nessa direção e, aos 30 anos, fundou a sua própria empresa de IT.
Hoje que faz da fotografia subaquática a sua profissão já há quatro anos, diz que as Tecnologias de Informação continuam a ser uma das suas grandes paixões, a seguir à família (é casado e tem filhos pequenos), mas voltou a interessar-se pela natureza quando um grande amigo o convidou a viajar até aos Açores para observar cachalotes.
“Mal saltei para a água, a nadar muito devagar em direção às baleias e mergulhando um pouco para conseguir boas imagens, os animais desapareceram nas profundezas”, recordou numa entrevista. “Em toda a minha excitação, tirei uma fotografia das baleias a mergulhar que acabou por ser bastante boa. Até foi premiada, mais tarde. De volta ao barco, percebi novamente como era excelente literalmente ‘submergir’ no mundo natural. A minha paixão apareceu de novo e comecei a juntar informação sobre o comportamento animal e como devia comportar-me como espetador e fotógrafo.”
Agora que teve a atenção dos media, Dmitry aproveita o número crescente de seguidores na sua conta no Instagram para lembrar: “o Ártico russo é um mundo paralelo extremamente bonito. Mas infelizmente este mundo está cheio de lixo. Esse é um problema bem conhecido – por exemplo, existem cerca de 12 milhões de barris de combustível abandonados espalhados ao longo da costa. Na época soviética, traziam os barris, e depois de o combustível ser usado, largavam-nos por todo lado. Além de aldeias abandonadas, lixo de construções e por aí fora. E é muito caro limpar tudo agora. O nosso governo estará a tentar iniciar um programa de limpeza, espero que a solução seja encontrada. Mas, até agora, alguns ‘campos de barris’ têm novos cidadãos.”