Margarida Tavares chama-lhes as suas “paranoias” e estava habituada a conviver com elas, mas, nestes meses pandémicos, parece que se agigantaram. “Já carregava nos botões dos elevadores com os nós dos dedos, na altura da gripe A, por ter nojo de tocar nas coisas e medo de contaminar-me”, esclarece a produtora de 45 anos. Agora, que está vacinada contra a Covid-19, não consegue explicar porque continua refém dos rituais de limpeza: “No local de trabalho, estou sempre a analisar o ambiente e a desinfetar a secretária; cumprimentos, nem pensar ou, então, desvio a cara.” Sempre munida de álcool-gel, dá dois passos atrás se alguém vier em sua direção, por exemplo, numa festa de aniversário, e mantém a máscara posta, até a cozinhar com pessoas próximas. “Chego ao cúmulo de estar numa esplanada, usar o galheteiro e desinfetar logo as mãos.” Por enquanto, libertar-se disto é uma impossibilidade, pois até em casa, onde só vivem ela e o marido, não resiste a limpar maçanetas e interruptores: “A pandemia atrofiou-me muito.”
Ninguém previa que o início dos “loucos anos 20” ficasse marcado por um vírus letal, com um impacto devastador na saúde física mas também mental de milhões de pessoas. Confirmam-no os resultados de um megaestudo divulgado, em outubro, pela revista científica The Lancet, que analisou a prevalência da depressão e da ansiedade em mais de duas centenas de países. As estimativas não são animadoras: a pandemia terá sido responsável por 53 milhões de casos adicionais de depressão e por mais 76 milhões de perturbações de ansiedade, o que representa um aumento superior a 25% face aos níveis pré-pandemia, sendo que dois terços destes valores recaem nas mulheres. Ignorar o “elefante na sala” – o problema de saúde pública, à escala global – deixou de ser possível.
Teresa Esteves da Fonseca
Ansiedade social e agravamento da depressão
“Ainda se pensa que falar disto é partilhar demais”
Depois de bater no fundo, a tradutora e revisora, 30 anos, inscreveu-se no ginásio, envolveu-se com outro afinco na terapia e retomou o trabalho. “Já tenho mais armas para me defender, os amigos estão em alerta e faço por estar com pessoas.” Pelo meio, partilhou os seus sentimentos no Instagram e até escreveu um livro que ela pensa publicar. “É urgente falar sobre as doenças do foro mental”