Dia 14 de dezembro de 2001. O Alto Douro Vinhateiro, apenas um décimo dos 250 mil hectares da mais antiga região vinícola do mundo, demarcada no século XVIII por Marquês de Pombal, entra na lista da Unesco das “paisagens culturais, evolutivas e vivas”. Soam foguetes em Alijó e na Régua. Dias depois, no Pinhão, a bordo do velhinho comboio a vapor, o primeiro-ministro de então, António Guterres, sela o momento, ao som de concertinas, com um cálice de vinho do Porto desenhado pelo arquiteto Siza Vieira. Estava dado o primeiro passo para homenagear “todos aqueles que, durante anos e anos, contribuíram com o seu esforço para o domínio de fatores naturais adversos, talhando a majestosa escultura da paisagem duriense”, segundo se lia no dossier de candidatura, coordenado por Fernando Bianchi de Aguiar. “Socalcos que são passados de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor pintou ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares plausíveis de visão”, já havia escrito Miguel Torga.
O que mudou, na região, desde 2001? “O Douro de 2021 não é o mesmo do Douro de 2001”, atestava há dias António Cunha, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), entidade responsável pela salvaguarda e gestão daquele Património Mundial – abrange 13 concelhos e 40 338 hectares de vinha para a produção de vinho do Porto (a maior parte, 32 792 hectares) e do Douro. “A paisagem mudou bastante”, assegura, por seu lado, Jorge Dias, vice-coordenador da candidatura à Unesco. “A partir de 2000, com o início do programa VITIS [Regime de Apoio à Reestruturação e Reconversão da Vinha], houve a maior reestruturação que se assistiu na cultura da vinha.” Em simultâneo, “as pessoas começaram a ter mais consciência do valor do seu património e houve uma preocupação das autoridades em obrigá-las a preservar ao máximo esses bens patrimoniais”, garante o atual diretor do Grupo Gran Cruz, alertando, no entanto, haver ainda muito a fazer. “É preciso consciencializar as pessoas do bem que têm. Mesmo que tenhamos assistido à passagem de muitas décadas, não tenho a certeza de que os durienses estejam reconciliados com a sua história. Não nos podemos esquecer que, durante as primeiras décadas do século XX, vivia-se muito mal no Douro.”